FERNANDA MENA
DA REPORTAGEM LOCAL

Só horário e local eram conhecidos. O resto era surpresa, do menu aos convidados. E é aí que entrava o tal frio na barriga. Quanto mais eu me preparava para o jantar -promovido por uma empresa especializada em apresentar seus sócios uns aos outros em eventos programados-, mais encanações surgiam. Estava certa de que o encontro teria solitários, tarados, carentes ou, no mínimo, chatos. Ou, pior, todos juntos. O que vou falar com esses estranhos? Seria o jantar um intensivão de temporada de caça ao sexo oposto? Serei uma presa fácil, inexperiente no traquejo dos encontros às escuras? Socorro! Na entrada, uma funcionária da empresa, bem animada, me apresentou para dois sócios que já haviam chegado. Um, notoriamente tímido, mal me olhou. O outro, já mais atirado, disparou: "Você é de câncer, não é?". Não sou. Mas, apesar do clichê bola fora, essa foi a deixa para o início de uma conversa morna, mas amigável. Uma taça de prosecco, umas torradinhas, e os outros cinco convidados chegaram. Dois já se conheciam de encontros anteriores. Outros dois se encantaram um com o outro antes mesmo da chegada da salada, engatando uma conversa impenetrável por cerca de 40 minutos. Dali, alguma coisa haveria de sair. No resto da mesa, o clima era de descontração e curiosidade com a variedade humana local. Quatro homens, quatro mulheres. Médicos, empresários, advogados, numerólogos. De meditação a mercado financeiro, a conversa foi abrangente e impessoal. Qual não foi minha surpresa ao perceber que, uma hora (e algumas taças) depois, já estava rindo com os mais desinibidos. Após a sobremesa e uma cantada bem sutil, chegou a hora da saída estratégica. Os tarados, os carentes e os chatos não estavam ali. Era só gente ocupada e sem jeito querendo conhecer outras gentes na mesma situação.