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BORIS TABACOF
Guerra das moedas
Os riscos gêmeos do real valorizado e dos desequilíbrios das contas públicas já
recomendam atenção especial
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OS DOIS autores mais importantes da teoria da guerra colocaram visões diferentes sobre o apelo à solução das armas nos conflitos entre as nações. Clausewitz declarou a guerra como a continuação da política e da diplomacia por outros meios. Sun-Tsu disse que
a excelência militar consiste em dominar o exército inimigo sem precisar lutar, usando a arte do engano.
Não obstante o presidente francês
Nicolas Sarkozy advertir sobre o risco de "guerra econômica", não se
vislumbra um conflito armado, hoje
relegado às nações periféricas. Referências são feitas à situação criada
pela excessiva valorização do euro
em relação ao dólar, que desde 2002
passou de US$ 0,86 para quase US$
1,50. Os países da União Européia
estão alarmados com a supervalorização da sua moeda, levando, por
exemplo, a Airbus, em concorrência
feroz com a Boeing favorecida pelo
dólar barato, a ter afirmado estar sofrendo "ameaça de vida".
É claro que essa queda do dólar,
que detém a condição de reserva
global de valor, com evidentes vantagens para os EUA, deve-se a razões
estruturais decorrentes dos enormes déficits americanos nas suas
contas internas e externas. Mas as
questões envolvidas são mais complexas, indo além das comemorações dos seus adversários que se precipitaram em afirmar que o dólar teria virado um "pedaço de papel sem
valor".
O quadro global de ascensão vertiginosa da Ásia, com reservas predominantes em dólar de US$ 1,4 trilhão da China e US$ 1 bilhão do Japão, além dos países petrolíferos do
Oriente Médio, leva a crer que fugir
da moeda americana com sua ainda
maior queda implicaria novas perdas para esses países.
Enquanto isso, os EUA não demonstram aflição acentuada com a
queda do valor da sua moeda. A sua
crescente competitividade típica
dos países que têm moedas baratas,
a exemplo da China, já se revela na
forte queda do déficit da conta corrente, de um pico de quase 7% para
5,5% do PIB!
A inédita prosperidade dos emergentes suaviza o impacto dos desequilíbrios apresentados pelos ricos.
Mas ninguém se engane, pois a
ameaça de recessão nos EUA e na
Europa pode pôr em risco os ovos de
ouro dos altos preços dos produtos
que os emergentes conseguem como a própria China, inclusive o Brasil, que criam a cadeia da felicidade
dos novos ricos.
O quadro incerto da economia
global deve colocar o Brasil em estado de alerta. Os riscos gêmeos do
real valorizado e dos desequilíbrios
das contas públicas expressos na
elevada dívida interna já recomendam atenção especial, para não
ameaçar o ciclo de crescimento sustentado que se delineia no país. O
crescimento das importações, a remessa maciça de lucros e dividendos, até a irresistível atração das viagens internacionais, podem mudar
o quadro positivo do superávit da
balança de pagamentos.
Mesmo nos círculos mais ortodoxos, que defendem as flutuações dos
mercados como regra, já começou a
mudança dessa retórica. Ocorre
uma intervenção coordenada dos
principais bancos centrais para reduzir os riscos dos desequilíbrios do
sistema financeiro global, e as principais moedas, o dólar, o euro e o
yuan, tenderão a buscar uma nova
correlação. Não será o Brasil o último baluarte da livre flutuação da sua
moeda, sob pena de pagarmos mais
do que o preço que as dificuldades
globais podem nos cobrar. Os números das contas externas do mês de
novembro merecem atenção redobrada.
O fatalismo cambial não corresponde aos melhores interesses do
país, e, no quadro do reequilíbrio
mundial que virá, devemos buscar
melhor posição.
BORIS TABACOF , empresário, é vice presidente do Conselho Superior de Economia da Fiesp.
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