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Corrida RODOLFO LUCENA - rodolfo.lucena@grupofolha.com.br Um gesto banal Mesmo cansada, a corredora Meghan Vogel se esforçou para ajudar a adversária a terminar a prova AQUELA MANHÃ calorenta de sábado revirou a vida da jovem norte-americana Meghan Vogel, uma loirinha de 17 anos que gosta de correr o mais rápido que suas pernas lhe permitirem. Quando o sol já ia alto sobre o estádio Jesse Owens, em Columbus, Ohio, ela venceu a prova de 1.600 metros dando um show de competência. Esperou até a undécima hora para atacar, saindo em perseguição da campeã estadual com espírito matador, fazendo a ultrapassagem sem deixar chances para reação. Cravou a melhor marca de sua vida e se sagrou campeã estadual, um título que sua mãe também havia conquistado, em uma prova de revezamento, quase 30 anos antes. Ann Vogel agora treinava a equipe de atletismo da escola da filha e ambas tinham apenas cerca de uma hora para descansar antes do desafio seguinte. Ainda esfuziante com o resultado, Meghan voltou à pista para tentar nova medalha, desta vez nos 3.200 metros. O esforço anterior, porém, cobrou seu preço: com apenas três das oito voltas completadas, ela sentia o ar lhe fugir e não recebia da musculatura a resposta desejada. Mesmo assim seguiu, ficando cada vez mais para trás. Na derradeira volta, estava na rabeira. Foi quando a menina que ia à sua frente fraquejou. Faltando menos de cem metros para a chegada, bambeou as pernas uma, duas vezes. Ia cair. Bastava um nadinha para Meghan sair da última colocação. Ela acelerou. Emparelhou com a adversária e impediu que a garota caísse ao chão. Segurando-a como podia, caminharam as duas em passos trôpegos até o final da corrida. O estádio aplaudia de pé. Na linha de chegada, Meghan serviu de arrimo para que a rival cruzasse primeiro. Celulares e câmeras registraram o feito. Fotos e vídeos aportaram na internet e foram vistos centenas de milhares de vezes. Meghan deu entrevistas a jornais locais e a agências de notícias, apareceu na TV em cadeia nacional... Exemplo de esportividade foi o menor dos cumprimentos que recebeu -entre outros galardões, foi nomeada atleta da semana pela USA Track & Field, federação nacional de atletismo dos EUA. Tudo por causa de uma pequena gentileza, um simples ato de humanidade e camaradagem, coisa que deveria ser corriqueira, vivêssemos nós em uma sociedade menos competitiva e brutal. Ela mesma ficou espantada com a repercussão do que lhe pareceu um gesto banal. "Não me sinto uma heroína. Eu estava apenas ajudando uma colega. Ela faria o mesmo por mim", disse. Isso nunca saberemos. O que sabemos é que, às vezes, a corrida mostra que a gente, cada um de nós, pode ser uma pessoa melhor, inspirar os outros, fazer diferença. Há que tentar. Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros |
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