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LUíS NASSIF
As metas inflacionárias
Para muitos o sistema de "metas
inflacionárias" -o modelo de previsões que pautará a política monetária do Banco Central daqui
por diante- é uma sofisticação
acadêmica desnecessária. É possível. Mas não há como negar que,
desde as mudanças introduzidas
por Ibrahim Eris, no início dos
anos 90, pela primeira vez vê-se vida em movimento no Banco Central, preparando-o para atuar
dentro dos novos paradigmas da
globalização.
Para o presidente do BC, Armínio Fraga, a partir do momento
em que o país optou pela flutuação
do câmbio, havia a necessidade de
instituir uma outra âncora para
administrar as expectativas. A
mais tradicional, a meta monetária, caiu em desuso, pelas novas
formas de moedas eletrônicas, investimentos, formas de crédito que
implodiram o conceito de agregados monetários. Outra alternativa
seria criar modelos discricionários, sem regras fixas. A opção foi
pela estabilidade explícita, o sistema de "metas inflacionárias", visando a ancorar as expectativas do
mercado em relação aos preços.
Funciona assim:
1) Estima-se um cenário de inflação a ser perseguido no médio prazo, juntando diversos indicadores
de preços e de atividade.
2) A partir dele, define-se a taxa
de juros adequada para manter a
inflação sob controle.
3) Os mecanismos de transmissão da política monetária são basicamente a taxa de juros e o compulsório (o percentual dos depósitos que os bancos têm que recolher
ao Banco Central). Taxas de juro
influenciam investimento, consumo de bens duráveis, crédito em
geral, taxas de câmbio e -importante- as expectativas dos agentes econômicos.
4) Vai-se tolerar um certo desvio
nas metas inflacionárias. O desvio
é a margem de tolerância do BC a
choques de oferta. Quanto maior a
margem de tolerância, maior a
margem para ajustes graduais de
rota. Se a margem de tolerância é
zero, um choque de demanda muito forte leva a um salto dos juros
com efeitos de curto prazo na inflação, mas levando a recessões
brutais. Na Inglaterra a margem
de desvio é de um ponto percentual
ano. Por aqui, deverá ser maior.
Estatísticas
A primeira dificuldade do modelo é a falta de séries estatísticas
confiáveis e suficientemente longas para permitir traçar cenários
razoáveis de médio prazo. Armínio lembra que a Nova Zelândia
instituiu o modelo em pleno vôo,
mal saindo de um ambiente hiperinflacionário. Depois, foi ajustando a máquina.
Para operar a contento, foi necessário dotar o BC de um Departamento de Pesquisa. Até então tinha um Departamento de Estatística bem montado, mas sem nenhuma forma de análise sofisticada de cenários.
A segunda dificuldade são as
distorções entre a taxa primária
de juros e a taxa que chega ao tomador de crédito. Quando o mecanismo está azeitado, com muito
pouco movimento o Federal Reserve consegue induzir a mudanças de cenário. Aqui os juros influem na atividade econômica,
mas a níveis dramaticamente elevados. Armínio tem consciência
de que os mecanismos de transmissão -da taxa primária do
Banco Central ao crédito- são
extremamente imperfeitos no
país. Por isso mesmo, considera
que parte do desafio do novo BC
será conectar as taxas com os instrumentos de crédito.
O Departamento de Pesquisa
passou, então, a incorporar o
mundo real em suas análises. E
identificou três frentes de combate para a redução da taxa de juros
na ponta do tomador: a previsibilidade macroeconômica, a redução das cunhas fiscais (trabalho
que está sendo desenvolvido pela
Receita) e a competição.
Um dos pontos centrais das altas taxas de juro é a estrutura de
depósitos compulsórios, campo
em que o BC tem se comportado
de maneira bastante conservadora. No médio prazo, a tendência é
de redução do compulsório, assim
como do direcionamento de crédito. Por enquanto, o compulsório
está sendo utilizado para controlar a demanda. Teme-se que, com
redução de juros e liberação do
compulsório, haja excesso de liquidez, provocando movimentos
especulativos.
É até possível que o novo modelo
não vingue. Mas, inegavelmente,
mudou a maneira de o BC ver a si
próprio: não mais um mundo cercado por um país, mas como uma
peça de uma engrenagem maior,
da economia.
E-mail: lnassif@uol.com.br
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