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O efeito batom

Pesquisa de antropóloga americana mostra por que, em tempos de crise econômica, as vendas de cosméticos crescem

RODOLFO LUCENA
COLUNISTA DA FOLHA

Em tempos de crise, as mulheres se embelezam. Confrontadas com a situação de desemprego e recessão, adultas jovens investem em batons, perfumes e outros produtos que possam realçar seus dotes naturais. Querem se tornar mais sedutoras para conquistar companheiros em boa situação econômica.

Essas afirmações, que bem poderiam fazer parte de uma arenga machista, resumem as conclusões do estudo "Boosting Beauty in an Economic Decline: Mating, Spending, and the Lipstick Effect" (em tradução livre, turbinando a beleza durante o declínio econômico: namoro, gastos e o efeito batom), divulgado no final de maio no "Journal of Personality and Social Psychology", publicação norte-americana especializada em psicologia social e estudos da personalidade.

A pesquisa relaciona dados econômicos dos últimos 20 anos nos Estados Unidos com gastos em uma série de categorias de produto. Demonstra que, nos períodos em que cresce o desemprego, aumentam também os gastos em artigos que podem ser usados para melhorar a aparência, como cosméticos e roupas, enquanto caem as compras de móveis e produtos eletrônicos.

Segundo seus autores, é a comprovação do "efeito batom", como ficou conhecida a tendência de consumidores norte-americanos de, em tempos de crise, manterem seus gastos em bens de luxo, ainda que menos -em lugar de casacos de pele, batons de grife.

A nova pesquisa foi além. Coordenada pela antropóloga e doutora em psicologia Sarah Hill, professora da Texas Christian University, fez estudos experimentais reunindo jovens universitários (82 mulheres e 72 homens de 18 a 28 anos) para tentar descobrir o que está por trás desse comportamento.

Um grupo de homens e mulheres foi confrontado com textos e informações indicando situação de crise econômica e desemprego; outro recebeu textos anódinos para ler. Depois, os pesquisadores trataram de ver os comportamentos dos envolvidos em relação a compras e busca de parceiros. Nesta entrevista, Sarah Hill comenta os resultados.

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Folha - Qual a novidade apresentada pelo seu trabalho?

Sarah Hill - É a primeira demonstração experimental do efeito batom. Nossa pesquisa mostrou que ele é provocado pelo desejo das mulheres de encontrar parceiros e que se mantém mesmo quando os produtos de beleza são caros.

Sua pesquisa comparou dados econômicos dos últimos 20 anos nos EUA. O que foi encontrado?

Descobrimos que o aumento da taxa de desemprego está relacionado com a redução de gastos em produtos que não podem ser usados para aumentar o poder de sedução, como equipamentos eletrônicos. Em contrapartida, pode ser associado ao maior gasto em categorias de produtos que são usados para melhorar a aparência, como cosméticos.

Quais são as causas do efeito batom?

Ele é motivado pelo desejo das mulheres de, durante períodos de recessão, encontrar parceiros com estabilidade e segurança financeira. As principais compradoras são mulheres que buscam companheiros.

Como a senhora prova que são as mulheres as responsáveis pelo efeito batom?

Nossa pesquisa foi integrada por cinco estudos. O primeiro foi uma pesquisa de dados econômicos mostrando a relação entre as vendas de produtos que homens e mulheres compram e as taxas de desemprego ao longo de 20 anos. Os outros quatro estudos, porém, foram testes experimentais que demonstraram uma relação de causa e efeito entre a situação de recessão e o desejo das mulheres de comprar produtos específicos que elas acreditam que as vão tornar mais atraentes para os homens.

Sua pesquisa incluiu gays, homens e mulheres?

Na pesquisa, só analisamos heterossexuais. Nós prevíamos que o efeito batom iria acontecer entre mulheres, mas não entre homens, porque: 1) em resposta à recessão, mudam as prioridades das mulheres, e não as dos homens, no que se refere à escolha de parceiros -elas passam a dar mais peso à segurança econômica, homens não; 2) a primeira maneira encontrada pelas mulheres para aumentar sua competitividade na busca por parceiros desejáveis é realçar seus dotes físicos (o que não é verdade para os homens).

A senhora diz que as mulheres, em tempos de crise, buscam parceiros que ofereçam segurança financeira. Mas isso não vale em qualquer momento econômico?

As mulheres sempre querem ter parceiros com recursos financeiros, mas, em períodos de recessão, elas dão uma ênfase maior a essa qualidade, porque é a que sofre mais impacto. Ainda que os homens também apreciem ter parceiras com recursos, décadas de pesquisas sobre as preferências masculinas demonstraram que essa é uma qualidade para a qual as mulheres dão mais importância do que os homens.

Sua pesquisa afirma que, mesmo durante a recessão, as mulheres dão preferência a produtos de beleza mais caros e luxuosos. Por quê?

Porque acreditam que produtos mais caros são mais eficazes para torná-las mais atraentes. Nós provamos isso apresentando a um grupo uma situação de recessão e pedindo às mulheres que escolhessem entre produtos de beleza caros e suas versões mais econômicas. Elas preferiram os mais caros.

A preferência das mulheres, segundo sua pesquisa, vai sempre para produtos que possam lhes dar vantagens na busca de parceiro, segundo acreditam.

Certo. Se a publicidade não destaca essa capacidade, apresentando outras qualidades (por exemplo, conforto), as mulheres vão ter interesse menor pelo produto.

A senhora compra muitos produtos de beleza? Aumentou seus gastos nessa área durante a recessão de 2008?

Não que eu tenha percebido, mas eu reconheço que posso ter aumentado meus gastos sem me dar conta disso.

87 bilhões Foi o faturamento da indústria brasileira de cosméticos no ano passado

10% do mercado É a fatia do Brasil no consumo mundial de produtos de beleza

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