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LUÍS NASSIF
A Unipar e o
"custo família"
O caso da holding Unipar é
o exemplo típico das deformações do capitalismo brasileiro. A criação da empresa,
em 1969, representou um
marco na história do mercado brasileiro, fruto da cabeça
brilhante do advogado José
Luiz Bulhões Pedreira. O
mesmo Bulhões Pedreira foi o
autor da Lei das Sociedades
Anônimas, que criou instrumentos de defesa dos minoritários.
Seis meses atrás, coube a
Bulhões Pedreira, a pedido
da família Soares Sampaio
-que controla a holding-
redigir o contrato firmado
com um dos mais prestigiados executivos brasileiros,
Edison Vaz Musa, ex-presidente da Rhodia, para reestruturar a companhia. Nesta
semana, Bulhões assumiu a
defesa de Musa, afastado da
companhia, acusado pela família controladora de não
corresponder às expectativas
iniciais.
A família Soares Sampaio
-cujo líder é Paulo Geyer,
genro de Alberto Soares Sampaio, já morto- possui apenas 17% do capital da Unipar. Mas esses 17% correspondem a 51% das ações ordinárias -com direito a voto-, o que lhe garante o controle da holding.
No primeiro trimestre do
ano passado, a Unipar registrou prejuízo de US$ 5,6 milhões. No primeiro trimestre
deste ano, lucro de US$ 6,6
milhões.
O custo da holding, mais
coligadas, era de US$ 22 milhões por ano. Baixou para
US$ 12,5 milhões, anualizados, dos quais US$ 4,5 milhões correspondiam ao chamado "custo família" -contratos com empresas de consultoria que não assessoravam e funcionários que não
trabalhavam, todos ligados à
família controladora.
Esse dinheiro é desviado diretamente do bolso do acionista minoritário. Durante
todo esse período, embora escudados em uma Lei das Sociedades Anônimas que garante seus direitos, os minoritários jamais reagiram a essa
situação. Apenas nesta semana foi constituído um conselho fiscal, incumbido de fiscalizar as contas da empresa.
Foi esse o pecado de Musa
-como de muitos outros
executivos que assumiram o
comando da Unipar, e tentaram inutilmente reduzir o
"custo família". E esse é um
dos componentes da tragédia
brasileira: a falta de reação
do consumidor (no caso, do
minoritário), mesmo sendo
tungado e tendo o amparo da
lei.
História
No entanto, no já longínquo
1969, a Unipar foi um marco na
história do mercado de capitais
brasileiro.
Em 68 e 69, foi lançado o programa petroquímico. O tema estava politizado. Discutia-se se o
monopólio da Petrobrás estaria
sendo ferido ou não.
Proibida por lei de se expandir,
a Refinaria União -controlada
pela família Soares Sampaio-
interessou-se pela petroquímica.
Mas sua implantação pressupunha que simultaneamente se
criasse uma grande quantidade
de fábricas que consumissem a
produção.
A Brasil Warrant (do grupo
Moreira Salles) detinha 50% do
capital da Carbocloro, fabricante
de soda. Os Soares Sampaio tinham a Petroquímica União. O
complexo foi acrescido de uma
fábrica de PVC e da Poliolefinas,
controlada pela Petrobrás. Na
montagem da companhia, a BW
e grupo Soares Sampaio ficaram
com 25% cada; a Petrobrás, com
25% e os outros sócios, com o
restante.
Para se capitalizar, o grupo decidiu fazer o maior projeto de
captação de recursos da época. O
que foi feito por meio do lançamento, em mercado, da novidade
das debêntures conversíveis em
ações, com correção monetária
-lance ousadíssimo, já que se
referia a uma holding que, em
vez de patrimônio imobiliário, tinha apenas ações como ativo.
Houve um grande lançamento
em novembro de 1970, cerca de
US$ 10 milhões ou US$ 12 milhões em debêntures conversíveis
em ações, imenso para a época.
Problemas de origem
Em breve começaram a surgir
os primeiros problemas com os
sócios. Paulo Geyer, genro de
Sampaio, passou a utilizar firmas satélites de parentes para
fornecer à Unipar. O que levou a
BW a retirar-se do negócio.
Tempos depois, o então presidente da Petrobrás, Ernesto Geisel, manobrou o preço do eteno
para obrigar o grupo a se desfazer da refinaria União. Na ocasião, ocorreu um dos episódios
mais nebulosos do mercado de
capitais brasileiro. A família
controladora saiu com patrimônio, o capital dos minoritários foi
literalmente reduzido a pó e eles
impedidos de se manifestar por
pressão indireta de organismos
da repressão.
Depois disso, a Unipar sobreviveu, porque dispõe de participação acionária em empresas tocadas por outros sócios. Mas a sucessão de crises com acionistas e
executivos parece mais a crônica
da morte anunciada.
O sucessor de Musa será o filho
de Paulo Geyer.
E-mail: lnassif@uol.com.br
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