São Paulo, terça-feira, 30 de dezembro de 2008

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Hidrovia parada ameaça escoamento da safra

Disputa na Justiça paralisa as operações na Tietê-Paraná; transporte de mais de 1 milhão de toneladas de grãos está em risco

Carga de grãos deverá ser transportada por caminhão, o que eleva o custo do transporte e os riscos nas estradas do interior de SP

AGNALDO BRITO
DA REPORTAGEM LOCAL

O transporte da safra de grãos de parte do Centro-Oeste rumo ao porto de Santos deve piorar muito em 2009.
Uma disputa que foi parar na Justiça entre a DNP Indústria e Navegação, principal companhia de navegação da hidrovia Tietê-Paraná, e a Marinha paralisou as operações dos sete comboios de soja operados no trecho entre São Simão, sul de Goiás, e os terminais graneleiros de transbordo para trens, em Pederneiras (SP), ou caminhões, em Anhembi (SP).
É a primeira vez desde o início das operações da hidrovia, há 15 anos, que o transporte ficará parado e sem perspectiva de retomada.
A Caramuru, um das maiores tradings de capital nacional e a maior usuária da hidrovia, ainda não anunciou o que pretende fazer para transportar mais de 1 milhão de toneladas de grãos devido à paralisação de todo o complexo logístico da Tietê-Paraná.
Em 2008, a DNP transportou 1,2 milhão de toneladas de soja e projetava elevar esse volume para 1,4 milhão a 1,5 milhão de toneladas neste ano não fosse a punição aplicada pela Marinha.
A paralisação das atividades da DNP foi determinada pela Capitania Fluvial do Tietê-Paraná, ligada ao 8º Distrito Naval da Marinha. Desde o dia 15 de dezembro, cinco tripulações da DNP estão suspensas, impedidas de comandar comboios de transporte de soja e açúcar. Outras duas tripulações já estavam suspensas por determinação da Marinha.
A decisão foi tomada pelo vice-almirante Terenilton Souza Santos, depois que os comandantes fluviais da companhia de navegação desrespeitaram a exigência de desmembramento dos comboios de quatro barcaças que cruzam o vão sob a ponte SP-191, no interior de São Paulo, na região de Botucatu.
A Marinha exige que todos os comboios da DNP -a única armadora da hidrovia a operar nesse trecho para alcançar o terminal de Anhembi- sejam ancorados e as tripulações executem manobras de desmembramentos dos comboios para a passagem de duas barcaças por vez sob a ponte.
A Capitania do Tietê-Paraná alega que a operação faz parte das medidas de segurança e tem como objetivo evitar acidentes, como choques entre os comboios e os pilares da ponte. Em nota, o 8º Distrito Naval afirmou que a empresa tem descumprido a exigência.

Tamanho do vão
Segundo a empresa, o vão de 77 metros -tamanho da passagem considerando as proteções dos dois pilares- é suficiente para a passagem dos quatro comboios de uma só vez, sem a necessidade de desmembramento. A empresa alega ainda que a própria Marinha autoriza a passagem de comboios em vãos menores sem o desmembramento, como o vão livre das pontes SP-225, com 64 metros, e SP-595, com 68 metros.
Mesmo depois do cumprimento da suspensão imposta pela Marinha, as tripulações não poderão voltar à navegação. Segundo a DNP, a Marinha exige da empresa o pagamento das multas aplicadas pelo não cumprimento da exigência. A companhia de navegação entrou com ações na Justiça questionando a aplicação das multas. O assunto está sub judice.
Sem a autorização para navegação, os comboios não podem transitar pelo canal. Criou-se um impasse cujo desfecho é imprevisível em relação ao tempo e à solução a que se chegará.
Por conta dessa incerteza em relação ao retorno da operação, a DNP já informou à Caramuru, maior usuária do transporte hidroviário, que não tem como garantir a execução do contrato. "Já dissemos que não vamos ter como cumprir o contrato. Já disponibilizamos a estrutura para que a Caramuru possa usar", disse Pedro Burin, diretor da DNP. Em dezembro, a companhia diz que deixaria de transportar 60 mil toneladas de soja -prejuízo de R$ 2 milhões.

Disputa antiga
A disputa entre a DNP e a Marinha é antiga. A companhia navegadora alega que as regras impostas para a operação na Tietê-Paraná representam um entrave ao desenvolvimento desse transporte.
O desmembramento é uma exigência que reduz brutalmente a produtividade da hidrovia e é apontada por usuários e pela maior armadora da Tietê-Paraná como uma das razões para o baixo volume de carga transportada por essa modalidade no Estado. Basta observar os volumes de transporte realizados neste ano.
A hidrovia Tietê-Paraná foi projetada para suportar o tráfego de 20 milhões de toneladas de carga por ano. Em 2008, as projeções indicam que pelo canal de navegação -que interliga regiões produtoras do Centro-Oeste aos terminais de Pederneiras e Anhembi- passaram 2 milhões de toneladas.
Sem a maior transportadora da hidrovia, a previsão é que o volume de carga com destino ao porto de Santos, 97% do que transita pela hidrovia, passe a ser transportado sobre caminhões, uma modalidade de transporte muito mais cara, perigosa e poluente.
Os números sobre a capacidade de transporte dos comboios de soja mostram o potencial hoje ignorado pelo país.
Uma única barcaça transporta 1.500 toneladas, volume equivalente a 15 vagões, ou mais de 50 carretas. Cada tonelada transportada pela hidrovia custa cerca de US$ 0,025 por quilômetro. O valor sobe para US$ 0,064 na ferrovia e para US$ 0,084 quando a carga é transportada em rodovias.


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