São Paulo, sábado, 30 de junho de 2007

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FERNANDO CAMARGO

Oferta de eletricidade: alguma dúvida?

Não há dúvidas de que o Brasil requer alternativas urgentes de geração de energia para sustentar seu crescimento

O GOVERNO anunciou recentemente a decisão de retomar investimentos na usina nuclear Angra 3, projeto há décadas interrompido por conta de seu alto custo. A despeito dessa desvantagem evidente, a energia nuclear vem readquirindo simpatizantes ao redor do mundo por duas razões básicas: não gera emissões de gases nocivos ao ambiente quando operada de forma segura e tem custo operacional, hoje, menor do que o de térmicas à base de combustíveis fósseis. O governo brasileiro parece convencido da conveniência de elevar a participação dessa fonte na matriz energética brasileira.
Não há dúvidas de que o Brasil requer alternativas urgentes e firmes de geração de energia para sustentar o crescimento do PIB da ordem de 5% ao ano que vem se insinuando.
Mas também não há dúvidas de que o país dispõe de uma série de projetos em energia mais vantajosos sob diversos aspectos. Exemplo claro disso são os empreendimentos hidroelétricos no rio Madeira: embora complexos por serem de grande porte (cerca de três vezes maiores que Angra 3), tais projetos estão hoje em status bastante avançado no que se refere às soluções de tecnologia, ambientais, financeiras e empresariais.
Embora seja evidente que os projetos do Madeira (e outros semelhantes) são vitais para reduzir o risco de racionamento a partir de 2012, não são poucas as dúvidas acerca de se, e quando, eles se viabilizarão. Recentemente o governo anunciou ao mercado as bases da formatação desses projetos. Houve avanços importantes: a alocação adequada de riscos entre os agentes (como riscos institucionais e sociopolíticos, que poderão ensejar revisão de tarifas); e definições contratuais (regime de venda e quantidades de energia ao longo do tempo, predefinição da tarifa de transmissão, preço teto para quando a usina precisar comprar energia no mercado etc.). Tais avanços mostram a maturidade institucional (regulação e contratos estáveis) necessária para atrair investimentos, inclusive públicos.
Mas seguem em aberto pontos que são fundamentais para a viabilização de projetos estruturantes como os do Madeira. Duas questões se destacam: a ambiental e a da financiabilidade.
Na frente ambiental, é necessário que os empreendedores e a sociedade possam conhecer antecipadamente os requisitos necessários para a aprovação de licenças; cronogramas de análise e de liberação; critérios para alocação de passivos ambientais que surgirem entre a liberação da licença de instalação e a prévia, de forma a que novas exigências advindas de pressões políticas locais não venham a inviabilizar o projeto.
Quanto à financiabilidade, é urgente adotar arranjos funcionais, já utilizados internacionalmente, para garantir a execução de projetos. Em vez de exigências tradicionais (registros em balanço, exigências de patrimônio e ativos mínimos etc.), que interferem na composição de consórcios, diluem seu capital controlador e excluem da concorrência grande número de investidores capacitados, é chegada a hora de adotar mecanismos de "project finance" puro, garantidos por bons projetos, contratos perfeitos, estrutura sólida de seguros e regras de arbitragem de conflitos envolvendo alocação de riscos.
Esses procedimentos deveriam estar presentes em todos os projetos de grande porte e essenciais. Suas vantagens seriam logo percebidas por toda a sociedade na forma de mais investimentos, mais concorrência, tarifas mais baixas e maior desenvolvimento econômico.


FERNANDO CAMARGO, 37, é mestre em economia pela Unicamp e sócio-diretor da LCA, onde dirige as áreas de inteligência de mercados intermediários e de investimento e finanças corporativas.


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