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Outras Ideias - Rodolfo Lucena

rodolfo.lucena@grupofolha.com.br

A raça humana

Não há evidências de que a superioridade em esportes de alguns grupos étnicos tenha uma base biológica

OS JOGOS Olímpicos são uma espécie de desfile da ambição humana e da busca da forma perfeita. Corpos desenhados ao longo de anos, cinzelados em salas de treinamento, à força de comida especial e repetições sem fim de exercícios, enfrentam-se na água e na terra, correm, saltam, driblam, atiram, cavalgam, lutam e se soqueiam.

Ali a beleza está subjugada à necessidade: nada é mais lindo do que ganhar uma medalha. As conquistas são de brutamontes que erguem alteres e de sílfides que parecem flutuar no ar, de mulheres-montanha e de esqueléticos maratonistas.

Na preparação da superelite, quase nada é deixado ao acaso. Há até quem se arrisque, com base no histórico dos atletas, a prever o quadro olímpico de medalhas, país por país, esporte por esporte.

No ranking do jornal norte-americano "USA Today", por exemplo, a previsão é de vitória geral da China, seguida pelos EUA. Na maratona, Quênia faz ouro, prata e bronze no masculino e no feminino.

Retrospecto não ganha jogo, mas nos acostumamos, no atletismo, ao domínio de quenianos e etíopes nas provas mais longas, enquanto jamaicanos tomam conta do pedaço na alta velocidade.

Alguns chegam a tecer teses de que quenianos, etíopes, jamaicanos ou negros em geral teriam genética superior para desempenho físico.

"Quem afirma isso quer, na verdade, dizer o contrário: que os negros são inferiores do ponto de vista intelectual", dispara o doutor Yannis Pitsiladis, professor da Universidade de Glasgow e talvez o maior especialista do mundo em genética de corredores olímpicos quenianos, etíopes e jamaicanos.

Com base em mais de dez anos de pesquisas rastreando o DNA de lendas vivas do atletismo, a começar pelo multirrecordista Haile Gebrselassie, passando por medalhistas olímpicos do Quênia, da Etiópia e da Jamaica, ele me disse, em entrevista realizada em São Paulo durante um seminário de genômica e esporte: "Posso afirmar, com 100% de confiança, que até hoje não há evidência genética de que a superioridade de alguns grupos étnicos em esportes tenha base biológica. A evidência disso é zero".

Suas descobertas puseram abaixo hipóteses de que os atletas da África vinham de uma piscina genética similar. "Descobrimos que eles são muito diferentes entre si."

Tão diferentes e tão parecidos como todos nós, gentes iguais, pretos, brancos, amarelos, vermelhos, altos e baixos, gordos e magros, carecas e cabeludos. Enfim, a raça humana, que "risca, rabisca, pinta", no dizer do poeta, e também corre para chegar mais longe, mais alto. Com força total.

RODOLFO LUCENA, 55, é editor do blog +Corrida (http://rodolfolucena.blogfolha.uol.com.br), ultramaratonista e autor de "Maratonando, Desafios e Descobertas nos Cinco Continentes" (Record)

NA PRÓXIMA SEMANA
Michael Kepp

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