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OPINIÃO ECONÔMICA
O mapa da indústria
GESNER OLIVEIRA
O brasil está mudando. O
verbo planejar começou a
ser conjugado. O "Mapa Estratégico da Indústria", lançado pela
CNI (Confederação Nacional da
Indústria) na última terça-feira
em Brasília, é um exemplo. Ilustra uma tentativa de se desvencilhar das emergências do curtíssimo prazo e dedicar tempo para
pensar o futuro.
Não surpreende que o documento da CNI tenha recebido
pouco destaque relativamente à
sua importância. Foi uma semana de mudanças na equipe econômica, mais propostas esdrúxulas do deputado Severino e até
mesmo o raro evento de uma entrevista coletiva do presidente Lula. Prevaleceu o curto prazo.
Mas o documento da CNI é um
primeiro passo para a aplicação
de gestão e planejamento estratégico no debate sobre os rumos da
indústria e do país. O exercício da
CNI usa o chamado "Balanced
Scorecard", na denominação em
inglês, livremente traduzido por
"gestão estratégica" ou "mapa estratégico". Tal método, desenvolvido por Robert Kaplan da Universidade Harvard e aplicado em
várias empresas, consiste na tradução de objetivos estratégicos
em um conjunto bem definido de
programas de ação. Esses últimos
estão sujeitos a acompanhamento sistemático mediante um painel de indicadores.
A utilização de indicadores objetivos é essencial. Alguns defendem que Zico foi melhor do que
Romário. É uma questão empírica. Não é possível respondê-la
sem contar com indicadores pertinentes e saber, por exemplo,
quais os percentuais de finalização com sucesso, passes certos, desarmes, dribles, entre tantas outras estatísticas que ganharam espaço nas seções de esportes. Não
se pode prescindir de um painel
de indicadores relevantes para
avaliar o desempenho de um jogador, de uma equipe ou de um
país.
As metas fixadas pelo "Mapa
Estratégico da CNI" são ambiciosas. Estabeleceu-se uma taxa média de crescimento de 5,5% até
2010 e de 7% até 2015. Isso equivale a mais que o dobro da taxa
observada nos últimos dez anos
(2,43% anuais). Se o Brasil tivesse
crescido a 5,5% na última década, o PIB per capita seria de US$
5.125, mais de 53% de nível atual
(US$ 3.330). A última vez em que
o PIB cresceu mais de 5,5% foi em
1994, ano de lançamento do Plano Real (5,85%). A última vez em
que o PIB cresceu mais que 7% foi
em 1986 (7,51%), ano do Plano
Cruzado.
Embora singulares, as experiências da China e da Índia são úteis
para aguçar a vontade nacional
de resgatar o crescimento rápido e
sustentado. Fenômeno que ocorreu no Brasil durante a maior
parte do século 20, mas foi interrompido nas duas últimas décadas.
Para retomar a trajetória de
crescimento, será preciso concentrar esforços em uma mesma direção e em ritmo mais acelerado.
A impressão que se tem é que o
Brasil está promovendo mudanças na direção certa, mas a um
ritmo excessivamente lento. Tome-se a Lei de Falências, aprovada neste ano. Tramitou no Congresso por mais de dez anos, em
um período marcado por forte endividamento e reestruturação industrial, durante o qual instrumentos modernos de recuperação
de empresas teria sido essencial
para preservar os fatores produtivos no mercado.
Não adianta chorar sobre leite
derramado. Mas não se pode se
dar ao luxo de postergar aquilo
que no "Mapa da CNI" é tido como base do desenvolvimento como a logística, a oferta de energia,
a infra-estrutura de telecomunicações e o saneamento básico. Como se sabe, a situação é trágica
nessa matéria. Basta tomar um
dos indicadores selecionados pela
CNI: o estado de conservação das
rodovias, que, segundo o próprio
presidente Lula admitiu na entrevista de ontem, constitui uma fragilidade de seu governo.
A conquista da estabilidade de
preços nos anos 90 dá condições
mínimas para discutir médio prazo. A maior exposição da economia brasileira ao mundo crescentemente competitivo e marcado
por um ritmo alucinante de inovação tecnológica obriga ampliar
horizonte de planejamento.
Não há nada de errado na ambição das metas, antes pelo contrário. Mas, para alcançá-las, será fundamental garantir monitoramento adequado dos programas. Nesse sentido, os próprios
autores do "Mapa Estratégico"
admitem ser necessário detalhar
mais alguns dos objetivos e programas propostos. Contudo não
há dúvida de que o setor privado
tenha dado um passo importante.
Está na hora de o setor público fazer o mesmo.
Gesner Oliveira, 48, é doutor em economia pela Universidade da Califórnia
(Berkeley), professor da FGV-EAESP, sócio-diretor da Tendências e ex-presidente do Cade.
Internet: www.gesneroliveira.com.br
E-mail - gesner@fgvsp.br
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