São Paulo, domingo, 06 de maio de 2007

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entrevista

MAURÍCIO SERVA

"Carga de trabalho, além de pressão pelo sucesso, são fatores importantes que levam o profissional à doença"

Vício em trabalho é gerado por exigência corporativa

ANDRESSA ROVANI
DA REPORTAGEM LOCAL

Trabalhar mais do que se gostaria é reclamação recorrente no universo corporativo. Tanto que se dedicar ao trabalho a ponto de torná-lo compulsivo é um fenômeno que, aos poucos, ganha atenção.
Para Maurício Serva, 50, professor da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina), um novo elemento entra em jogo: as exigências organizacionais tornaram-se fatores determinantes no desenvolvimento da doença -contrariando a idéia de que o transtorno é só fruto de uma predisposição psíquica.
Tema ainda pouco explorado, o "workaholicismo" sofre de um preconceito às avessas: é, em geral, bem-visto por empregadores e colegas. Serva, que estudou o tema em parceria com o pesquisador Joel Lincoln Ferreira, falou à Folha.

 

FOLHA - Pode-se considerar o "workaholicismo" uma doença?
SERVA
- Sim. É um distúrbio de ordem psicossocial que leva o indivíduo a trabalhar excessivamente, numa espécie de "vício" do trabalho.

FOLHA - O que leva um profissional a trabalhar mais do que deveria, a ponto de ficar doente?
SERVA
- Vários fatores já foram detectados. Os estudos iniciais sobre o fenômeno se concentravam nos fatores psicológicos, indicando causas como a predisposição psíquica de certos indivíduos para desenvolverem essa patologia. Sem negar fatores psicológicos, o estudo chama a atenção para o contexto histórico, ressaltando dimensões sociais, econômicas e organizacionais que agem sobre o indivíduo. Assim, exigências organizacionais tais como aceitação ao risco, flexibilidade, resultados em curto prazo, ritmo e carga de trabalho, além de pressão pelo sucesso, são fatores importantes que levam o profissional à doença.

FOLHA - Por que, na sua opinião, o "workaholic" é mais tolerado socialmente do que outros viciados?
SERVA
- Porque vivemos numa sociedade em que o produtivismo, a competição e o individualismo são alçados à condição de valores que devem ser cultuados e concretizados. São diversas implicações: tendência ao aumento de neuroses, frustração, crise de sentido para a vida.

FOLHA - Quais são os sintomas?
SERVA
- Todos os profissionais entrevistados tiveram implicações em menor grau (esgotamento físico e mental, enxaquecas) ou em maior grau (enfarto, úlcera, distúrbio do sistema imunológico). Alguns incorporaram atitudes que praticamente os excluem dos outros segmentos sociais ou familiares, demonstrando, inclusive, não saberem como viver nos demais espaços sociais.

FOLHA - Como isso influencia o trabalho de seus subordinados?
SERVA
- De várias formas. Por exemplo, ao elevar os graus de exigência com prazos e de perfeição no cumprimento das tarefas. Sem falar no incômodo de ter um superior hierárquico acometido de anomalia que o leva a apresentar ações, de certa forma, desequilibradas.

FOLHA - Podemos estimar quantos brasileiros sofrem da doença?
SERVA
- Infelizmente, não, pois estudos de natureza quantitativa ainda não foram realizados.

FOLHA - O sr. acredita que esse número esteja aumentando?
SERVA
- Acredito piamente.

FOLHA - O que é preciso fazer?
SERVA
- Precisamos compreender melhor o fenômeno em si. O aumento de "workaholics", como o de outras patologias sociais, acaba por se constituir um caso de saúde pública.


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