São Paulo, sábado, 30 de outubro de 2004

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Presidente do Ipea diz que os juros inviabilizam crescimento sustentado

RAFAEL CARIELLO
ENVIADO ESPECIAL A CAXAMBU

O sociólogo Glauco Arbix, presidente do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) -órgão ligado ao governo federal e elaborador da política industrial da gestão Luiz Inácio Lula da Silva-, disse anteontem à noite, em Caxambu (MG), que "ninguém sustenta crescimento com os juros que estão aí".
Arbix elogiava o atual ritmo de crescimento da economia do país e defendia a idéia de que os juros não conseguiram inibir a arrancada, mas fez a ressalva. "Para sustentar, os juros vão ter que abaixar. Assim como vai ter que diminuir a carga tributária. Não tem nem por onde", disse o sociólogo durante debate no 28º Encontro Anual da Anpocs (Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais).
Sobre a redução da carga tributária, disse não ser tarefa fácil, comentando ainda a ineficiência do Estado brasileiro. "Diminuição da carga tributária significa diminuição do bolo estatal para tudo o que o Estado faz. Ah, mas o Estado é ineficiente. Vai continuar por um longo período -nossos netos, bisnetos."
Ele não deu prazo desejável para a queda nem defendeu uma taxa ideal. Mais tarde, no mesmo debate, disse concordar com outro integrante da mesa, o economista José Marcio Rêgo, da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo, que havia criticado a taxa básica de juros praticada no país, afirmando que ela inibe políticas industriais.
Arbix, no entanto, disse não acreditar que o debate sobre juros seja o mais importante nem que a política industrial dependa dessa discussão para acontecer.
"Posso até concordar com você que os juros poderiam estar mais baixos. Mas é uma discussão que eu não saberia fazer. Não sou a pessoa adequada para fazer", disse, acrescentando que "ninguém no mundo" vai convencê-lo de que juros na casa de "14,75% ou 13,75%" fariam com que o país estivesse "às mil maravilhas". A Selic (taxa básica fixada pelo governo) está em 16,75%.
E disse também, imitando um suposto crítico da política econômica do governo Lula: ""Ah, porque o superávit primário é alto, é um escândalo". Óbvio. Porque os credores não se dispõem mais a sustentar o país. Nem os externos nem os internos. "Ah, por que o Brasil não tem juros de Primeiro Mundo?" Porque o Brasil não é um país de Primeiro Mundo, não vai ter nunca juros de primeiro mundo. O credor não vai deixar".
O presidente do Ipea apresentou as características fundamentais de uma política industrial para o país, diferente do "dirigismo estatista dos anos 60 e 70" e da "fragmentação dos anos 90". Essa política, ele disse, investirá em produtos capazes de concorrer no mercado internacional -citou semicondutores, softwares, bens de capital e medicamentos-, mas será distante "da política que beneficia os velhos grupos", como o empresariado paulista.
Após afirmar que "estamos hoje crescendo a mais de 7% ao ano", que a vulnerabilidade externa é menor e elogiar o atual ciclo de crescimento como um dos mais duradouros desde o Plano Real, Arbix disse que a macroeconomia impõe "entraves", "limitações" e "constrangimentos totais muito grandes... mas não impede que façamos política industrial".
Ontem, o ex-ministro das Comunicações do governo Fernando Henrique Cardoso, Luiz Carlos Mendonça de Barros, em outro debate na Anpocs, disse que o projeto de política industrial do governo Lula é mero "penduricalho" e que o grupo chefiado pelo ministro Antonio Palocci Filho (Fazenda) "não acredita em política industrial, em intervenção".
Sobre as taxas de juro, após criticar o modo como o Brasil vem se inserindo na economia mundial, disse que "o Copom vai subir mais 2% os juros". "Se formos ler corretamente a ata do Copom, é mais 2%, 2,5%. Não adianta reclamar", declarou.


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