São Paulo, quarta, 30 de julho de 1997.



Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

CRISE
Para o ex-ministro Delfim Netto, FHC não tinha liberdade de escolha, pois virou refém da política cambial
'Eu duvido de que FHC quisesse Franco'

JOSÉ ROBERTO DE TOLEDO
da Reportagem Local


Crítico do novo presidente do Banco Central, o deputado e ex-ministro do Planejamento Delfim Netto (PPB-SP) diz que o presidente Fernando Henrique Cardoso nomeou Gustavo Franco para sinalizar ao mercado financeiro que não haverá mudança cambial.
"O próprio presidente é refém do câmbio". Para Delfim, a nomeação põe José Serra, outro crítico da política cambial, "a quilômetros do governo". A seguir, a entrevista concedida ontem pelo deputado à Folha pelo telefone.

Folha - Qual a consequência da saída de Gustavo Loyola e a entrada de Gustavo Franco na presidência do Banco Central?
Delfim Netto
- Não conheço as circunstâncias, mas não acredito que haja mudanças de política, já que o presidente nomeou o diretor de câmbio. O que o governo quer é que o mercado leia que a saída do presidente do Banco Central não tem nenhuma consequência -o que é um engano. Loyola tem qualidades excepcionais, é respeitador das normas, faria bonito até na Alemanha.
Folha - E o Gustavo Franco?
Delfim
- Gustavo Franco é um profissional competente. Só o que lhe faltou foi um bom chefe. Agora ele está salvo, porque o Fernando Henrique é o melhor chefe que ele poderia ter, dá ordens firmes...(risos).
Folha - O senhor acha que pode haver um endurecimento da política cambial?
Delfim
- Não acredito. O próprio presidente tem dito que a política cambial está errada.
Folha - Então a nomeação de Gustavo Franco, mentor dessa política, não é uma contradição em termos?
Delfim
- O governo precisava dar um sinal claro de que vai continuar refém do mercado financeiro internacional, dando retorno em dólar aos investimentos para satisfazer a gulodice do mercado.
Folha - Quais as consequências para os críticos de Franco, como o senador José Serra (PSDB-SP)?
Delfim
- Acho que isso põe o Serra a quilômetros do governo e da chance de voltar ao ministério. Mostra que o próprio presidente é refém do câmbio, não pode mexer.
Folha - O que o senhor acha que vai acontecer com o câmbio?
Delfim
- O governo vai insistir no erro porque não tem alternativa. Vai manter a sobrevalorização. E para dar essa demonstração clara, não tinha ninguém melhor do que o Gustavo Franco.
Folha - Não havia opções?
Delfim
- Eu duvido de que o Fernando Henrique quisesse pôr o Gustavo Franco no cargo de presidente do Banco Central. Mas ele não tinha nenhum grau de liberdade de escolha. Sua única saída era pôr o Gustavo. Acho até que ele (Franco) se demitiria se o escolhido tivesse sido outro. Fernando Henrique deve ter tentado evitar isso (a saída de Gustavo Loyola) de todas as formas, porque sabe que implicaria risco.
Folha - Por que o senhor acha que Loyola saiu?
Delfim
- Para o Fernando Henrique ter deixado o Loyola sair é porque deve ter havido uma divergência muito séria. Não há momento menos propício para a saída do presidente do Banco Central do que em meio a uma crise internacional (a crise cambial dos "Tigres Asiáticos"). A crise é uma onda, um processo que vai infectando todos os países. A desconfiança de que a posição brasileira é insustentável vai crescendo. Todos sabem que o presidente só pensa em se reeleger. Isso tudo vai criando uma perspectiva muito ruim.




Texto Anterior | Próximo Texto | Índice



Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita do Universo Online ou do detentor do copyright.