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PAULO RABELLO DE CASTRO
Piripaque
Qualquer anúncio de aceleração de gasto provocará ajuste para baixo na riqueza
esperada pelo setor privado
NUM PAÍS emergente, de massas pobres, nada supera em
importância social o objetivo do crescimento acelerado. O
exemplo mais recente e impressionante vem da China, que acaba de
anunciar haver crescido mais 10,7%
-outro recorde- em 2006, sobre
sua produção do ano anterior. Em
um único ano de crescimento tão
acelerado, a China conseguiu resgatar cerca de 50 milhões chineses para além da linha da pobreza. Em dez
anos, serão 500 milhões, ou seja,
cerca de três vezes a população total
do Brasil.
Aqui, com retardo de quatro anos,
Lula lançou o PAC (Programa de
Aceleração do Crescimento). Pretende, com as medidas anunciadas,
fazer a locomotiva velha e emperrada andar ao dobro da velocidade da
última década: 5% anuais, contra os
medíocres 2,5% obtidos na média
dos anos da estabilização econômica do Real. Conseguirá o milagre?
Ou teremos um piripaque tentando
acelerar a máquina ao ritmo de 5%?
Uma conta rápida: a 5% ao ano, ao
final deste mandato de Lula, cada
brasileiro terá -per capita- mais
R$ 1.300 de renda anual, ou o equivalente a R$ 100 adicionais por mês,
com direito a um décimo terceiro de
igual valor. Permanentemente. Essa é a diferença representada pelo
acréscimo do PIB -em apenas quatro anos- se o país vier a crescer
5%, em vez de repetir os pífios 2,5%.
O impacto político de um PAC
bem-sucedido não precisamos ressaltar. Será a glória ou a desgraça do
projeto político do governo. Pacto
social do Brasil ou piripaque final.
Daí a importância crucial de acertar no diagnóstico do que, de fato,
empurrará para a frente a locomotiva brasileira. Por que crescíamos
tanto nos anos 50, 60 e 70, quando
éramos mais pobres, mais ignorantes e politicamente mais ingênuos?
Por que não mais? Não existem respostas triviais para essas questões.
O governo continua errando no
seu diagnóstico central do estancamento do país. Invertendo a causalidade do problema, o governo enxerga a máquina pública como solução. Por isso, anuncia um PAC que é
76% condicionado por investimentos e iniciativas públicas. Os outros
24% é que são confiados ao país que
paga os impostos. O governo, com
sua máquina obesa e suas regras decadentes, não é a cura; ele é a doença.
O erro de inversão de diagnóstico
provoca uma trágica matroca de terapêutica. O governo anuncia que
gastará muito mais, comandando o
processo da retomada do crescimento. É fórmula que só funciona,
por pouco tempo, quando um país
está sofrendo de crise financeira de
liquidez. Como na depressão americana dos anos 30. O inverso do caso
brasileiro. Aqui há sobrecarga financeira, com muito dinheiro girando para refinanciar o próprio governo, juros altos e câmbio baixo,
apreciado demais. E impostos à
vontade. O oposto da típica situação
keynesiana.
Logo, qualquer anúncio de aceleração de gastos -assim explica a
moderna teoria- provocará ajuste
para baixo na riqueza esperada pelo
setor privado, que passará a descontar os impostos a mais a serem pagos para financiar os juros e os demais gastos anunciados. O apoio
empresarial ao PAC é uma mentirinha diplomática. Os empresários
-exceto os dos setores lá agraciados- estão como estavam, decepcionados.
Qual a outra maneira? Essa reside
em o governo, como uma cobra, largar sua própria casca, por inteiro,
renovando-se. Isso é o que espera
ver a sociedade. Largar a pele velha
requer a transformação que o PAC
justamente não anunciou. Em vez
de tentar, por exemplo, mexer com
FGTS, um fundo de investimento
dos trabalhadores, deveria-se criar,
desde logo, o fundo de gestão da Previdência Social, passando a capitalizar o INSS. Seria um choque positivo nas expectativas sobre o futuro e,
aí sim, estabelecendo novas inversões em infra-estrutura em nome do
conjunto dos trabalhadores brasileiros. Isso deveria fazer um partido
dos trabalhadores. E, para isso, já
existe a lei, que há sete anos determina que se o faça. Idem em relação
aos Estados da Federação, cuja repactuação de pagamentos de dívida
é oportuna desde que assumam
também o compromisso de largar
suas próprias cascas velhas, comandando suas bancadas para aprovar,
ainda em 2007, uma reforma tributária para valer.
PAC, sim, piripaque, não.
PAULO RABELLO DE CASTRO, 58, doutor em economia
pela Universidade de Chicago (EUA), é vice-presidente do
Instituto Atlântico e chairman da SR Rating, classificadora
de riscos. Preside também a RC Consultores, consultoria
econômica, e o Conselho de Planejamento Estratégico da
Fecomercio SP. Escreve às quartas-feiras, a cada 15 dias,
nesta coluna.
rabellodecastro@uol.com.br
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