São Paulo, quinta-feira, 29 de setembro de 2005

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LIGAÇÕES PERIGOSAS

Consultor da Telecom Italia acha que interferência da Telemar dificulta compra de ações dos fundos

Telemar ainda quer Brasil Telecom, diz Nahas

JANAÍNA LEITE
DA REPORTAGEM LOCAL

Tida como a maior disputa empresarial brasileira, a venda da Brasil Telecom para a Telecom Italia está emperrada porque fundos de pensão e governo não desistiram de promover, no futuro, a fusão da companhia com a Telemar. A opinião é do consultor da Telecom Italia, Naji Nahas.
Em entrevista por telefone à Folha, de Londres, onde negocia a venda da Brasil Telecom para os italianos. "Não tenho certeza [se os fundos querem vender para a Telecom Italia]", disse Nahas. "A Telemar não desistiu de comprar a Brasil Telecom."
Ele afirmou ainda que seu nome está sendo envolvido no escândalo do "mensalão" para prejudicar os italianos e dificultar a venda.
Para que a Telemar compre a BrT (Brasil Telecom), seria necessário uma mudança na legislação -que hoje impede os mesmos donos de administrarem duas operadoras de telefonia fixa- ou um decreto presidencial.
A BrT é a operadora que cuida da telefonia fixa das regiões Norte, Centro-Oeste e Sul. A operadora, com faturamento bruto anual de R$ 12,8 bilhões, é motivo de disputa entre os quatro principais sócios: fundos de pensão e Citigroup versus Telecom Italia e Opportunity.
Os italianos, como sócios operadores, querem comprar a companhia. Em abril, fecharam contrato para adquirir a fatia do Opportunity. Compraram as ações que o grupo tinha na cadeia de comando da BrT por um valor 270% acima do praticado no mercado, mas não pagaram. O dinheiro só sai se a Telecom Italia conseguir o controle da companhia - ou seja, se ela comprar também a parte do Citi ou dos fundos de pensão. Mas Citi e fundos têm um acordo, chamado "tag along", que prevê a venda conjunta dos ativos.
Além disso, os fundos se comprometeram, em acordo de "put", a comprar as ações que o Citi possui na BrT em 2007. O preço combinado é 300% acima do que valem no mercado.
Para embolar ainda mais o negócio, complicado pelas condições de oferta e preço, os italianos acreditam que um concorrente, a Telemar, faz gestões no governo para impedir a venda da BrT.
A Telemar é a concessionária de telefonia fixa das regiões Norte, Nordeste e Sudeste. Parte de seu capital pertence ao governo, por meio do BNDES e de subsidiárias do Banco do Brasil. Fundos de pensão, Citi e Opportunity também possuem um pedaço da operadora. Há ainda outros sócios privados (grupos GP, Jereissati e Andrade Gutierrez).
Com tantos interesses em jogo, a briga empresarial resvalou na política. Os presidentes dos maiores fundos de pensão do país - Sérgio Rosa (Previ), Wagner Pinheiro (Petros) e Guilherme Lacerda - tiveram de depor na CPI dos Correios. O dono do Opportunity, Daniel Dantas, também. O próximo a ir será o presidente do Citi no Brasil, Gustavo Marín.
Parlamentares conhecidos foram cooptados para lobby das instituições. De um lado, o deputado Delfim Netto (PMDB-SP) defendendo os italianos. De outro, simpático ao Citigroup, o senador Eduardo Suplicy (PT-SP). Ontem à noite, o senador Leomar Quintanilha (PMDB-TO) sugeriu o cancelamento da assembléia da BrT, marcada para amanhã.
Enquanto a disputa rola nos bastidores, os sócios vivem momentos difíceis. As negociações se desenrolam desde maio - Rio, São Paulo, Nova York, Milão e Londres- e movem as ações das teles e o índice Bovespa em São Paulo. Nahas não quis falar sobre as ofertas. A Folha apurou, contudo, que os italianos querem comprar todas as ações do Citi e parte da fatia dos fundos. Juntas, formariam um bloco de 60% do total em poder dos dois e seriam negociadas por um valor próximo ao do acordo "put". Os 40% restantes seriam ofertados no mercado, sob um prêmio, depois da venda concretizada. Leia a seguir trechos da entrevista.
 

Folha - O sr. foi investigado pela Kroll por suposta proximidade com o governo. Mantém algum tipo de negócios com o PT?
Naji Nahas -
Nunca dei dinheiro para o PT, nem meu nem dos outros. Isso é um absurdo. Aliás, nunca tive negócios com o setor público, tanto faz se na época do Paulo Maluf ou da Marta Suplicy. Nenhum tipo de negócio, nada.

Folha - Mas o sr. participou de caravanas ao exterior com o presidente da República, inclusive.
Nahas -
As vezes que estive com representantes do governo -ministros e o presidente- foram encontros oficiais nos quais representei a função de consultor de investidores estrangeiros interessados em trazer capital ao Brasil.

Folha - Por que seu nome voltou a aparecer nos escândalos recentes?
Nahas -
Porque negocio a venda da Brasil Telecom para a Telecom Italia. Estão tentando atingir minha imagem e enfraquecer os italianos nas negociações.

Folha - Como estão caminhando as conversas para a venda da BrT?
Nahas -
Negociávamos, mas os diálogos estavam difíceis e foram interrompidos domingo, porque as propostas vindas dos fundos são inaceitáveis. Mas estou otimista, o bom senso vai prevalecer.

Folha - O sr. acha que os fundos querem realmente vender a BrT?
Nahas -
Não tenho certeza, pelo menos aos italianos. Os próximos dias mostrarão.

Folha - Qual é o maior empecilho para a venda ser efetivada?
Nahas -
O interesse permanente da Telemar. Ela não desistiu de comprar a Brasil Telecom.

Folha - O sr. foi procurado por representantes da Telemar interessados nas ações da Telecom Italia na Brasil Telecom?
Nahas -
Fui. Mas não quero citar nomes e alimentar uma polêmica desnecessária. Eu achava que o pior tinha passado: convencer o Daniel Dantas a vender a parte dele. Felizmente, ele criou juízo e vendeu. Foi Tronchetti Provera [presidente mundial da Telecom Italia] que pagou sozinho o preço para tirar o Dantas da Brasil Telecom. Todos se queixavam que queriam ele fora, mas, no lugar de bater palmas para o Tronchetti, os fundos e o Citi se juntaram contra ele. Por isso não entendo quais são as verdadeiras intenções deles. Elas não estão claras.

Folha - O sr. tem sido apontado como dono oculto da corretora Bônus-Banval [envolvida no escândalo do "mensalão']. É verdade?
Nahas -
Isso é um delírio, é ridículo. Não conheço a corretora nem os donos. Nem de vista.

Folha - O sr. viajou a Lisboa acompanhado de Delúbio Soares e Luís Favre para encontros com a Portugal Telecom?
Nahas -
A última vez que estive em Portugal foi há mais ou menos cinco anos. Não conheço o senhor Delúbio Soares. O Luís Favre [marido de Marta Suplicy] me foi apresentado em um casamento há cerca de um mês. Nunca me reuni com a Portugal Telecom.


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