São Paulo, sexta-feira, 29 de dezembro de 2000

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LUÍS NASSIF


A década da regulação

Ponto central no novo modelo de Estado foram as agências de regulação, criadas após intensas discussões. O Estado deixaria de ter o papel fortemente fiscalizador e intervencionista, substituído pelo de regulador. A fiscalização seria substituída pelo contrato.
Para tanto, haveria que se definir um modelo a ser cumprido, indicadores a serem acompanhados e um arcabouço legal que obrigasse ao cumprimento do acordado. Esse arcabouço dependeria, em parte, de definições escritas mas, em maior profundidade, da jurisprudência que fosse sendo formada.
Dentre todas as agências, o maior desafio foi a reorganização do Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) -e aí sobressai o papel maiúsculo de seu primeiro presidente, Gesner Oliveira, e seu corpo de conselheiros.
O caso Kolynos foi a primeira decisão relevante a definir os parâmetros de julgamento da agência: respeito ao consumidor, em primeiro lugar, mas buscando fórmulas que não atrapalhassem a lógica de concentração das empresas.
O maior desafio do Cade foi o caso AmBev (a fusão das cervejarias Antarctica e Brahma), que se transformou em um verdadeiro episódio policial, tal o conjunto de manobras inescrupulosas articuladas por escritórios de lobbies barra-pesadas com jornalistas. Foi exemplar a dignidade com que o Cade se comportou diante da rede de suspeitas tecida com manipulação primária de notícias.
Três outras agências avançaram bem em suas áreas. De longe a mais bem-sucedida -e que menos trabalho deu, porque já criada dentro do ambiente previamente definido- foi a Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações).
A antecipação das metas das operadoras de telefonia, para se habilitarem a competir em todo o país, é a prova definitiva da eficácia desse modelo.
Na área elétrica, a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) penou mais, porque chegou antes da criação do marco regulatório. Mesmo assim, a soma de punições aplicadas a empresas do setor -e que foram confirmadas na Justiça- firmaram uma jurisprudência fundamental para o bom funcionamento do modelo.
Foi paradoxal o dia em que o presidente da Light foi obrigado a comparecer a uma audiência pública para explicar o apagão. Parte dos críticos apontava como a prova da falência do modelo. Era o oposto: a sua consolidação definitiva. Hoje em dia, a Aneel tornou-se uma instância importante na definição da própria modelagem do setor.
Na área de petróleo, a ANP (Agência Nacional do Petróleo) enfrentou o desafio das máfias na distribuição, sem dispor de uma estrutura adequada. Por outro lado, por conta da formação acadêmica de seu diretor, David Zylbersztajn, a ANP acabou inspirando a criação de fundos que, a médio prazo, deverão revolucionar a produção de tecnologia no país.
Em outras áreas, mesmo sem agências constituídas, houve grande avanço na criação de indicadores, como é o caso da educação e saúde.
Ainda há muito a avançar. Na área de transporte, pouco foi feito. A aviação continua presa a um modelo fechado ao público. Mesmo assim, o modelo é irreversível e já demonstrou a sua eficácia.

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