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FolhaInvest
Mesada ensina a organizar finança pessoal
Com quantia dada pelos pais, criança aprende a tomar decisões e sabe que o dinheiro não é infinito, dizem especialistas
Pequena renda concedida semanal ou mensalmente
ensina os filhos a distinguir entre aquilo que precisam daquilo que desejam ter
TONI SCIARRETTA
DA REPORTAGEM LOCAL
Um belo dia o filho, que mal
consegue articular frases completas, pede para você comprar
um brinquedo. Pronto, ele está
inserido no mundo do consumo. Entendeu que existe dinheiro, sabe quem tem o dinheiro e que ele pode comprar coisas coloridas, divertidas ou
gostosas. Segundo educadores,
isso acontece por volta dos dois
anos e meio, quando deve começar a educação financeira.
A partir daí, segundo afirmam os educadores, a maior dificuldade é ensinar à criança
que ela pode esperar algum
tempo para satisfazer um impulso consumista. Esse adiamento do consumo mais tarde
se transformará na idéia de
poupança. Parece simples, mas
é uma dificuldade que muitos
adultos que se perdem no cheque especial e nos juros rotativos do cartão de crédito jamais
superaram.
A melhor maneira de trazer
as pequenas decisões de consumo e de poupança para a vida
das crianças é por meio do sistema de mesadas (mensais),
que começa com as semanadas
(semanais) e que funciona como uma renda -não um salário, uma relação trabalhista
medida por desempenho.
Pela mesada, a criança toma
decisões, aprende que o dinheiro é "elástico" e tem de chegar
até o final de um período.
"Preparar os filhos para lidar
com dinheiro é ensinar as
crianças a esperarem, que seja
cinco minutos, para conter um
impulso imediatista. Parece
pouco, mas conter esse impulso não é natural nem para os
adultos. Mas é com a poupança
que ela poderá planejar para
conseguir as coisas que ela quer
conquistar na vida", disse Cássia D'Aquino, educadora, autora do livro "Educação Financeira", da coleção Expo Money.
"Pega um vidro, coloca umas
moedas. Por quê vidro? Para a
criança ver o dinheiro crescer.
Tem que mostrar que o vidrinho compra os sonhos. Pode
ser uma bicicleta e depois um
iate", disse Augusto Saboia,
consultor de finanças pessoais.
Sociedade de classe
Aos cinco anos, o filho pergunta: afinal nós somos pobres
ou ricos? Quanto você ganha?
Por que o Joãozinho tem os
brinquedos mais legais e o Pedrinho quase não tem com o
que brincar? Sim, ele começa a
descobrir que algumas pessoas
são diferentes das outras. Daí
em diante as perguntas serão
cada vez mais constrangedoras.
Muitos pais se sentem ofendidos com essa pergunta, recebida como avaliação de seu desempenho de provedor da casa.
Trata-se apenas de curiosidade
infantil e não juízo de valor. As
respostas e a forma como os
pais lidam com essas questões
podem ser desastrosas, segundo os educadores. Para Aquino,
as crianças têm uma noção de
classe social que vem dos contos de fada. "A menina percebe
que não é uma princesa nem
mora num castelo. Também
não mora numa choupana na
floresta. Ela quer saber o que
ela é. Se o pai não for a pessoa
mais rica do mundo, pode dizer
que tem gente com muito mais
dinheiro do que ele, mas também outras que não têm quase
nada. Por alguns anos, essa resposta basta. Mas alguns pais se
sentem desconfortáveis e cobrados, querem dar mais do
que podem para a criança. O
maior erro é querer dar tudo o
que não teve na própria infância para o filho."
Sobre o quanto o pai ganha, a
recomendação é alegar privacidade e não falar. Dependendo
da criança, ela vai pegar a calculadora e descobrir que com o
salário mensal do pai dá para
comprar um milhão de balas. E
por isso, vai ser difícil o pai negar uma ao filho.
Semanadas e mesadas
Outro aprendizado que pode
acontecer cedo é distinguir entre aquilo que a criança precisa
daquilo que ela quer ter. A
criança quer ter um brinquedo
novo, passear com os amiguinhos, comprar um doce, mas
ela precisa -e não pode viver
sem- ter em casa luz, comida e
remédios, se estiver doente.
Com seis anos, a criança já
consegue fazer as quatro operações matemáticas fundamentais, tem condições de priorizar
seus desejos e impulsos e já pode receber as semanadas.
Uma pequena renda fará a
criança sentir na pele que o dinheiro é sempre finito, enquanto as necessidades são infinitas -princípio fundamental da economia, que é mobilizar o capital e os recursos disponíveis para atender de forma
mais eficiente e justa possível
às demandas.
No longo aprendizado, que
costuma demorar 20 anos, os
recursos escassos redundarão
naturalmente em processos de
falência dos filhos. Segundo especialistas, a falência sem correr risco de ter o nome no SPC e
na Serasa é um dos maiores
aprendizados para a responsabilidade financeira dos filhos.
"Tem de deixar o moleque ficar duro. Não pode passar a
mão na cabeça. [Socorrer rápido demais] É um castigo para a
criança. O pai que faz isso está
acabando com a vida financeira
do filho. Está criando um carma, uma pessoa que não vai
querer sair nunca mais da casa
dos pais", disse Saboia.
Além das falências, os especialistas apontam que é importante também a criança chegar
à conclusão de que está sendo
explorada. Colecionar álbum
de figurinhas, em que sempre
falta uma -a mais cobiçada-
leva a criança depois de meses a
desconfiar que a tal figurinha
não existe, que não tem solução
para o problema e que foi enganada. "Não é que tem pai que
não espera o filho ficar um mês
tentando achar a figurinha e liga para a editora para pedir a
coleção completa?"
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