São Paulo, quinta-feira, 31 de janeiro de 2008

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PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.

Reforçar as defesas externas

Seria prudente continuar o trabalho de reforço de nossas defesas externas e dos demais indicadores do país

A SEMANA aqui no Fundo Monetário está bastante pesada. Peço desculpas, leitor, por escrever o artigo de hoje às pressas.
Na quinta-feira da semana passada, discuti a gravidade da crise nos Estados Unidos. Nesse meio-tempo, o FMI divulgou novas projeções, mais pessimistas, sobre o crescimento da economia americana e das demais economias avançadas. A decisão de ontem do Federal Reserve de reduzir a taxa básica em mais 0,5 ponto percentual, depois de tê-la cortado em 0,75 ponto percentual apenas oito dias antes, confirma que o banco central americano está correndo atrás do tempo perdido e muito preocupado com o risco de uma recessão e seus desdobramentos. Hoje quero tratar das repercussões dessa crise no Brasil.
Ninguém imagina, é claro, que o nosso país ficará imune à crise, especialmente se ela for longa e profunda. Temos não só ligações comerciais e financeiras com o resto do mundo mas pontos de vulnerabilidade.
Menciono alguns deles.
A dívida pública e os ativos financeiros domésticos, por exemplo, são de prazo relativamente curto. A taxa de câmbio, volto a insistir, sofreu valorização excessiva nos últimos anos, o que vem contribuindo para enfraquecer gradualmente a nossa posição externa. Outro problema: a excessiva e prematura abertura financeira externa. Desde a década de 1990, o Brasil liberalizou demais os fluxos de capital, ou seja, as restrições à entrada e à saída de capitais foram muito reduzidas. Isso pode se tornar uma fonte de problemas, caso venham a ocorrer choques externos de grande magnitude.
Alguns números. Em dezembro último, a dívida externa de curto prazo por vencimento residual chegou a US$ 64 bilhões. O estoque de investimentos de portfólio de não-residentes (basicamente ações e títulos de renda fixa) alcançou US$ 204 bilhões. O passivo externo de curto totalizava, portanto, algo como US$ 270 bilhões em fins de 2007.
As reservas estavam em US$ 180 bilhões em fins de dezembro e chegaram a US$ 186 bilhões anteontem.
Portanto, a relação reservas/passivo externo de curto prazo era aproximadamente 67% em dezembro. Essa relação vem aumentando, pois estava em 57% em dezembro de 2005 e 60% em dezembro de 2006. Ainda assim, existe um risco de drenagem externa, isto é, de pressão sobre as reservas e/ou a taxa de câmbio, em caso de saída de investimentos de portfólio ou não renovação de dívidas de curto prazo.
Existe, além disso, um risco de drenagem interna, isto é, de pressão sobre as reservas ou o câmbio, se os residentes detentores de ativos financeiros líquidos ou de curto prazo em reais resolverem convertê-los em moeda estrangeira.
Não há dúvida de que a nossa posição econômica é mais forte do que foi na década passada ou no início da atual, por motivos que expliquei em artigos anteriores neste espaço.
Mas seria prudente continuar o trabalho de reforço das nossas defesas externas e dos demais indicadores econômicos do país. Isso inclui, entre diversas outras providências: a) fortalecer as contas do governo e alongar gradualmente a dívida interna pública; b) garantir uma taxa de câmbio competitiva, que favoreça o crescimento da economia e a preservação de uma posição sólida de balanço de pagamentos; c) uma regulação cuidadosa e seletiva dos movimentos de capital; e d) um esforço adicional para aumentar a razão reservas/passivos externos de curto prazo.
Assunto indigesto para vocês que estão felizes, aí no Brasil, já se preparando para o Carnaval.


PAULO NOGUEIRA BATISTA JR., 52, escreve às quintas-feiras nesta coluna. Diretor-executivo no FMI, representa um grupo de nove países (Brasil, Colômbia, Equador, Guiana, Haiti, Panamá, República Dominicana, Suriname e Trinidad e Tobago).
pnbjr@attglobal.net


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