|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
ANÁLISE
O fim do "benchmark"
PASCHOAL PAIONE
ESPECIAL PARA A FOLHA
Há quatro décadas o preço do
minério de ferro é definido por
"benchmark": as três grandes
mineradoras globais (BHP, Rio
Tinto e Vale) negociavam com
as siderúrgicas japonesas e europeias o preço anual. Tal sistema deve ruir em 2010, com as
mineradoras migrando para
um modelo com reajustes trimestrais baseado em índice.
O minério de ferro é uma das
principais matérias-primas na
fabricação do aço. Assim, sua
demanda depende da demanda
siderúrgica. Antes do surgimento da China como grande
potência, o consumo de aço era
determinado pelos países desenvolvidos. O mercado era
equilibrado, e os novos projetos
de mineração apenas saíam do
papel com demanda garantida
pelas siderúrgicas.
A situação mudou com o surgimento da China como grande
potência. Por ser uma economia enorme e com grande utilização de aço por unidade de
PIB, o crescimento chinês resultou em desequilíbrio nos
mercados. O desenvolvimento
de novos projetos de minério
de ferro se tornou muito mais
desafiador. Não havia mão de
obra especializada ou equipamentos disponíveis, e os novos
projetos se encontravam em localidades com risco político.
Tais fatores contribuíram para
a alta dos preços e crescimento
da volatilidade, tornando as negociações anuais mais difíceis.
Tais acontecimentos impactaram o mercado de fretes. A
maior parte das siderúrgicas japonesas e europeias possui
contratos de longo prazo de fretes, fazendo com que a negociação ocorresse em base FOB.
Como a maior parte das siderúrgicas chinesas não detém
tais contratos, o crescimento
chinês resultou em explosão
dos fretes. Assim, a negociação
de preços FOB passou a incomodar as siderúrgicas chinesas. Com isso, as mineradoras
australianas passaram a brigar
por um sistema de preços CIF,
já que o frete Brasil-China é o
dobro do frete Austrália-China.
Anteriormente, havia um
acordo tácito em que o diferencial de fretes era compensado
pela maior qualidade do minério brasileiro. Mas em 2008 as
australianas conseguiram melhor preço que a Vale. Esse foi o
fim do "benchmark".
Visando impor o prêmio de
qualidade, a Vale desenvolveu
uma área de fretes e forneceu a
opção de preços FOB ou CIF.
Conjuntamente, a baixa visibilidade e a explosão do preço
"spot" dificultaram a estipulação de um preço anual. Com isto, as mineradoras migraram
para um sistema de preços trimestral, baseado em índice parametrizado pelo "spot". O sistema prevê preços mais elevados de acordo com a qualidade
do minério (conforme desejava
a Vale) e considera o diferencial
de fretes (como queriam as australianas).
O novo mecanismo favorece
as mineradoras em mercados
altistas, em que a colocação de
volumes é fácil, e os preços, elevados. Mas pode ser prejudicial
quando as condições deteriorarem. A volatilidade do preço
dos produtos finais também
aumentará. Os impactos na Vale no curto prazo serão positivos, pois a demanda está aquecida, os preços, elevados, e porque a gigante brasileira possui
frete suficiente a preços competitivos (adquiridos durante a
crise). No longo prazo, a ampliação de Carajás (com minério de excelente qualidade)
contribuirá para o aumento do
preço médio, mas a manutenção do portfólio de fretes competitivos será essencial para a
competitividade da Vale frente
às australianas.
PASCHOAL PAIONE é sócio da Quest Investimentos e analista de commodities
Texto Anterior: Com mudança, Vale atende a chinesas Próximo Texto: Alexandre Schwartsman: Síndrome da China Índice
|