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São Paulo, quinta-feira, 07 de agosto de 2003
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Biográfico identifica os fatos e os comportamentos marcantes de cada fase da vida e ajuda a estabelecer metas para o futuro

Lembrar o passado para entender o presente

CRISTINA CAROLA
DA REPORTAGEM LOCAL

Você consegue se lembrar da festa do seu terceiro aniversário? Ou das discussões que você tinha com seus pais na adolescência ou com o chefe no primeiro emprego? Lembranças como essas vêm à tona durante o biográfico, que, apesar do nome, vai além do mero registro da história de vida de uma pessoa. É um processo de autoconhecimento com objetivo bem mais ambicioso: lembrar o passado para entender o presente e estabelecer metas para o futuro.
"A pessoa assume a responsabilidade pelo próprio desenvolvimento, deixa de se ver como vítima e passa a ser o agente transformador da sua vida", explica a psicoterapeuta Adelina Rennó. Com objetividade e o mínimo de envolvimento emocional, a pessoa revê fatos de várias fases da sua vida, tenta perceber comportamentos que se repetem e, a partir dessas observações, decide o que quer fazer daquele momento em diante.
O biográfico baseia-se nos conceitos da antroposofia, doutrina desenvolvida no início do século passado pelo filósofo austríaco Rudolf Steiner (1861-1925) e que busca o entendimento do homem em seus aspectos físicos, psíquicos e espirituais. Criado pelo psiquiatra holandês Bernard Lievegoed (1905-1992) logo depois da Segunda Guerra, o biográfico chegou ao Brasil nos anos 80, trazido pela médica Gudrun Burkhard, fundadora da clínica antroposófica Artemísia (SP).
As chamadas crises, em que a pessoa revê sua trajetória e seus valores, são a porta de entrada para a terapia biográfica. "As crises fazem parte da vida e até da saúde, porque, muitas vezes, elas chegam a causar doenças orgânicas", diz o diretor da Artemísia, o médico Ronaldo Perlatto.


"A pessoa assume a responsabilidade pelo próprio desenvolvimento, deixa de se ver como vítima e passa a ser o agente transformador da sua vida"


Adelina Rennó, psicoterapeuta


Carina Edenburg, 37, nunca tinha trabalhado até se separar, há dois anos. Com dois filhos, ela se sentiu "perdida". "Eu era artista plástica e professora de inglês, precisava ganhar dinheiro, mas não sabia como." Segundo ela, o biográfico norteou-a. "A partir dele, comecei a trabalhar como artista plástica."
Em crise estava também a gerente de RH Vera Petrilli Módolo, 51. Ansiedade e temores fizeram-na procurar um terapeuta biográfico. O processo foi interrompido por uma queda grave, há quatro anos. Ao retomá-lo, Vera percebeu que as situações inesperadas que vivera, como a queda, um acidente de carro na adolescência e a doença do pai, fizeram com que ela tentasse controlar tudo à sua volta -o que só gerava mais ansiedade e medo. "Para que tanto controle, tanto cuidado? As coisas precisam fluir." Essa tem sido a sua meta.
Para a antroposofia, a vida divide-se em ciclos de sete anos -os setênios-, com características próprias e marcados por mudanças psicossomáticas (leia mais na pág. ao lado). "A cada sete anos, é como se alguma qualidade nova nascesse", explica Rennó.
Em sessões individuais ou em grupo, o biográfico trabalha as lembranças de cada setênio. Após receber informações sobre essas fases, a pessoa escreve, em ordem cronológica e objetivamente, os fatos que marcaram esses períodos para ela (leia na pág. ao lado como turbinar a memória). Além de apresentar esse relato ao grupo ou para o terapeuta, a pessoa escolhe uma cena importante desses setênios para representar -em desenho, pintura ou escultura- na sessão artístico-imaginativa. As lembranças objetivas ganham vida e cor nessa etapa. Segundo Rennó, é nesse momento que os sentimentos vêm à tona, porque, para a antroposofia, "a arte é a pátria dos sentimentos".
Essa metodologia é adotada para todos os setênios e, ao compará-los, a pessoa pode perceber padrões repetitivos de comportamento e tentar mudar aqueles que são prejudiciais para ela. Além disso, ela determina metas para o futuro, colocando-as no papel e estabelecendo prazos. "É preferível uma meta pequena, factível, bem explicada", diz Perlatto.
Para fazer o biográfico, a pessoa deve ter 21 anos ou mais. Antes dessa idade, a terapia não é indicada porque os três primeiros setênios são considerados fases de formação, explica Perlatto. No biográfico em grupo, os participantes ficam reunidos por cinco ou sete dias. Já a terapia individual consome, no mínimo, 16 sessões. "Em grupo, as pessoas aprendem a escutar sem julgar. Se for individual, a biografia é mais explorada, há mais tempo", afirma Rennó.


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