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LUÍS NASSIF
O renascer argentino
Pouco antes de explodir a
Lei da Conversibilidade na
Argentina -que permitia a livre conversão da moeda local, o
peso, com o dólar, na paridade
de um por um- conversei com
alta autoridade monetária brasileira que não tinha dúvida: a
economia do país seria totalmente dolarizada, espantando
para sempre o fantasma de crises cambiais. Ponderei que, com
aquela paridade, a dolarização
significaria a desindustrialização total do país. Resposta: eles
têm bom nível de instrução, boa
agricultura, precisam se conformar em serem exportadores de
produtos agrícolas e de serviços.
Indaguei se ele tinha combinado isso com os russos.
Há países que se deixam matar. Outros resistem até o fim.
Depois de ter descido ao inferno
com a implosão do sistema cambial e amargado quedas recordes do PIB, a Argentina está renascendo.
Há quem atribua a queda do
PIB ao calote da dívida externa.
Há duas malícias aí. A primeira
é que a queda do PIB foi conseqüência da explosão da conversibilidade. O calote está sendo
aplicado agora, e o país está
crescendo. A segunda é que calote é deixar de pagar, podendo.
Quando não se consegue, o nome adequado é "reestruturação
da dívida".
Tanto assim que, em janeiro,
se completado o processo de renegociação com os credores, não
há dúvida de que capitais externos -grande parte dos próprios
argentinos- começará a retornar ao país.
A Argentina está saindo do
buraco comandada por Néstor
Kirchner, um presidente boquirroto, ironizado por qualquer argentino pensante, com um ministério medíocre.
Dos grandes intelectuais argentinos, historiador, jornalista
e músico, o octogenário Félix
Luna é desses entusiasmados
com a recuperação do país, embora não tenha um pingo de admiração por seu presidente.
A economia está se recuperando, a indústria renascendo, o superávit fiscal está de volta, assim
como o superávit das contas externas, e a inflação está sob controle. O país que está acabando
de impor aos credores perdas gigantescas -embora menores
do que os ganhos gigantescos
que tiveram antes de o país quebrar- tem juros razoáveis e
não padece da "incerteza jurisdicional" brandida por economistas brasileiros.
O que Kirchner fez foi apenas
rejeitar as imposições ilógicas
do FMI -que, a cada queda da
arrecadação, por conta da recessão, recomendava mais aumento de impostos, que traziam
mais recessão-, endurecer na
renegociação da dívida, por absoluta falta de alternativa, e
manter um câmbio favorável
para a produção. Está meramente praticando o bê-a-bá do
desenvolvimento: a defesa, mesmo que por vezes primária e intransigente, do interesse nacional.
Luna faz parte do grupo de intelectuais que acredita que a
aproximação com o Brasil é irreversível e fundamental para o
país. Atribui os problemas comerciais atuais apenas à assimetria das duas economias e à
retórica candente de Kirchner.
E-mail -
Luisnassif@uol.com.br
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