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DPOC é doença que mata três brasileiros por hora
Campanha nacional oferece diagnóstico gratuito de DPOC,
que é causada por cigarro e atinge fumantes e ex-fumantes
ANA PAULA DE OLIVEIRA
DA REPORTAGEM LOCAL
As estatísticas são assustadoras: a DPOC (doença pulmonar
obstrutiva crônica) mata, em média, três brasileiros por hora e é a quinta maior causa de mortalidade no país e a sexta no
mundo. Apesar disso, a doença ainda é pouco conhecida. Para
tentar reverter esse quadro, a Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia (SBPT) criou o programa Respire e Viva. Desde 15
de maio, um ônibus-consultório está
percorrendo o país para divulgar a DPOC
e realizar diagnósticos gratuitos.
Em Santos, primeira cidade visitada,
das 1.357 pessoas que se submeteram ao
exame, 33% têm DPOC. O dado mais
alarmante, porém, é que boa parte delas
nem desconfiava sofrer de uma doença
incurável e potencialmente fatal. Além de
desconhecida, a DPOC é silenciosa: só 30
anos após o início dos danos nas vias respiratórias é que a pessoa começa a apresentar sintomas mais claros de que está
com a capacidade pulmonar comprometida, entre os quais falta de ar e tosse
constante. Muitos pacientes só procuram
o médico quando não conseguem mais
caminhar, subir escadas e até falar, diz o
médico Sérgio Menna Barreto, presidente da SBPT no Rio Grande do Sul.
A DPOC caracteriza-se pela ocorrência
simultânea de duas doenças que prejudicam o funcionamento dos pulmões, a
bronquite crônica (inflamação dos brônquios, que causa tosse e catarro constantes) e o enfisema (destruição do tecido
pulmonar, que provoca a falta de ar). O
tabagismo é responsável por cerca de
90% dos casos -de 15% a 20% dos fumantes desenvolverão a doença.
Além de causa, o fumo é um dos fatores
que levam a doença a ser detectada tardiamente. "O fumante foge do médico
porque sabe que ele o mandará parar de
fumar", diz o pneumologista Paulo Feitosa, da Secretaria Estadual de Saúde do
Distrito Federal -próxima região a ser
visitada pelo ônibus-consultório.
Outro empecilho é que a falta de ar e o
cansaço são considerados conseqüências
normais do processo de envelhecimento.
Apenas o diagnóstico precoce, porém,
pode conter o avanço da doença.
Diagnóstico precoce
"Levo uma vida quase normal. Subo ladeiras e até freqüento bailes", conta o vendedor de
computadores Maximo Alveia Gallego,
71, que parou de fumar há 20 anos e soube que tem a doença há menos de dois.
Ele acredita que não estaria tão bem hoje
se não tivesse procurado o médico assim
que começou a se sentir cansado ao subir
escadas. "Mas nunca havia ouvido falar
de DPOC, achava que era uma bronquite
qualquer."
O primeiro passo para detectar a doença é a análise dos sintomas e fatores de
risco. A equipe do programa Respire e
Viva distribui questionários que avaliam
o histórico do indivíduo. Se a resposta for positiva a três ou
mais questões, a pessoa é submetida ao
exame espirométrico, no qual um aparelho mede o volume de ar que entra e sai
dos pulmões, explica Oliver Nascimento,
pneumologista da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo).
O tratamento varia de acordo com o estágio da doença, que, em grau avançado,
compromete até o funcionamento do coração. Se o paciente ainda fuma, deve
abandonar o cigarro imediatamente. Em
seguida, passa a usar broncodilatadores e
antiinflamatórios em bombinha ou
spray, afirma Nascimento. No ano passado, chegou ao Brasil o brometo de tiotrópio, primeiro medicamento específico
para DPOC, cuja ação dura 24 horas.
Recomenda-se também ao paciente
que siga um programa de reabilitação
pulmonar, composto por sessões semanais de fisioterapia e atividades físicas
que exercitam os músculos respiratórios.
Em casos mais graves, é preciso receber
oxigênio por equipamentos (oxigenoterapia). Se essas medidas não contêm o
progresso da doença, mas o pulmão está
apenas parcialmente comprometido, o
paciente pode se submeter a uma cirurgia que reduz o volume pulmonar, na
qual o médico retira o tecido mais danificado, explica Paulo Feitosa. Caso isso
também não surta efeito, resta a opção do
transplante de pulmão.
A aposentada Aracy Hackradt, 75, recebeu o diagnóstico de DPOC há nove anos
e passou pela cirurgia de redução de volume pulmonar. "Assim que fui operada,
eu me sentia ótima, até corria no clube.
Mas, no ano passado, um dos meus pulmões parou de trabalhar. Hoje preciso
inalar oxigênio 24 horas por dia e nem
me queixo. Estou colhendo o que plantei.
Fumei por 30 anos."
A estreita relação entre o cigarro e a
DPOC fez com que a doença só ganhasse
proporções alarmantes após a Segunda
Guerra Mundial, época em que o consumo maciço de cigarros já era um hábito
popularizado havia algumas décadas. Os
especialistas acreditavam que a doença
não tinha tratamento. "Com o avanço da
tecnologia de diagnóstico, a comunidade
médica passou a ver a DPOC com mais
clareza e percebeu que, se uma das causas
era a inflamação dos brônquios, a doença
poderia ser tratada com antiinflamatórios. Com isso, foi provado que, mesmo
não tendo como reverter o processo, o
paciente pode ter expectativas de melhora no seu cotidiano", afirma Sérgio Menna Barreto.
Foi no início da década de 90 que a Organização Mundial da Saúde (OMS) se
deu conta dos prejuízos que a doença
acarreta não só aos pacientes como também aos sistemas públicos de saúde -a
cada ano, 230 mil brasileiros são hospitalizados por causa da DPOC. A constatação do impacto da doença levou à criação
do Projeto Gold (Iniciativa Global para a
Doença Obstrutiva Pulmonar Crônica,
na sigla em inglês), que atua em 72 países
com o objetivo de divulgar a DPOC entre
a população e os médicos.
Com o mesmo objetivo, foi criada, em
2000, a Associação Brasileira de Portadores de DPOC. "Há quatro anos, ninguém
falava sobre essa doença", diz o aposentado Manoel de Souza Machado Junior,
73, que preside a entidade. Apesar de ter
parado de fumar há mais de 20 anos, ele
descobriu, há seis, que tinha DPOC. "Não
conseguia respirar durante uma discussão familiar e parei no hospital", conta
Machado.
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