São Paulo, domingo, 31 de janeiro de 2010

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ROGER AGNELLI

Primário é bom, sim



Deveríamos discutir como elevar a competitividade de outras áreas, repetindo o que foi feito no setor primário
AO QUE tudo indica, 2010 será bom para o Brasil, apesar de incertezas que a economia mundial terá de enfrentar. A instabilidade na economia continua, mais aguda em algumas regiões do que em outras. Da recente crise, lições podem ser tiradas. Uma delas é que precisamos investir maciçamente em educação de qualidade, novos processos de gestão, pesquisa e tecnologia -para nos tornarmos mais competitivos- sem esquecer de melhorar a infraestrutura.
No Brasil, durante anos, coube ao governo a responsabilidade pelo avanço tecnológico. Uma nova mentalidade definitivamente ganhou força. O empresário está consciente da importância da tecnologia e inovação para aumentar a competitividade e garantir a sua sobrevivência -o que inclui investimentos sociais. As empresas investem mais em educação e estão preocupadas com o ambiente e com o social.
A Vale sempre investiu em tecnologia e pesquisa e, por isso, somos competitivos. Aceleramos gastos com P&D: nos últimos cinco anos foram R$ 6 bilhões. Lançamos o Instituto Tecnológico Vale, com unidades em Minas, São Paulo e Pará. Isso vai aumentar a competitividade da Vale. Vamos enfrentar questões cruciais para o sucesso no longo prazo, como energia sustentável e ambiente. Investir em tecnologia, processos produtivos e gestão é fator crítico para o sucesso e a geração de valor aos acionistas.
Por décadas, o Brasil mobilizou-se para aumentar suas exportações de produtos primários, investindo pesado em pesquisa e tecnologia, cujo grande exemplo é a excelência da Embrapa, e numa infraestrutura dedicada. O setor primário despontou, naturalmente, como competitivo e exportador. O Brasil é hoje, sem dúvida, potência no etanol, milho, suco de laranja, soja, mineração etc. O sucesso desses negócios é esforço de longo prazo. O agronegócio garante boa parte da nossa balança comercial, mesmo enfrentando a concorrência forte e até subsídios governamentais que distorcem a competitividade relativa.
Acompanho debates nos quais se reduz a importância dos produtos primários nas exportações. A verdade é que nosso comércio cresce e melhora numa área em que somos bons após investimentos maciços em tecnologia e pesquisa. Deveríamos discutir como elevar a competitividade de outras áreas, repetindo o que foi feito no setor primário.
Os insumos sofrem pelos altos custos da infraestrutura e também pela tributação, retirando competitividade dos manufaturados. Não devemos discutir se o dólar é caro ou barato. O dólar vai estar barato quanto maior for o sucesso do Brasil. Em áreas onde acumulamos tecnologia, somos competitivos. O Brasil tem de cortar custos de produção, melhorando sua infraestrutura. É preciso reduzir tributos ao longo de toda a cadeia produtiva de insumos utilizados na produção dos manufaturados, como energia, mão de obra, transporte, porto e combustível.
Somos campeões em produtos primários, e isso garante um colchão para o dólar. Com o dólar mais barato, a população tem acesso a alimentos, medicamentos e bens de consumos mais baratos. Mas não podemos ignorar o esforço efetuado para aumentar a nossa competitividade, para que a pauta de manufaturados siga o sucesso dos produtos primários, que geram benefícios, emprego e impostos em todo o nosso país.


ROGER AGNELLI, 50, economista e diretor-presidente da Vale, escreve neste espaço a cada quatro semanas.

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