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ENTREVISTA
LUCIENE REZENDE
Pesquisadora elabora teste de memória para seleção de policiais
Objetivo é mensurar capacidade de relatar o que se ouve
"A memória tende a guardar o essencial da mensagem,
dando menos importância aos detalhes. Enquanto lê,
torne aquele conteúdo significativo para sua memória.
Assim, ele será registrado de forma mais profunda.
É como se você "lutasse" contra suas funções cognitivas,
que tentam reter só a essência"
DA REPORTAGEM LOCAL
Lembrar com precisão aquilo
que foi relatado é habilidade essencial em algumas profissões.
Mesmo assim, os processos
seletivos no Brasil ainda não
fazem uso de métodos que possam distinguir entre os que
conseguem recordar bem o que
lhes foi dito, sem distorcer informações, e os que não sabem
fazê-lo. Luciene Rezende tratou do tema em seu mestrado
na Universidade de Brasília e
elaborou um teste inédito para
policiais, baseado em memória
de relatos.
(ANDRESSA ROVANI)
FOLHA - No Brasil ainda não existe
aplicação de testes de memória de
relatos. Em que ele se diferencia?
REZENDE - De fato, não existe.
O teste foi desenvolvido para
ser utilizado na seleção de policiais. Ele está focado na avaliação de memória de relatos porque é essa a mais utilizada por
eles. Bons policiais possuem
boa memória de relatos, ou seja, conseguem recordar o que
lhes foi contado sem distorcer.
O teste, então, acessa sua memória de longo prazo. O relato
pode ser algo que lhe disseram
ou que ele tenha lido ou, ainda,
uma seqüência de imagens.
O policial trabalha muito com o
que lhe é dito, por isso o teste
utiliza como estímulo a voz.
FOLHA - Que implicações a má seleção de policiais pode ter?
REZENDE - Uma má seleção pode implicar contratação de profissionais cujas estruturas de
personalidade não se adaptarão àquela função, gerando sofrimento e, em casos extremos,
psicopatologias e até mesmo o
suicídio. É uma questão de probabilidade. A boa seleção aumenta a chance de contratar
pessoas mais indicadas para
aquele cargo e vice-versa.
FOLHA - Qual é o impacto esperado no cotidiano dos selecionados?
REZENDE - Normalmente,
quando recuperamos algum fato guardado em nossa memória, misturamos esse fato com
informações já armazenadas e
reproduzimos uma "mistura"
em vez do fato original. Guardamos o essencial; o que esquecemos preenchemos com inferências, sem percebermos.
Vou dar um exemplo: um vídeo sobre um acidente automobilístico foi mostrado a dois
grupos. Para um deles, perguntou-se qual a velocidade do carro quando bateu no poste. Para
outro, qual a velocidade quando ele esmagou o poste. A média da velocidade obtida pelas
respostas do grupo que recebeu
a pergunta com a palavra "esmagou" foi significativamente
maior. Ao serem questionados
se haviam visto estilhaços de vidro no vídeo, o segundo grupo
respondeu "sim" com maior
freqüência, apesar de não haver
estilhaços no filme. De alguma
forma, a memória original parece ser "contaminada" por novas informações. Isso é um perigo. O teste mede duas coisas:
se o candidato consegue recordar bem o que lhe foi dito e se o
faz sem distorcer dados.
FOLHA - Como reparar a memória?
REZENDE - Há dicas valiosas
formuladas por John R. Anderson [leia mais ao lado].
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