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ARTIGO
Juros baixos dos EUA inflam bolhas pelo mundo
JOHN PLENDER
DO "FINANCIAL TIMES"
Cobiça, euforia e a política
do Federal Reserve se combinaram para causar algumas distorções notáveis nos mercados
globais em 2004. Fuga para o lixo
é a frase deselegante mas acurada
que melhor capta o superaquecimento em propriedades residenciais, uma surpreendente compressão dos rendimentos no mercado de títulos e o retorno das
commodities como um playground aventuresco para os grandes apostadores.
Com os juros reais em curto
prazo no pós-bolha nos Estados
Unidos ainda em território negativo depois que o Fed voltou a aumentar os juros, permanece a
possibilidade de que as coisas
borbulhem alegremente por algum tempo. E, enquanto a Ásia
atrelar suas moedas ao dólar, as
tendências indutoras de calor da
política do Fed vão se estender
amplamente.
Como é sempre difícil definir as
bolhas, há espaço para uma agradável discussão sobre quais mercados estão meramente superaquecidos e quais estão borbulhando. A proliferação dos fundos
hedge é especialmente interessante nesse sentido. Pode-se ter uma
bolha em veículos de investimento coletivo?
Eu diria que qualquer coisa que
o dinheiro persiga de forma irracional pode ser tema de uma bolha. E aqui há características típicas de bolha. Primeiro, a multiplicação dos fundos hedge é impulsionada pela demanda: os tolos
abundam. A característica menos
típica é a ausência de euforia no
mercado. Tanto os investidores
institucionais como os varejistas
estão recuando para os fundos
hedge em reação aos baixos retornos produzidos recentemente pelas administradoras de fundos,
tanto ativas como passivas.
Uma coisa semelhante à falácia
da composição está ocorrendo,
porque, se os fundos hedge passarem a dominar o mercado, suas
altas taxas garantem que os retornos agregados serão menores que
antes, devido aos maiores custos
de transação. Parte da loucura de
os investidores darem dinheiro
para os florescentes fundos hedge
é que tantos deles seguem estratégias visivelmente semelhantes
que estão deixando de arbitrar retornos maiores.
Alguns praticantes da "triste
ciência" insistem em tentar retirar
a graça das bolhas afirmando que
os investidores são racionais, os
mercados são eficientes e as bolhas são uma impossibilidade teórica. Um exemplo clássico é a tentativa de Peter Garber de explicar
a mania de tulipas dos holandeses
afirmando que o mercado estava
funcionando eficazmente porque
é difícil criar tulipas raras. Sua valorizações da "bolha" eram portanto perfeitamente racionais. E a
bolha estourou quando se tornou
fácil propagá-las. Assim, a maior
oferta foi responsável pela queda
dos preços.
Foi uma boa tentativa, mas não
respondeu à pergunta de por que
os preços das tulipas de variedades comuns perfuraram o teto e
depois afundaram no piso.
Mais implacável ainda é Milton
Friedman, que acredita que a especulação desestabilizadora é impossível porque as pessoas que
constantemente comprassem na
alta e vendessem na baixa seriam
rapidamente eliminadas. Isso indica uma existência protegida.
Alastair Ross Goobey, presidente
do fundo Hermes, goza de um nicho no circuito de conferências
explicando com apoio estatístico
como os investidores institucionais habitualmente compram na
alta e vendem na baixa.
O motivo pelo qual muitos investidores fazem isso é que, diferentemente dos fundos hedge,
eles tentam minimizar seu risco
comercial em vez de maximizar
os retornos absolutos. Nesse sentido, é racional os investidores tirarem o dinheiro de administradoras ativas. Por isso, investir em
fundos hedge pode ser falta de
coisa melhor, e não algo puramente irracional. E os fundos
tracker são os especuladores desestabilizantes máximos, porque
a suposição implícita neles é que o
nível existente no mercado é inerentemente "certo".
Visões literárias
Charles Kindleberger afirmou
em seu esplêndido "Manias, Pânico e Crashes" que Dickens foi infinitamente inferior, em sua visão
da agiotagem, a Trollope, Balzac e
Zola. Ele está certo, de modo geral. A descrição de Melmotte, o
fraudador de "The Way We Live
Now", é maravilhosa; Balzac
compreende o que são seus financistas palpavelmente sórdidos e
cobiçosos; e Zola é sua personalidade forense habitual quando explora os truques do mercado de
ações em "O Dinheiro". Em comparação, Dickens não dá explicação para a queda do sr. Merdle em
"A Pequena Dorrit". Ele é visto
como que pelos olhos de gentinha
incompreensível e é um ogro unidimensional.
Mas eu defenderia Dickens em
sua explicação das bolhas. Seu relato de como o pai de Nicholas
Nickleby se arruinou em uma bolha reminiscente da mania financeira de 1825-6 resume perfeitamente a crença duradoura de que
a especulação se destina a solucionar todos os problemas, independentemente de risco (a corrida
para os fundos hedge é um eco
disso, é claro). Sua conclusão é
maravilhosa e atipicamente sucinta: "O curso da sorte foi contra
o senhor Nickleby; uma mania
prevaleceu, uma bolha estourou,
quatro corretores compraram
mansões em Florença, 400 ninguéns se arruinaram, e entre eles
o senhor Nickleby". Assim ele
também capta o lado insider/outsider de uma mania. E eu adoro
seu discurso corporativo vitoriano na muito fraudulenta Companhia Metropolitana Unida de Bolinhos e Pães Quentes e Entrega
Pontual. Não parece um ótimo
negócio?
Tradução de Luiz Roberto Mendes Gonçalves
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