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São Paulo, quinta-feira, 18 de dezembro de 2003
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FOCO NELE

Universitário cria acessórios para deficientes

ANA PAULA DE OLIVEIRA
DA REPORTAGEM LOCAL

Retribuir à população a oportunidade de estudar em uma universidade pública e, ao mesmo tempo, participar de concursos na faculdade foram os motivos que levaram o estudante de engenharia da computação Marcio Rogério Juliato, nos últimos dois anos de curso, a desenvolver acessórios que ajudam deficientes a utilizarem o computador.
O primeiro foi um equipamento que "traduz" textos de computador para braile. Em seguida, com a ajuda de um colega, Juliato criou um mouse econômico para pessoas com problemas de coordenação motora. Ambos lhe renderam prêmios da universidade e elogios dos professores, mas ficarão fora do mercado até que alguma empresa viabilize a comercialização. Mas, apesar de querer que suas criações cheguem aos consumidores, Juliato não está preocupado com possíveis lucros. "Acho que eu fiz minha parte, não fiz isso por dinheiro", diz.

Folha - Como surgiu a idéia de desenvolver um mouse para deficientes?
Marcio Rogério Juliato
- Acabei de me formar em engenharia de computação na Unicamp [Universidade Estadual de Campinas]. Em uma reunião entre uma empresa de programas para computador, a RCT Softwares Educativos, e o Instituto de Computação da Unicamp, no começo do ano, foi decidido que a empresa levaria dúvidas e o instituto as solucionaria. Fui chamado para participar do projeto e a RCT me deu a idéia de fazer um mouse para deficientes. Houve um concurso da faculdade de engenharia elétrica e decidimos inscrever esse projeto. Ganhamos o primeiro lugar.

Folha - Ganhamos? Quantas pessoas participaram do projeto?
Juliato
- Eu e mais um colega de classe, o Daniel Ferber.

Folha - Vocês desenvolveram dois protótipos. Como funciona cada um?
Juliato
- Fizemos um simples e o outro que chamamos de estendido. O simples tem movimentação para cima e para baixo, direita e esquerda, além dos botões de agarrar e soltar objetos. Esse é para quem tem maior problema de coordenação motora ou para quem está aprendendo a usar o computador. O estendido tem as mesmas funções, mas se movimenta para as diagonais, além dos cliques do aparelho comum. Dá até para ajustar a velocidade com que a seta anda na tela do computador -se a seta tiver movimentos muito rápidos na tela, a pessoa pode não conseguir usar o equipamento. O mouse também possui coleta de dados estatísticos, assim o professor consegue saber qual a maior dificuldade do aluno.

Folha - Quem pode usar esse mouse?
Juliato
- O foco principal é qualquer pessoa que tenha problema com coordenação motora fina e que não consiga usar o mouse normal, que exige movimentos muito delicados. Foi desenvolvido para portadores de deficiência física ou mental, crianças ou adultos.

Folha - Foi testado com portadores de deficiência?
Juliato
- Sim. Fizemos testes com duas crianças com problemas de coordenação motora fina. Elas se adaptaram bem.

Folha - O mouse requer algum programa para ser usado?
Juliato
- Não há necessidade de instalar um software especial. Basta ligar o fio do mouse que desenvolvemos na saída do mouse comum. Dá até mesmo para ligar o mouse normal no adaptado para deficientes, assim um professor, por exemplo, pode ajudar o aluno a operá-lo.

Folha - É como ter aulas de direção?
Juliato
- Exatamente. No carro de auto-escola, o instrutor consegue ter um controle sobre o que o aluno faz. Assim é com o mouse para deficientes. Outra vantagem é que não é preciso ligar e desligar o mouse a cada troca de pessoas no computador. Os dois podem ficar instalados ao mesmo tempo.

Folha - O mouse já foi patenteado?
Juliato
- Sim. A patente é minha. Agora estamos tentando transformar em algo que possa ser vendável. Já tem empresas interessadas, mas não é nada certo ainda.

Folha - Qual é o diferencial do mouse que vocês desenvolveram e os que já estão no mercado?
Juliato - O preço. Nós nos propusemos a elaborar um mouse mais econômico. De nada adianta ser caro e ninguém ter acesso. Um mouse para deficientes custa entre R$ 700 e R$ 1.200. Desde o início, projetamos o equipamento para ser mais barato. O básico custará cerca de R$ 300 e, o estendido, R$ 400.

Folha - Você já tinha desenvolvido algum equipamento para deficiente?
Juliato
- Sim. No ano passado, desenvolvi uma placa de leitura em braile. É um software que "traduz" o texto que está na tela do computador para o braile. Ainda não tem ninguém interessado em viabilizar esse projeto.

Folha - Você pretende seguir carreira na área de tecnologia para portadores de deficiência?
Juliato
- Isso nunca me passou pela cabeça. Tudo foi por mero acaso. Acho que, se tivesse pensando em ganhar dinheiro, eu me envolveria em outro tipo de projeto. Estudei em uma universidade pública, a responsabilidade social é muito grande. Acho necessário dar algo em troca à população, que é quem nos sustenta na universidade. Não vou conseguir mudar o mundo, mas posso tentar mudar um pouco o ambiente onde estou.


Mais informações sobre o mouse e a placa de leitura em braile podem ser obtidas pelo e-mail marcio.juliato@ic.unicamp.br


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