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Rosely Sayão
O mal da impaciência severa
Pelo jeito, o mundo enfrenta mais um problema sério entre tantos outros de semelhante gravidade: a impaciência severa. Dei um longo passeio
pela internet e visitei muitos
blogs de crianças com mais de
nove anos e de adolescentes.
Em seus diários virtuais, eles
contam dramas, mostram seus
poemas, relatam os primeiros
passos da vida amorosa e sexual
e, acima de tudo, desabafam sobre os seus conflitos.
Estes são os mais variados
possíveis: o namorado que não
telefonou no horário combinado, o professor que cometeu alguma injustiça, a reclamação
sobre a amiga inseparável que
passou a preferir a companhia
de outra colega, isso sem falar
nas fofocas sobre festas. Em
meio à diversidade de estilos,
tanto de texto quanto de vida,
há um desabafo campeão de citações: os conflitos com os pais.
Entre as reclamação, uma se
destaca: a falta de paciência dos
pais. Às vezes, eles se queixam
de que os pais não a têm para
conversar com eles ou para ouvir o que têm a dizer a respeito
de um assunto importante ou
de uma bobagem qualquer. Entretanto, na maioria dos casos,
as reclamações são da falta de
paciência com fatos que fazem
parte cotidianamente da vida
de pais e filhos e que dizem respeito, por exemplo, ao horário
de acordar ou de tomar banho,
ao esquecimento da lição de casa, à presença de roupas sujas
espalhadas pelo chão etc.
Claro que, quase sempre, os
pais têm razão nas reclamações. Não é essa a questão. O
que chateia os rebentos é a falta
de paciência frente às suas pequenas e diárias infrações. E
como eles detectam isso? Na irritação dos gestos, nos gritos,
nos castigos pesados e até na
indiferença dos pais.
E, por falar em indiferença,
agora virou moda muitos pais
explicarem o motivo da ausência na vida dos filhos adolescentes: é que "entregaram a
Deus" a árdua tarefa. Passo um
aviso importante: Deus anda
muito ocupado para educar
tantos filhos abandonados.
Mas não são só os pais que
apresentam os sintomas da impaciência severa. Jovens e
adultos também mostram sinais de que foram acometidos
pelo mal. Falta paciência para
assistir à aula na universidade,
para preencher o formulário de
declaração do imposto de renda, para persistir até o fim em
uma tarefa, para visitar a sogra,
entre tantos outros exemplos.
Há pessoas que lamentam
sofrer de impaciência severa e
anseiam pelo dia em que possam persistir em algo. Mas não
fazem esforço algum para atingir tal objetivo! Acham que paciência cai do céu. É que a idéia
de que paciência é uma virtude
que precisa ser cultivada permanentemente, com perseverança, desapareceu. Escolhemos ficar com o conceito de
que paciência é um dom que
poucos recebem.
Quem tem filhos tem de ter
paciência por pelo menos uns
16, 18 anos. E não adianta espernear, reclamar, fazer promessa, ameaçar: sem a santa
paciência dos pais fica muito
mais difícil conviver com os filhos, já que estes demandam
tutela. É por isso que pais precisam repetir mais de mil vezes,
se for o caso, que roupa suja deve ser depositada no local adequado, que é preciso tomar banho todos os dias etc.
ROSELY SAYÃO é psicóloga e autora de "Como
Educar Meu Filho?" (ed. Publifolha)
roselysayao@folhasp.com.br
blogdaroselysayao.blog.uol.com.br
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