São Paulo, quinta-feira, 17 de agosto de 2006
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Neurociência

A beleza do sorriso

Suzana Herculano-Houzel

A felicidade começa no cérebro. Faça algo bem feito, receba um agrado ou um carinho ou ache graça em uma piada, e seu sistema de recompensa se encarrega de fazer com que as regiões do cérebro que cuidam de movimentos automáticos -aqueles que fazemos sem precisar pensar- estampem um belo sorriso em seu rosto.
Se ele é genuíno, essas regiões do cérebro tratam de elevar os cantos da boca, relaxar as sobrancelhas e, o mais importante, apertar levemente as pálpebras. É acionado também o córtex órbito-frontal (OFC), parte do cérebro que registra quando algo de bom acontece -como a causa do sorriso.
O sorriso forçado, aquele que damos tantas vezes para a câmera, é diferente. Ele parte de regiões do cérebro que comandam movimentos voluntários e não causa ativação do OFC. Não diz, portanto, ao resto do cérebro que algo de particularmente bom aconteceu. Ou seja: você pode até sorrir por fora, mas seu cérebro sabe que você não está sorrindo por dentro.
O incrível é que estampar um sorriso no rosto pode bastar para que comecemos a nos sentir bem. O truque funciona mesmo se você instruir um ator a montar um sorriso, músculo a músculo.
Quanto mais os atores aprendem a dominar o músculo que circunda as pálpebras, adotando uma expressão de felicidade genuína, mais seus corpos começam a se preparar para a felicidade, proporcionando-lhes um bem-estar que eles não sabem explicar. A neurociência, contudo, explica: um trabalho recente mostrou que o sorriso genuíno já basta para ativar o córtex da ínsula, região do cérebro que nos dá sensações subjetivas como a do bem-estar.
Ver alguém sorrir também funciona. Um sorriso no rosto de quem fala com você aciona as mesmas áreas do cérebro responsáveis pelo seu próprio sorriso, inclusive a ínsula e o OFC. É como se ver alguém sorrindo bastasse para você se sentir sorrindo por dentro também. Uma vez que seu cérebro repete por dentro o sorriso que ele vê por fora, o bem-estar do outro é contagiante. Felicidade gera felicidade: ela passa de um cérebro para o próximo por meio do sorriso.
E, se tudo isso ainda não bastar para você começar a sorrir agora mesmo, eis uma razão a mais: o OFC, que é acionado automaticamente quando vemos uma pessoa bonita (feia não serve!), fica ainda mais ativo quando essa pessoa sorri.
O sorriso é, portanto, o tratamento de beleza mais rápido, barato e democrático que a natureza -e a neurociência- já inventou...

[...] Estampar um sorriso no rosto pode bastar para que comecemos a nos sentir bem


SUZANA HERCULANO-HOUZEL, neurocientista, é professora da UFRJ e autora de "Sexo, Drogas, Rock'n'Roll & Chocolate" (ed. Vieira & Lent) e de "O Cérebro em Transformação" (ed. Objetiva)
suzanahh@folhasp.com.br


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