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São Paulo, quinta-feira, 31 de julho de 2003

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PERCEPÇÃO EXTERNA

Estagnação e tensões sociais reduzem otimismo de analistas e investidores com economia brasileira

Wall Street perde o encanto com Lula

FERNANDO CANZIAN
DE WASHINGTON

Chegou ao fim a fase de otimismo dos mercados financeiros internacionais com o governo petista do presidente Lula.
Sem previsões de crescimento otimistas para este ano e dúvidas sobre 2004, alguns dos principais analistas nos EUA voltados para o Brasil acreditam que as tensões sociais no país devem aumentar.
Além disso, começam a ficar surpresos com as dificuldades que Lula enfrenta, após sete meses de governo, para aprovar as reformas previdenciária e tributária no Congresso.
Mesmo entre os que ainda consideram adequadas as medidas macroeconômicas adotas pelo PT, há fortes críticas em relação à concepção de programas governamentais e ao gerenciamento da máquina administrativa.
"Houve uma deterioração na percepção dos mercados. Há muito ruído político no Brasil, as reformas estão paradas e não há expectativa de crescimento", afirma Walter Molano, sócio e chefe de pesquisas financeiras da corretora BCP Securities. "Há uma frustração entre as pessoas que votaram em Lula com esperança e que começam a ver que se trata de mais do mesmo."
Para Felipe Illanes, diretor-adjunto para o Brasil da corretora Merrill Lynch, "há evidências cumulativas de que a lua-de-mel com o governo Lula se esgota".
"As dificuldades com as reformas pegam de surpresa o governo, que começa a recuar como um bloco menos coeso. Tensões, como no caso do MST, também fazem com que a análise política seja considerada de maior risco."
A mesma percepção aparece entre analistas de órgãos desvinculados do mercado financeiro.
"Os tempos difíceis chegaram, e a lua-de-mel de sete meses parece ter chegado ao fim. Lula deu todos os sinais corretos e disse as coisas certas no início, mas chegou a hora de entregar o que prometeu", afirma Miguel Diaz, diretor para América do Sul do Centro Internacional de Estudos Estratégicos de Washington.
Para Joel Velasco, vice-presidente da Stonebridge International, que representa multinacionais com negócios no Brasil, "a bolha de otimismo com Lula esvaziou". "Não é o caos, como às vezes exageram alguns. Mas é um alerta para que o governo não perca o rumo no momento em que os grandes problemas do Brasil voltaram a ficar em evidência."

Nó do crescimento
A principal preocupação econômica em relação ao Brasil é como o país conseguirá desatar o nó que o impede de crescer.
"Todas as previsões mostram uma redução das expectativas de crescimento, o que deixa o Brasil vulnerável tendo em conta o tamanho e a composição de prazos de suas dívidas interna e externa", afirma Vincent Truglia, diretor-gerente da agência de classificação de risco Moody's.
"O pior é que o obstáculo atual ao crescimento não é o FMI, as empresas ou o MST. São os juros determinados por Brasília", diz Molano, da BCP.
Paulo Vieira da Cunha, economista-chefe para a América Latina do banco HSBC, reconhece que há uma "inversão de expectativas" em relação às perspectivas da economia do país. Mas afirma que isso ocorre, em boa medida, como "resultado do fim da euforia que existia há poucos meses".
Cunha, assim como Illanes, da Merrill Lynch, afirma que boa parte da mudança de percepção tem a ver com a melhora das previsões para a economia dos EUA, que tenderá a canalizar investimentos hoje concentrados em países emergentes para a segurança e rentabilidade crescentes dos títulos do Tesouro americano.
O economista-chefe do HSBC qualifica, no entanto, como "medíocres ou equivocadas" várias das "concepções e projetos" do governo Lula. "O "estrondoso" Fome Zero é mal concebido, o BNDES continua com uma posição pouco clara sobre o que fará e o governo não tem feito nada, em geral, em outras áreas em que precisaria ser ativo."
O economista John Williamson, do Institute for International Economics (IIE) e considerado o "pai" da expressão Consenso de Washington, diz reconhecer a existência de uma "onda de pessimismo" no momento, mas afirma que ela não deveria ser "levada muito a sério". "É natural que os problemas comecem a aparecer depois de algum tempo."
Para Frederick Jasperson, diretor do Institute of International Finance (IIF), o Brasil, apesar das dificuldades, ainda tem chances de ingressar em um "círculo virtuoso" no médio prazo. "Mas isso só ocorrerá se a política monetária continuar disciplinada e as reformas passarem sem que sejam muito diluídas."


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