São Paulo, domingo, 12 de abril de 1998

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Vida dupla

Divulgação
Integrantes da banda Oh! Terezinhas cantam de noite, mas encaram o batente pela manhã


LIGIA BRASLAUSKAS
da Reportagem Local

Atriz e massagista; arquiteto e dono de restaurante; engenheiro e poeta. A vida dupla -e, consequentemente, muitas horas a mais de trabalho- faz parte do dia-a-dia de muitos profissionais.
Alguns encaram essa exaustiva rotina como a única opção para engordar a renda. Mas a verdade é que a maioria corre atrás da carreira dos sonhos -sem deixar de lado a "estabilidade financeira".
A suíça naturalizada brasileira Béatrice Jenni, 52, professora de pré-escola em São Paulo, é categórica: "Nada pode impedir a minha criação. Pela manhã eu me dedico às crianças e à tarde, ao ateliê".
O poeta grego Konstantinos Kaváfis (1863-1933) traduziu bem essa sensação de impotência diante da necessidade de deixar a criação aflorar em horário e local inadequados. Ele próprio acumulou a carreira de escritor com um emprego no funcionalismo público.
Ele dizia: "Quantas vezes, no trabalho, me ocorre de súbito uma bela idéia, uma imagem rara ou versos inteiros prontos. E eu tenho de deixá-los de lado porque o serviço não pode ser adiado!".
Ter uma segunda atividade é quase imprescindível para o ser humano, diz Hélio Roberto Deliberador, 42, professor de fenomenologia existencial da PUC (Pontifícia Universidade Católica).
"Conseguir desempenhar duas atividades profissionais, como forma de realização de um desejo, produz um grande benefício: aumenta as possibilidades para lidar com os obstáculos da vida."
Realizar um sonho antigo -como tocar em uma banda, participar de uma exposição ou ter um livro editado- é um estímulo importante, segundo ele.
"Se a pessoa faz algo de que realmente gosta e que deseja, ela transfere essa sensação de bem-estar para as outras atividades, embora a realização plena, de todos os sonhos, seja impossível."
Júlia Alonso, 32, consultora da Passarelli Talentos, afirma que percebe até nos jovens candidatos "um desejo escondido por trás das qualificações profissionais".
Um dos que passaram pelo seu crivo tinha largado tudo para viajar mundo afora. "Essa conquista rendeu-lhe características que antes eram menos visíveis, como determinação e segurança", diz.
Para ela, que deu em 98 o primeiro passo para realizar um velho desejo -tornar-se atriz-, "é fundamental que, além da garantia financeira, a pessoa consiga realizar o sonho de carreira, mesmo que em atividades distintas".



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