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São Paulo, domingo, 30 de março de 2003

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ATAQUE DO IMPÉRIO

ECONOMIA BOMBARDEADA

Ações americanas sofreram desvalorização de 15%; aéreas e tecnológicas foram as mais atingidas

US$ 1 tri evapora das Bolsas antes da guerra

ÉRICA FRAGA
DA REPORTAGEM LOCAL

Antes mesmo do início da guerra no Iraque, o mercado de ações norte-americano já havia amargado uma expressiva perda de US$ 1,1 trilhão como consequência direta dos temores em relação ao conflito. Esse valor que evaporou das Bolsas de Valores dos Estados Unidos é o resultado de uma queda de 15% nos preços das ações, segundo um recente estudo feito por economistas das universidades Stanford e Harvard.
Para estimar o percentual de queda do mercado de ações que poderia ser atribuído ao medo da guerra, os economistas Andrew Leigh, de Harvard, Justin Wolfers e Eric Zitzewitz, ambos de Stanford, acompanharam os movimentos de uma Bolsa eletrônica (www.tradesports.com) que oferece contratos futuros chamados "Iraque-Saddam".
Trata-se de quatro contratos -apelidados pelos economistas de "papéis Saddam"- nada convencionais que permitem a investidores apostar no tempo de permanência de Saddam Hussein no poder.
Os três pesquisadores computaram as perdas que os mercados de ações sofreram nos momentos em que a Bolsa eletrônica apontava o aumento da probabilidade do conflito e concluíram que a queda total chegou a 15%.
Segundo o estudo, as ações mais afetadas foram as de companhias aéreas, as tecnológicas e as de bens de consumo.
"Esses setores e todos os que dependem do que chamamos de consumo arbitrário, geralmente não essencial, foram os que mais sofreram. Isso dá uma indicação do efeito negativo da guerra sobre os índices de confiança dos consumidores", diz Eric Zitzewitz, professor de economia da Universidade Stanford.

Confiança abalada
A tendência apontada pelo estudo tem sido confirmada pela divulgação dos índices de confiança do consumidor nos EUA -assim como no Reino Unido-, que estão em níveis históricos muito baixos.
O problema é que a enfraquecida economia norte-americana vinha sendo sustentada justamente pelo ânimo dos consumidores, que seguiam gastando dinheiro apesar da crise.
O grande temor, agora, é que a combinação de guerra com os problemas anteriores da economia mine a confiança dos consumidores, principalmente os norte-americanos.

Recuperação distante
É da natureza dos mercados financeiros antecipar resultados de acontecimentos esperados para o futuro. Isso acaba se refletindo, também com antecedência, nos preços de ativos, como ações, moedas e commodities.
Esses movimentos viabilizam a realização de estudos como o feito pelos pesquisadores de Harvard e Stanford. A grande pergunta que fica é: quais são as chances de que as perdas provocadas pelo temor da guerra sejam recuperadas depois do conflito em caso da, ainda provável, vitória da coalizão entre EUA e Reino Unido?
A resposta de Zitzewitz não é das mais alentadoras. Segundo o especialista, os movimentos do mercado futuro indicam que há chances de recuperação de, aproximadamente, 50% da riqueza que evaporou das Bolsas.
Ou seja, Zitzewitz acredita que cerca de US$ 550 bilhões poderão ser recuperados depois da guerra. A outra metade deverá ser computada como prejuízo.
"É muito improvável que uma guerra com essas dimensões termine com um custo zero para o mercado financeiro. O que nos espanta é o valor expressivo das perdas, que ultrapassam em muito, por exemplo, os cerca de US$ 70 bilhões estimados em despesas militares", afirma o pesquisador.
O risco disso é o abalo ainda maior da confiança dos investidores, grupo que, assim como os consumidores, é considerado fundamental para a recuperação da economia global.
Assim como o mercado de ações não deve disparar depois da guerra, as chances de queda nos preços do petróleo também têm limites. Com base nos movimentos dos contratos que apostam na saída de Saddam Hussein e das oscilações das cotações do petróleo no mercado futuro, os economistas de Stanford e Harvard não apostam em forte redução nas cotações da commodity.

Petróleo
O modelo econométrico (baseado em métodos matemáticos e estatísticos) montado por eles e que leva em conta essas variáveis mostra que a guerra causou uma elevação de US$ 10 por barril de petróleo.
No entanto, o espaço para recuo dos preços da commodity é reduzido. "Encontramos evidências importantes de que os preços devem recuar no longo prazo, mas esses efeitos parecem pequenos e frágeis", diz Zitzewitz.
Segundo o estudo, o cenário intermediário traçado pelo CSIS (Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais), que prevê uma guerra relativamente rápida, mas com consequências bastante negativas para os preços do petróleo, é o mais provável.
De acordo com essa estimativa, poderia haver aumento dos preços em decorrência da interrupção da produção iraquiana por, pelo menos, seis meses. Com isso, os preços do petróleo atingiriam uma média de US$ 37 neste ano.
Os desdobramentos da guerra, até agora, parecem confirmar as conclusões dos economistas de Harvard e Stanford.
A certeza dos investidores de que o regime de Saddam será destituído logo parece se esvanecer a cada dia (leia texto abaixo).
Ao mesmo tempo, crescem os riscos de interrupção da produção do petróleo no Iraque por tempo mais longo do que o previsto. De acordo com uma reportagem publicada no diário econômico "The Wall Street Journal", comandantes britânicos já prevêem a suspensão das exportações do país por, aproximadamente, três meses.
Menor oferta mundial de petróleo implica preços mais altos. O problema disso é que a alta do preço do petróleo funciona como um imposto sobre a produção, ao encarecer os custos das empresas.
E isso põe em risco a já frágil economia mundial e ameaça abalar ainda mais a confiança de ariscos consumidores e investidores.


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