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LUÍS NASSIF
Conversas ao pé
da história
O ex-ministro Antonio
Delfim Netto escreve
muito. Mas, como seu conhecimento é muito maior do que
seus artigos podem comportar, recorro a ele para testar
algumas hipóteses sobre o rentismo brasileiro.
Por que o câmbio freqüentemente deixou de ser utilizado
como mola de desenvolvimento no Brasil, diferentemente
do que ocorreu em países como Coréia do Sul, Japão e China agora, com os Estados Unidos e a Inglaterra em tempos
passados? Por que o Barão de
Mauá não obteve autorização
para trazer crédito barato e irrigar a economia? Na época,
Mauá atribuía a resistência
do imperador em autorizar a
abertura de casas bancárias
aos interesses financeiros que
cercavam a corte (na época, os
escravagistas) e que tinham ligações com os bancos ingleses
e não aceitavam taxas de juros inferiores a 25% ao ano.
Lembra Delfim que os escravagistas tinham escritórios em
Londres, depositavam em
bancos, como Schroeder,
Rothschild, e esse dinheiro era
emprestado ao Brasil. Londres
era uma espécie de centro internacional de lavagem de dinheiro.
Com as restrições ao comércio escravagista, os bancos
londrinos interrompem as
operações com clientes que tivessem alguma ligação com o
trabalho escravo. É esse movimento que permite aos cafeicultores paulistas substituir os
escravagistas como parceiros
preferenciais da banca internacional e se tornar os novos
donos da liquidez nacional.
O modelo era o mesmo. Depositavam em bancos ingleses,
que emprestavam ao Brasil.
Os recursos eram aplicados
nas PPPs da época, serviços
públicos, estradas de ferro,
com remuneração garantida e
vantagens escandalosas. Cada
empreendimento permitia à
Inglaterra inundar o país com
consultores, insumos, que entravam sem pagamento de taxas.
É possível que a reforma fiscal de Campos Salles, que
manteve intocados os interesses dos credores externos, no
fundo visasse apenas proteger
os ativos dos próprios cafeicultores.
Com a monocultura do café,
cada safra frustrada reduzia o
ingresso de divisas e provocava uma desvalorização do
câmbio. O novo patamar viabilizava milhares de pequenas
empresas por todo o país, que
davam início a um processo de
substituição de exportações.
Nos anos seguintes, uma supersafra aumentava o ingresso de divisas. O fluxo financeiro apreciava o câmbio, matando as empresas criadas no
período anterior. Um controle
eficiente do fluxo de capitais
teria permitido florescer mais
cedo a atividade industrial no
país. Mas significaria cortar a
maior fonte de renda da classe
dominante de então -a arbitragem de taxas.
Nos anos 20, o país chegou a
recorrer a uma espécie de
"currency board", similar ao
recente, da Argentina, com financiamento inglês, levando
a uma grande apreciação
cambial.
Getúlio Vargas rompe com
esse modelo estabelecendo o
controle cambial, renegociando a dívida (após um "default") e desvalorizando o
câmbio. A pujança de São
Paulo e a industrialização do
país começavam ali.
E-mail -
Luisnassif@uol.com.br
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