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MIRIAN GOLDENBERG - miriangoldenberg@uol.com.br

Sozinhas

Em outras culturas, é normal a mulher viver só; aqui, ainda é sinônimo de exclusão e fracasso pessoal

Uma mulher almoça em um restaurante em São Paulo. Na outra mesa, a esposa diz ao marido: "Coitada, comendo sozinha!".

Duas senhoras viajam de excursão para Foz do Iguaçu. Uma moça diz para o noivo: "Que triste! Elas devem ser viúvas, tão sozinhas".

Três amigas conversam animadamente em um bar no Rio de Janeiro. Uma jovem diz para o namorado: "Acho deprimente ver mulher sozinha enchendo a cara".

Faça a experiência: basta colocar um único homem entre essas mulheres e não se ouve mais qualquer comentário sobre o fato de elas estarem sozinhas.

Uma arquiteta de 42 anos diz: "Adoro sair sozinha. Mas é muito difícil enfrentar o olhar de piedade dos outros, especialmente o das mulheres". Ela diz que evita sair só para fugir do peso desses olhares. "Só faço isso quando viajo para fora. Em qualquer país europeu, vejo muitas mulheres sozinhas nos teatros, cinemas, restaurantes. É completamente normal."

Uma psicóloga de 50 anos reclama: "Não são os homens que me olham com pena. São as mulheres. Mas pode ser que elas se sintam ameaçadas ou até me invejem por eu não precisar de ninguém para me divertir". Uma nutricionista de 37 anos diz: "Sabe aquela peça? Sou infeliz, mas tenho marido? Muitas mulheres escolhem a infelicidade. Prefiro minha própria boa companhia a ter uma relação infeliz. Não dependo da aprovação dos outros. Valorizo minha liberdade".

A última Pnad (IBGE) registrou crescimento no número de pessoas que moram sozinhas. Segundo o estudo, 12% (6,9 milhões) das casas pesquisadas são ocupadas apenas por um morador. O aumento no número de pessoas morando sozinhas é um dos reflexos da maior independência das mulheres. O número de mulheres universitárias "livres" supera em 54% o de homens. São 800 mil mulheres a mais, solteiras, viúvas ou separadas.

No Brasil, muitas pessoas ainda acreditam que viver só não é uma escolha legítima para a mulher.

Em uma cultura que considera ter um marido como um capital, as mulheres sozinhas são vistas como párias.

Enquanto em outras culturas viver só é uma opção cada vez mais desejável, aqui ainda é sinônimo de exclusão social e de fracasso pessoal.

Por que, após incontestáveis avanços na condição feminina, a brasileira não pode escolher viver só?

E você? Também acha impossível ser feliz sozinha?

MIRIAN GOLDENBERG é antropóloga, professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro e autora de "Corpo, Envelhecimento e Felicidade" (Ed. Civilização Brasileira)
www.miriangoldenberg.com.br

NA PRÓXIMA SEMANA
Anna Veronica Mautner

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