São Paulo, quinta-feira, 08 de novembro de 2007
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Saúde

Esse tal mosquito

Crianças infectadas pela dengue apresentam sintomas diferentes de adultos e são muitas vezes tratadas como se tivessem apenas "virose"

AMARÍLIS LAGE
da reportagem local

Febre prolongada, cefaléia, dor atrás dos olhos, nos músculos e nas articulações -esses são os principais indícios da dengue clássica, que tem atingido cada vez mais pessoas no Brasil. Mas, em crianças, raramente aparecem juntos e de forma tão clara, o que aumenta o risco de o problema não ser rapidamente reconhecido e levar a complicações.
A dor de cabeça, por exemplo, não costuma acometer as crianças infectadas. Em compensação, a doença geralmente faz com que elas vomitem e sintam dor abdominal, algo menos comum em adultos, explica a pediatra e infectologista Consuelo Oliveira, presidente da Sociedade de Pediatria do Pará. Some-se a isso o fato de que as crianças, principalmente as mais novas, nem sempre conseguem explicar com detalhes a dor que estão sentindo.
Uma pesquisa realizada pela UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) concluiu que os critérios adotados pelo Ministério da Saúde para identificar casos suspeitos de dengue não são úteis para crianças, já que, nelas, os sintomas se confundem com os de outras doenças. Para Oliveira, ouve uma "banalização" da infecção. "Tudo é considerado uma -'virose' e é tratado de forma passiva: o pediatra examina, dá um antitérmico e manda a criança para casa."

Filhos de mulheres que tiveram dengue são mais vulneráveis a quadros graves da doença


A atitude correta -principalmente onde há epidemias de dengue- seria fazer um hemograma nas crianças que estiverem com febre há dois dias e não apresentarem secreção no pulmão nem garganta inflamada, afirma Oliveira. O exame permite avaliar a queda no nível de plaquetas -um dos indicadores da doença. Esses corpúsculos são responsáveis pela coagulação do sangue, e sua diminuição leva a sangramentos (problema comum na forma mais grave da doença, a dengue hemorrágica).
Também é importante que o médico monitore essas crianças a cada dois dias. Os piores efeitos da dengue hemorrágica ocorrem depois do terceiro dia, quando a febre cai, e a criança, aparentemente, melhora. É a partir daí que ela começa a ter sintomas como dores abdominais, sudorese, vômitos, aumento do fígado e sangramentos.
"Não se trata de ser alarmista , mas de pensar na possibilidade de aquela febre ser sinal de dengue", diz a pediatra. Infelizmente, essa probabilidade é cada vez maior. Afinal, em países onde a dengue já existe há muito tempo, como Cuba e algumas nações asiáticas, a doença afeta principalmente crianças. No Brasil, onde a doença é relativamente "nova", os mais atingidos ainda são os adultos. Mas esse perfil já está mudando, de acordo com Oliveira. "Este ano foi dramático aqui em Belém, com muitos casos de dengue hemorrágica em crianças", conta. Pela primeira vez no Estado, crianças morreram devido à doença.

De mãe para filho
Um aspecto que torna as crianças mais vulneráveis à doença é que, quando a mãe foi infectada pelo vírus, ela transmite os anticorpos para o filho -o que é considerado uma primeira infecção. Como a dengue é uma doença que se torna mais severa a cada novo contágio, essa criança sofrerá uma reação mais forte quando realmente entrar em contato com o vírus: seu corpo entenderá que já é a segunda vez que ela desenvolve a doença.
Não existe remédio contra o vírus, mas é possível controlar os sintomas, explica Sandra Campos, professora de infectologia pediátrica da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo). "O grande ponto do tratamento é reconhecer os quadros mais graves e tratá-los imediatamente." A principal causa de morte por dengue é o choque não cuidado. Segundo Marco Aurélio Safadi, professor de pediatria da Santa Casa e coordenador da infectologia pediátrica do Hospital São Luís, o choque é uma complicação mais rara, em que há colapso do sistema circulatório, com queda de pressão e extravasamento de líquido para cavidades do abdômen. Mais grave, esse problema exige internação em unidades de terapia intensiva, mas também é tratável.
Ainda segundo Safadi, um aspecto importante do tratamento é que o paciente permaneça bem hidratado e não tome nem ácido acetilsalicílico nem antiinflamatórios não-hormonais, já que esses remédios atuam sobre a coagulação sangüínea, facilitando a ocorrência de sangramentos. O melhor remédio, porém, continua sendo a prevenção. Para isso, evite o acúmulo de água em vasos, pneus etc., já que esses ambientes são propícios à proliferação do Aedes aegypt, mosquito transmissor do vírus da dengue.


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