São Paulo, domingo, 09 de dezembro de 2007

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As melhores para trabalhar(?)


Para consultor, ranking de empresas desvia atenção de indicadores realmente importantes

WILLIAN BULL
ESPECIAL PARA A FOLHA

Para as áreas de recursos humanos, as pessoas são o principal foco de atenção no desempenho das funções, tendo papel especial nessa administração questões relacionadas à atração e à retenção de talentos. A força de trabalho espera que a alta administração e a área de recursos humanos a tratem considerando seus talentos, por meio da aplicação de políticas consistentes e competitivas, sobretudo em relação a recompensas pela dedicação e pela aplicação no alcance de resultados.
A alta administração espera que sua força de trabalho seja formada por talentos que demonstrem excelência no desempenho e que a área de recursos humanos demonstre seu valor estratégico para a organização, medindo o retorno dos investimentos nas pessoas. Os executivos são valorizados pelo retorno dos investimentos. Surge com isso a necessidade de mensurar o sucesso da força de trabalho na execução da estratégia e estabelecer e acompanhar indicadores com tal validade estratégica.
O talento que as pessoas aplicam nas organizações -incluindo os comportamentos-, alinhado com a estratégia, constitui um ativo (intangível, é verdade) importante ou até mesmo imprescindível para o sucesso das organizações.
Entretanto, como mensurar a eficácia desses ativos? Sabemos que a tarefa não é simples e boa parte dos indicadores utilizados pelas áreas de recursos humanos acaba por medir mais a eficiência dos processos da própria área do que o sucesso da força de trabalho de fato. Com as dificuldades naturais de se estabelecerem tais indicadores, opta-se pelos mais simples de serem obtidos -não necessariamente os mais eficazes.
Com muita freqüência, em nome da comparabilidade com o mercado e da obtenção de "benchmarking" [referência] de melhores práticas, ocorre uma total inversão de valores. Nesses casos, uma bem-definida e necessária estratégia de capital humano é relegada a segundo plano ou, pior, subordinada a práticas e a indicadores que nada têm a ver com a estratégia da própria organização.
É claro que não devemos ser contra o aperfeiçoamento ou a inovação de processos, desde que estejam totalmente alinhados à estratégia do negócio. Também, a não ser que a estratégia, a identidade e a cultura de uma organização sejam iguais às de seus concorrentes, soa estranho buscar um alinhamento com o mercado como base para definir uma estratégia para sua força de trabalho.
Considerando que, diferentemente dos ativos tangíveis, como recursos financeiros e tecnologia, as pessoas e a forma como a organização aprende e se desenvolve não são facilmente copiáveis, as organizações deveriam medir o sucesso de sua estratégia de capital humano por indicadores próprios e com validade estratégica.
Ou seja, que lhe permitam mensurar os resultados atuais e prognosticar o futuro, com base na análise de tendências. Isso sim seria capaz de permitir à empresa um efetivo grau de consideração, reconhecimento, recompensa e planejamento da força de trabalho.

Decepção
Sendo assim, o fato de encontrarmos em várias empresas o desejo de estarem entre as melhores para trabalhar, colocando-o como o grande desafio proposto para as lideranças, tem me causado profunda estranheza e alguma decepção.
Parece-me total distorção de propósito quando ocorre sem um questionamento de valor ou concatenação estratégica. Muitas vezes, essa se torna a principal meta da agenda voltada para as pessoas, ou seja, a eleição desse indicador como o principal elemento de mensuração da satisfação e da moti-vação da força de trabalho.
Reside por trás dessa escolha a crença de que "o melhor lugar para trabalhar é também o melhor lugar para investir". Para profissionais investirem em suas carreiras e para acionistas investirem o seu capital.
O que mais me assusta é uma crença cega e desprovida de crítica. O que mais me assusta em muitas áreas de recursos humanos e na atitude de alguns presidentes de empresa é o fato de assumirem certas premissas como verdade absoluta, sem o mínimo questionamento. A eles, uma consideração: cuidado. Ao criarem um "frankenstein" de laboratório, terão de conviver com ele.
O projeto de uma empresa saudável é algo que pode existir fora do ranking de mercado. Aprimorar os indicadores internos e os instrumentos para detectar o que realmente é crítico para a força de trabalho impactará diretamente na decisão gerencial e no rumo dos negócios, além de ser uma janela interessante a ser aberta.
Para que estar entre as melhores? Detectar pontos críticos, valorizar talentos internos, reconhecendo-os e alinhando-os aos resultados, e criar uma estratégia para o real desenvolvimento do capital humano são condições básicas para ter uma equipe e uma empresa, fora do ranking talvez, mas entre as melhores para trabalhar.


Willian Bull é consultor de capital humano da Mercer


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