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RECEITA ORTODOXA
Levantamento do Tesouro atualiza série de receitas e despesas do governo desde o fim do regime militar
Gasto com juro supera investimento desde 80
MARTA SALOMON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Entre o final do regime militar e
o primeiro ano do mandato do
presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a arrecadação de tributos federais no Brasil cresceu três vezes,
enquanto a conta de juros se multiplicava por quase sete e os investimentos do governo encolhiam.
A comparação foi possível graças a um estudo da Secretaria do
Tesouro Nacional, que atualizou
valores de quanto o governo federal arrecadou e gastou ano a ano,
de 1980 (quando o país era presidido por João Baptista Figueiredo) até agosto deste ano.
No período da série, o Brasil trocou de moeda cinco vezes -de
cruzeiro para cruzado, cruzado
para cruzado novo, de cruzado
novo para cruzeiro, daí para cruzeiro real até chegar ao real, com
uma breve passagem por uma
quase moeda, a URV (Unidade
Real de Valor). O que só complica
a tentativa de comparação.
No exercício divulgado pelo Tesouro, os técnicos usaram o IGP-DI (Índice Geral de Preços - Disponibilidade Interna), da Fundação Getúlio Vargas, que capta,
mais do que outros índices de inflação, as variações cambiais do
período. A "série histórica de despesas e receitas" está disponível
na página do Ministério da Fazenda na internet.
Em 2003, último ano completo
da série, foi registrado o menor
investimento público desde 1984.
Os investimentos somaram R$
6,9 bilhões, enquanto a conta de
juros do governo central, ainda
segundo os dados do Tesouro, batia R$ 70,7 bilhões- ou quase sete vezes o valor pago em 1985. A
arrecadação crescente de tributos
foi engolida por contas cada vez
maiores com juros, pessoal e benefícios previdenciários, sobretudo depois da Constituição de 88.
Entre 1985 e 2003, os gastos com
pessoal cresceram seis vezes, e o
pagamento de aposentadorias e
pensões, mais de dez. Nesse período, o pagamento de impostos e
contribuições passou de R$ 129,7
bilhões para R$ 367,4 bilhões.
O estudo do Tesouro mostra
que o aumento dos impostos foi
bem mais lento do que o das contribuições. A principal diferença
entre os dois tipos de tributos é
que a receita das contribuições
não é repartida pela União com
Estados e municípios. Em 2003, as
contribuições chegavam quase ao
dobro da receita de impostos.
Ressalva
O secretário do Tesouro, Joaquim Levy, diz que a série histórica das despesas e receitas é "muito
ilustrativa, com elementos importantes para a análise".
Mas faz algumas ressalvas sobre
o trabalho publicado pelo próprio
órgão, a começar pelo registro
pouco confiável de dados das
contas públicas antes de meados
da década de 90. "Antes de 88,
muita coisa queria dizer nada, os
números são muito frágeis, muita
coisa acontecia fora do Orçamento da União", disse à Folha.
Comandante do ajuste fiscal no
governo Lula, Levy insiste em que
a conta de juros não é o grande vilão do retrato traçado pelo Tesouro. "Os juros são grandes, têm peso significativo, mas estão sob
controle", afirmou, citando dados
de um estudo recente sobre o pagamento de juros em relação ao
PIB (Produto Interno Bruto).
Levy sinaliza que o aperto nos
gastos destinado ao pagamento
de juros vai continuar. "Não há
muito o que escolher", disse.
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