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OPINIÃO ECONÔMICA
Piquenique na boca de um vulcão
LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS
As eleições presidenciais
nos Estados Unidos estão
provocando um intenso debate
sobre os rumos da economia do
país e, por conseqüência, da do
resto do mundo, em 2005. A principal questão que está no ar é: o
próximo presidente vai enfrentar
seu já quase explosivo desequilíbrio externo ou vai tentar manter
por mais tempo a ciranda financeira internacional que permite
seu financiamento indolor?
Um dos maiores bancos de investimentos da Wall Street chamou recentemente os Estados
Unidos de George W. Bush de "a
maior economia emergente do
planeta", por causa desse seu desequilíbrio externo! A imagem fica por conta dos imensos déficits
em conta corrente das nações em
desenvolvimento que marcaram,
com crises cambiais sucessivas, as
duas últimas décadas do século
passado.
Mas a economia americana
não é igual à de outros países que,
ao atingir um déficit em suas
transações com o resto do mundo
superior a 5% do PIB, acabam sofrendo um ataque a sua moeda
nacional e entram em colapso financeiro, como ocorreu com os tigres asiáticos, em 1997, com a
Rússia, em 1998, o Brasil, em 1999,
e a Argentina, no início deste novo século. O dólar é a moeda internacional dominante e, por essa
razão, não pode ser comparado
com o rublo russo, o peso mexicano ou o real brasileiro.
Mas existe um limite para essa
verdadeira farra do boi que é a
emissão de dólares pelos EUA para pagar as importações de bens
de consumo e os juros devidos aos
credores estrangeiros. Esses, empresas e bancos centrais, já detêm
mais de 40% do PIB em ativos financeiros e ativos reais americanos. A continuar a farra do boi
atual, esse valor pode chegar a
90% do PIB no fim desta década.
Para muitos, já chegamos a
uma situação em que os mercados financeiros podem, a qualquer momento, passar a emitir sinais de desconfiança na moeda
americana. Se isso acontecer, a
reciclagem dos dólares excedentes
em mãos dos exportadores estrangeiros e dos credores internacionais pode deixar de ser feita de
maneira voluntária, como hoje,
provocando uma explosão dos juros nos EUA e jogando a maior
economia do planeta em profunda recessão. A última vez que isso
ocorreu foi em 1929!
Por essa razão, uma das estatísticas que os investidores acompanham mensalmente, com o coração na boca, é o volume e a distribuição dos investimentos estrangeiros em papéis americanos. Afinal, a economia americana precisa de US$ 3 bilhões, por dia útil,
para fechar suas contas todos os
meses. Parte desses recursos, quase 40%, é hoje responsabilidade
dos bancos centrais dos países que
têm grandes saldos comerciais
com os EUA, como o Japão, a China, a Rússia e os outros países exportadores de petróleo. Se ocorrer
uma redução expressiva no volume de investimentos estrangeiros
em títulos americanos, garanto a
meus leitores, vamos ver o diabo
dançando nos pregões das Bolsas
americanas.
Aliás, isso já ocorreu em 1987,
data da última grande crise de
confiança no dólar e que obrigou
as maiores economias do planeta
a administrar um plano de salvamento da moeda americana
(acordo do Trianon). O assustador é que naquele momento o déficit na conta corrente da balança
de pagamentos americana era de
3,5% do PIB. Em fins de 2005, esse
número deve lamber os 7% do
PIB!
O ajuste necessário para tirar a
economia americana da rota de
colisão atual enfrenta dois obstáculos, um interno e outro externo,
de grandes proporções. O interno,
de natureza política, seria provocar uma recessão dura, durante
pelo menos dois anos, em uma sociedade acostumada a níveis elevados de consumo e altamente
endividada. O externo seria convencer as outras nações do mundo a aumentar seus níveis internos de consumo e reduzir o crescimento de suas economias. Voltarei a esses obstáculos em futuro
próximo.
Luiz Carlos Mendonça de Barros, 61,
engenheiro e economista, é sócio e editor do site de economia e política Primeira Leitura. Foi presidente do BNDES e
ministro das Comunicações (governo
FHC).
Internet: www.primeiraleitura.com.br
E-mail - lcmb2@terra.com.br
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