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Relação médico-paciente permite negociar preços
Conversar com a secretária e se informar previamente sobre o valor do tratamento são medidas que evitam constrangimento
IARA BIDERMAN
FREE-LANCE PARA FOLHA
Embora saúde não seja uma mercadoria que se escolha na prateleira
conforme o dinheiro que se tem no bolso, ela tem um preço. Mas
para o paciente costuma ser constrangedor, quando não um tabu, falar
de dinheiro no consultório médico. Difícil para um paciente se ver negociando o
preço ou a forma de pagamento de uma consulta ou ainda realizando
uma pesquisa de preço antes de se decidir pelo tratamento proposto pelo médico. "Para mim, a prática é totalmente aceitável", afirma o cardiologista Mauricio Wajngarten, chefe
da geriatria do Instituto do Coração
(Incor) e professor livre-docente da
faculdade de medicina da Universidade de São Paulo. "Hoje em dia,
qualquer pessoa que tenha um pouquinho de responsabilidade tem de
perguntar o preço e, se necessário,
negociar", diz Wajngarten.
A relação médico-paciente de qualidade, que pressupõe, entre outros, a
explicação clara do diagnóstico e as
opções de tratamento, também passa
pela questão financeira, diz Roberto
Hirsch, neurologista do hospital Albert Einstein (SP). "Antecipar ao paciente o gasto que ele terá diminui a
aflição na hora de pagar a conta",
acredita Hirsch.
Quando se trata de uma primeira
consulta e, portanto, a relação ainda
não está estabelecida, a opção é perguntar o preço e as eventuais formas
de pagamento antes de marcá-la. "O
paciente tem de aprender a conversar
sobre o pagamento antes do procedimento. Não é o que costuma acontecer, mas perguntar o preço é muito
legítimo", afirma Antônio Carlos Lopes, presidente da Sociedade Brasileira de Clínica Médica.
Maria Stella Gregori, diretora de fiscalização da Agência Nacional de
Saúde (ANS) e que já integrou a direção do Procon, diz que o Código de
Defesa do Consumidor não regula os
serviços do profissional liberal médico, mas estabelece que toda informação (sobre produtos ou serviços) tem
de ser dada de forma clara, ou seja, é
obrigatório informar o preço ao consumidor. Sabendo qual é o preço, o
paciente pode aceitar ou tentar negociar. O detalhe: não há legislação que
estipule o teto máximo para honorários médicos. O que vigora é a lei do
mercado.
"Um pediatra em Nova Iguaçu
(Baixada Fluminense) cobra, em média, R$ 40 a consulta. Na zona do sul
do Rio, a mesma consulta vai custar
R$ 200 ou mais", diz Eduardo da Silva
Vaz, diretor da Associação Médica
Brasileira (AMB). Quem paga mais
traz mais expectativas agregadas à
consulta médica.
"A sala e o tempo de espera, as revistas que encontra na recepção, a
duração da consulta, tudo isso está
incluído nessas expectativas", diz
Ana Maria Malik, médica e diretora
de pesquisas em saúde da Fundação
Getúlio Vargas. E não é só isso. O médico que pode cobrar mais também
pode dedicar mais tempo para cada
paciente sem tornar o consultório
economicamente inviável nem prescindir de investimentos em reciclagem profissional. "Na área médica, o
conhecimento fica velho rapidamente, a educação permanente é fundamental para se manter atualizado",
afirma Malik.
Para Antônio Carlos Lopes, o preço
determinado pelo mercado também
se refere a questões éticas. "O valor
deve se equiparar à média cobrada
pelos médicos que atuam naquele local. Cobrar muito abaixo caracteriza
uma concorrência desleal", diz Lopes. Exorbitar no preço também fere
a ética médica, mesmo que não exista
uma determinação para controlar os
preços máximos. "O problema da
medicina é que não tem controle",
diz Lopes.
No livre mercado das consultas
particulares, o que serve de parâmetro para definir o preço da consulta
ou do tratamento é o grau de formação, de atualização e a disponibilidade do médico, diz Marcello Barduco, cardiologista do Sírio Libanês (SP).
"Normalmente, um professor doutor cobra mais. Mas essa é uma decisão que passa do foro íntimo ao
narcisismo de cada médico", diz
Henrique Caivano Soares, professor de medicina legal e bioética da
Unifesp.
Odontologia
Os conselhos re
gionais e federal de odontologia,
que regulam a prática, não estabelecem preço mínimo ou máximo
para os procedimentos, seja uma
simples restauração (de dente com
cárie) ou uma aplicação de flúor.
Ideval Serrano, presidente da Comissão de Ética do Conselho Regional de Odontologia de São Paulo,
diz que os parâmetros para fixar os
honorários estão no Código de Ética Odontológica.
Os parâmetros são: considerar a
condição socioeconômica do paciente, o costume do lugar, a especialização do profissional, a complexidade do caso, o tempo do tratamento e o custo operacional.
Psicanálise
Em tratamentos
que exigem consultas semanais, como o psicanalítico, a negociação
prévia está implícita. "Na psicanálise, o paciente tem de assumir um
compromisso com o seu tratamento. A pessoa sabe o valor e é responsável por aquilo que está fazendo",
explica José Otávio Fagundes, secretário-geral da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo.
Não existe consulta gratuita (até
para pessoas de baixa renda é cobrado um preço, ainda que "simbólico"), e o horário do paciente é
sempre cobrado, mesmo que ele
falte à consulta. E mais: normalmente, não adianta o paciente desmarcar o horário com antecedência. A regra geral de cobrar a consulta mesmo quando desmarcada é
adotada para evitar "manipulação"
pelo paciente, que costuma ter resistências, nem sempre conscientes, ao trabalho psicanalítico, segundo Fagundes.
"Mas essa não é uma regra rígida.
O processo de compreensão do
profissional permite avaliar cada
caso", afirma o psicanalista.
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