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São Paulo, domingo, 16 de novembro de 2003

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FIM DO EMPREGO

Estatísticas refletem tendência de empresas de propor troca do registro por informalidade

Carteira assinada vira artigo raro no mercad o atual

PAULA LAGO
FREE-LANCE PARA A FOLHA

Concorde-se ou não, as relações de trabalho já mudaram e se encaminham para a informalidade. O fenômeno é mundial. Cada vez mais, o emprego com vários direitos estabelecidos por lei para o funcionário vem perdendo terreno para o trabalho negociado diretamente com o patrão.
Dados da OIT (Organização Internacional do Trabalho) apontam que, dos aproximadamente 4 bilhões que formam a PEA (População Economicamente Ativa) global, pelo menos 1 bilhão está na informalidade, classe que inclui os profissionais temporários, os trabalhadores terceirizados e quem trabalha em meio período.
No Brasil, os números não são muito diferentes. Segundo o IBGE (Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), em setembro, o número de informais atingiu 42,7% do total de empregados das seis maiores regiões metropolitanas do país. Em três delas -Recife, Rio de Janeiro e Salvador-, os trabalhadores que não têm registro batem os que estão sob o regime da CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas).
As razões para essa situação passam pelas inovações tecnológicas - que agilizaram os processos fazendo com que menos pessoas atuem para atingir o resultado obtido no passado- e pelo ciclo da economia, que não tem um crescimento sustentável há 20 anos, segundo Thiago Fonseca Ribeiro, da assessoria socioeconômica da Secretaria do Desenvolvimento, Trabalho e Solidariedade da Prefeitura de São Paulo.
"Há três tendências negativas para o mercado: o crescimento da informalidade, o aumento da taxa de desemprego e a queda do rendimento", enumera Mário Theodoro, técnico da diretoria de política social do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada).
O consultor de recursos humanos da DBM Gerson Correia completa o raciocínio: "Quando a economia não se desenvolve, a força de trabalho fica mais vulnerável".

Precarização
Essa fragilidade é perceptível. Para Grijalbo Coutinho, presidente da Anamatra (Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho), a desregulamentação das leis trabalhistas "dá à força econômica o poder de definir as relações do trabalho".
"Quanto maior o desemprego, maior o risco de descumprimento da legislação trabalhista e de o empregado aceitar as propostas do empregador", emenda Vantuil Abdala, vice-presidente do TST (Tribunal Superior do Trabalho).
Um exemplo está na decisão de algumas companhias de propor ao empregado uma demissão "fictícia": o funcionário é demitido oficialmente, recebe os benefícios, e, na sequência, volta a trabalhar na empresa, mas sob o título de estagiário, autônomo, prestador de serviço ou cooperado.
A estudante de design de interiores Graziela Salgado da Silva, 21, que estava registrada havia dois anos, recebeu a proposta da empresa há dois meses. "Ficaria sem os benefícios, mas com os mesmos gastos. Não valeria a pena e preferi a demissão."
"A empresa corria o risco de falir. Esse tipo de situação acontece, mas não resolve os problemas", comenta. Silva procura trabalho desde então e diz que a última proposta que recebeu também foi para se tornar uma terceirizada.
Ricardo Antunes, professor titular de sociologia do trabalho da Unicamp e coordenador da coleção "Mundo do Trabalho" (editora Boitempo), defende que as empresas estão fazendo a flexibilização a frio. "Isso transmite uma aparente facilidade de encontrar trabalho que logo é descompensada pela falta de direitos", diz.


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