São Paulo, terça-feira, 30 de junho de 2009

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BENJAMIN STEINBRUCH

Ciclotimia e disparidades


Sem a volta da confiança, talvez o mundo tenha de se conformar com o avanço modesto da economia

CHEGA AO fim o primeiro semestre, um dos mais depressivos da economia mundial em 80 anos. No último trimestre do ano passado, nos momentos de crise global aguda, muitos previam que, a partir do segundo semestre de 2009, o mundo entraria em recuperação.
As percepções de hoje, infelizmente, não confirmam essas previsões. A economia mundial continua em plena recessão, e a evolução dos indicadores se dá de forma ciclotímica, ora voltada para a esperança, ora para o desalento. Nos últimos dias, vivemos uma fase de pessimismo, com recuo generalizado nos mercados de valores.
O pessimismo cresceu depois que algumas instituições internacionais publicaram suas estatísticas e previsões. O Banco Mundial, por exemplo, revisou para cima sua estimativa de recessão global em 2009 -a queda média do PIB passou de 1,7% para 2,9%. O economista Nouriel Roubini considerou que os preços do petróleo, que estão em alta, poderão chegar a US$ 100 o barril, o que eventualmente levará a economia global a uma nova recaída. O "Senhor Apocalipse", como é conhecido o economista por conta de suas previsões catastróficas corretas do passado, agora acha que a recessão global terá a forma de um "W". Já houve a queda da primeira perna do "W", haverá uma recuperação e depois uma nova queda profunda.
Torço, obviamente, para que Roubini esteja errado. Os indicadores da economia brasileira, como observou o Iedi em sua análise da semana passada, expõem resultados díspares, numa clara demonstração de que os ajustes se dão em ritmos desiguais nos variados setores. O PIB brasileiro teve queda de 0,8% no primeiro trimestre, mas o setor de serviços, que representa 60% do produto, apresentou expansão de 0,8%. A indústria, sem nenhuma dúvida o setor mais atingido pela crise, teve recessão de 3,1% no primeiro trimestre. Mesmo dentro da indústria há resultados díspares. Setores mais voltados para o mercado interno conseguem ainda crescer, enquanto os exportadores sofrem com a queda do comércio internacional.
No comércio interno, os dados de maio também apresentam disparidades. Enquanto o sistema de proteção ao crédito da Associação Comercial de São Paulo indica variação negativa de 2,8%, as consultas ao sistema Usecheque, que revela o nível de vendas à vista, apresenta alta de 1,8%. O consumo de energia no país também registrou queda (2,3%) em maio na comparação com abril.
Na área do crédito, os empréstimos dos bancos tiveram alta de 4,54% em maio e atingiram a cifra de R$ 779 milhões. O resultado é positivo, mas as taxas de crescimento mensais ainda estão muito longe das dos dois últimos anos, quando o crédito avançou, em média, 11% ao mês.
Isso indica que o sistema financeiro ainda reluta na oferta de crédito ao setor privado.
Enquanto não voltar a confiança no sistema, talvez o mundo tenha de se conformar com a estagnação ou com o crescimento modesto da economia. Felizmente, para os países emergentes, há antevisões mais otimistas. A OCDE estima para 2010 crescimentos de 9,3% na China, de 7,2% na Índia, de 4% no Brasil e de 3,7% na Rússia, ao mesmo tempo em que o mundo desenvolvido permanecerá estagnado.
O mundo viveu um longo período em que o crescimento econômico era puxado pelos países desenvolvidos. Parece que esse mundo ficou para traz. Mas, encerrada a primeira metade deste ano de crise, ninguém está seguro para fazer previsões em meio à ciclotimia e às disparidades que caracterizam o atual momento da economia mundial.


BENJAMIN STEINBRUCH , 55, empresário, é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, presidente do conselho de administração da empresa e primeiro vice-presidente da Fiesp.

bvictoria@psi.com.br


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