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S.O.S Família
Rosely Sayão
Juventude subestimada
As crianças e os jovens
têm sido subestimados, principalmente,
por aqueles que mais
deveriam dar crédito a eles:
seus pais e professores. E esse
fenômeno não é característica
dessa ou daquela família ou de
um ou de outro professor, e sim
uma ocorrência geral que faz
parte de um estilo de vida assumido pela classe média. E a
idéia que fazemos da criança e
do jovem tem mudado drasticamente em razão disso.
Algumas convicções foram
tomando conta dos educadores
e transformando o relacionamento com os filhos e alunos.
Tudo isso tem produzido efeitos complexos na vida dos mais
novos, e vale a pena refletir sobre eles, que têm mais atrapalhado a idéia de educação como
busca de autonomia do que
contribuído para ela.
Vamos pensar em duas
idéias, partilhadas por pais e
professores, que marcam a relação entre eles e dirigem a chamada parceria entre os pais e a
escola.
A primeira é a idéia de que a
escola e a família devem falar a
mesma língua e priorizar os
mesmos valores para que os
mais novos percebam a coerência educativa e aprendam com
mais consistência. Segundo essa idéia, crianças e jovens não
conseguiriam viver com a diversidade, e isso não percebemos de imediato.
O mundo que recebe essas
crianças já se mostra a elas pleno de diferenças. O discurso
que apreciamos ouvir (e que
nem sempre aplicamos) diz
que esta é a era do respeito à diversidade. Apostar na idéia de
que as crianças e os jovens devem freqüentar espaços educativos com bases semelhantes
anula a possibilidade de eles
aprenderem a se defrontar com
as diferenças.
Além disso, esconde-se, por
trás dessa idéia, uma atitude
perigosa: a de não dar o devido
valor à capacidade das crianças
e dos jovens de aprender sobre
a vida, já que se busca para eles
um contexto uniforme, coeso e
ausente de contradições. É como se eles não fossem capazes
de sobreviver num mundo fragmentado e cheio de incoerências. Claro que não é essa a intenção dos adultos, mas é assim
que se expressam as ações sustentadas nessa idéia.
O segundo conceito que tem
influenciado a relação entre
pais e professores é bem delicado. Pais e professores acreditam que as crianças não conseguem se distanciar de suas vivências familiares para, na escola, dedicar-se aos estudos
com todo o potencial que têm.
É essa a idéia que sustenta a
troca de informações entre eles
e que confunde a vida privada e
a vida pública dos mais novos.
Afirmar que a criança é capaz
de viver seu papel de aluno apesar dos problemas que vivencia
em sua vida pessoal costuma
desagradar muita gente porque
vai contra a ideologia educacional que estimula um determinado tipo de interação entre
pais e professores. Aliás, em um
encontro recente, muitos pais
reagiram a essa idéia. Para eles,
pensar que a criança é capaz de
"desligar o botão da vida familiar" quando entra na escola é
considerá-los pequenos robôs.
Pois é possível considerar
que pensar dessa maneira pode
expressar exatamente o oposto, e as crianças e os jovens nos
apontam isso. Basta observar
um deles em qualquer atividade a que se dedicam por prazer
ou escolha. Não há problema
que atrapalhe decisivamente
sua concentração e seu empenho. Então, por que supor que
com a obrigação escolar seria
diferente? Não está também,
por trás dessa idéia, uma atitude que os subestima?
Quando um professor conhece a visão que os pais têm a respeito do filho, ele certamente
será influenciado por esse
olhar. E é assim que a criança
perde a chance de ser vista de
outro modo e de ter a vida e a
auto-imagem enriquecidas.
[...] O mundo que recebe essas crianças já se mostra
a elas pleno de diferenças
ROSELY SAYÃO é psicóloga e autora de "Como Educar Meu Filho?" (ed. Publifolha)
roselysayao@folhasp.com.br
blogdaroselysayao.blog.uol.com.br
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