São Paulo, quinta-feira, 05 de abril de 2007
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Rosely Sayão

O mal da impaciência severa

Pelo jeito, o mundo enfrenta mais um problema sério entre tantos outros de semelhante gravidade: a impaciência severa. Dei um longo passeio pela internet e visitei muitos blogs de crianças com mais de nove anos e de adolescentes.
Em seus diários virtuais, eles contam dramas, mostram seus poemas, relatam os primeiros passos da vida amorosa e sexual e, acima de tudo, desabafam sobre os seus conflitos.
Estes são os mais variados possíveis: o namorado que não telefonou no horário combinado, o professor que cometeu alguma injustiça, a reclamação sobre a amiga inseparável que passou a preferir a companhia de outra colega, isso sem falar nas fofocas sobre festas. Em meio à diversidade de estilos, tanto de texto quanto de vida, há um desabafo campeão de citações: os conflitos com os pais.
Entre as reclamação, uma se destaca: a falta de paciência dos pais. Às vezes, eles se queixam de que os pais não a têm para conversar com eles ou para ouvir o que têm a dizer a respeito de um assunto importante ou de uma bobagem qualquer. Entretanto, na maioria dos casos, as reclamações são da falta de paciência com fatos que fazem parte cotidianamente da vida de pais e filhos e que dizem respeito, por exemplo, ao horário de acordar ou de tomar banho, ao esquecimento da lição de casa, à presença de roupas sujas espalhadas pelo chão etc.
Claro que, quase sempre, os pais têm razão nas reclamações. Não é essa a questão. O que chateia os rebentos é a falta de paciência frente às suas pequenas e diárias infrações. E como eles detectam isso? Na irritação dos gestos, nos gritos, nos castigos pesados e até na indiferença dos pais.
E, por falar em indiferença, agora virou moda muitos pais explicarem o motivo da ausência na vida dos filhos adolescentes: é que "entregaram a Deus" a árdua tarefa. Passo um aviso importante: Deus anda muito ocupado para educar tantos filhos abandonados.
Mas não são só os pais que apresentam os sintomas da impaciência severa. Jovens e adultos também mostram sinais de que foram acometidos pelo mal. Falta paciência para assistir à aula na universidade, para preencher o formulário de declaração do imposto de renda, para persistir até o fim em uma tarefa, para visitar a sogra, entre tantos outros exemplos.
Há pessoas que lamentam sofrer de impaciência severa e anseiam pelo dia em que possam persistir em algo. Mas não fazem esforço algum para atingir tal objetivo! Acham que paciência cai do céu. É que a idéia de que paciência é uma virtude que precisa ser cultivada permanentemente, com perseverança, desapareceu. Escolhemos ficar com o conceito de que paciência é um dom que poucos recebem.
Quem tem filhos tem de ter paciência por pelo menos uns 16, 18 anos. E não adianta espernear, reclamar, fazer promessa, ameaçar: sem a santa paciência dos pais fica muito mais difícil conviver com os filhos, já que estes demandam tutela. É por isso que pais precisam repetir mais de mil vezes, se for o caso, que roupa suja deve ser depositada no local adequado, que é preciso tomar banho todos os dias etc.


ROSELY SAYÃO é psicóloga e autora de "Como Educar Meu Filho?" (ed. Publifolha) roselysayao@folhasp.com.br

blogdaroselysayao.blog.uol.com.br


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