São Paulo, quinta-feira, 09 de novembro de 2000
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

s.o.s. família
Filhos de pais separados sofrem, sim

rosely sayão

"Eu não me separo por causa dos filhos." Essa frase foi muito usada por homens e mulheres que, descontentes com a situação do casamento que viviam, encontravam nos filhos a justificativa para a permanência em um tipo de vida desconfortável, frustrante ou, às vezes, de grande sofrimento. Esse tempo já se foi, e as pessoas não jogam mais sobre os filhos tamanha responsabilidade. Mas, mesmo em época de tantas separações e divórcios, uma dúvida permanece para muitos pais: no caso de separação, os filhos são afetados?
Não dá para ser "pós-moderno" e dizer que, para os filhos, tanto faz se os pais estão juntos ou não. Sim, para os filhos há uma grande diferença entre crescer com a presença dos pais sob o mesmo teto, crescer com a presença dos dois de forma alternada ou crescer com a presença de um só deles.
A criança vai sofrer com a separação dos pais? Vai. Vai sentir falta da presença segura e constante de um deles? Vai também. Ela pode reclamar da situação, sentir-se abandonada? Sem dúvida que sim! Mas o filho pode, também, superar essas frustrações, essa vicissitude da vida e seguir em frente. E com menor dificuldade se os pais colaborarem com ela e não abdicarem de seu papel.
A separação de um casal quase sempre é muito sofrida: são muitos sonhos que se perdem, é um projeto de vida que deixa de existir, são mágoas e ressentimentos que crescem a cada segundo.
E os pais não podem imaginar que os filhos não percebem o que está acontecendo. Tentar poupar os filhos dessa situação é subestimar a criança e a sensibilidade que ela tem para perceber as situações que a cercam.
Claro que isso não significa contar para a criança o que está acontecendo usando linguagem adulta, muito menos expor a criança a sentimentos que ela não tem condições de entender ou em que ela não pode interferir. Mas os pais precisam encontrar um modo de se comunicar com o filho sobre a separação e conversar com ele sobre o assunto.
E, mesmo sofrendo o próprio sofrimento, os pais precisam suportar o sofrimento dos filhos nesse momento delicado.
Sim, isso pode ser bastante difícil para o adulto. Uma jovem mãe escreveu contando que estava se sentindo desnorteada quando a filha, de quase 4 anos, gritava, lamentando a ausência do pai, fato que estava ocorrendo com muita frequência. Depois de tentar reagir às crises de birra por umas duas vezes, a mãe desistiu e deixou a filha chorando sozinha em um quarto, enquanto ia chorar no outro.
Provavelmente essa mãe está com dificuldades para distinguir a própria situação daquela que a filha está vivendo. A filha está sentindo a falta do pai, e a mãe, que está com ela, precisa entender isso e ampará-la para que ela possa suportar essa ausência.
O filho pode ter 1, 3, 5, 8 ou 15 anos de idade. Em todos os casos, a separação dos pais será sentida. Cada criança reage de um modo, e os pais precisam estar atentos para saber como e quando intervir. O que os pais não podem é relevar determinados comportamentos do filho, levando em conta o sofrimento pelo qual ele está passando, ou sentir-se incompetentes para compreender o que está acontecendo. Não! Os filhos precisam continuar aprendendo a viver, a suportar as frustrações que a vida lhes apresenta, a enfrentar as perdas indesejadas e, para isso, dependem dos pais.
Um novo relacionamento deve e pode surgir com os filhos depois de uma separação. Mas a tarefa continua a mesma: educar. Se os pais, mesmo separados, cumprem sua obrigação, o filho terá mais chances de se desenvolver de forma coerente com o potencial que tem.


ROSELY SAYÃO é psicóloga, consultora em educação e autora de "Sexo É Sexo" (ed. Companhia das Letras); e-mail: roselys@uol.com.br


Texto Anterior: Peça rara: Ilumine o trabalho e brinque de poupar
Próximo Texto: Firme e forte: Exercícios na água ganham ritmo e saem do marasmo
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.