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foco nele
Aviador analisa qualidade da água sem pousar
TATIANA ACHCAR
FREE-LANCE PARA A FOLHA
No Ano Internacional da Água Potável,
o projeto Brasil das Águas vem a calhar.
O piloto suíço naturalizado brasileiro Gérard Moss, 48, que já deu a volta ao mundo pelos ares, partirá em agosto a bordo
de um hidroavião anfíbio para fazer um
diagnóstico inédito das águas do país.
Carregando um verdadeiro laboratório
dentro da aeronave, Moss pretende percorrer, durante um ano, cerca de 100 mil
km -o equivalente a duas voltas ao redor do mundo-, coletando amostras de
lagos, rios e bacias hidrográficas de todo
território nacional, priorizando as regiões de difícil acesso.
"Essa pesquisa ambiental é um trabalho de prevenção.
Sabemos que a água nos lugares mais remotos está limpa,
mas temos de avaliar e parar de seguir a tendência de sujar
as águas puras"
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Unindo dados qualitativos da água e fotografias aéreas das regiões visitadas, o
projeto pretende reunir dados capazes de
conscientizar a população de que preservar a qualidade da água doce brasileira é
uma questão urgente. Saiba mais, na entrevista abaixo, sobre a expedição, que
tem patrocínio da Petrobras, da Embratel
e da Vale do Rio Doce e também pode ser
acompanhada pela internet (www.brasil
dasaguas.com.br).
Folha - Como surgiu a idéia de analisar as
águas doces do Brasil?
Gérard Moss - Sempre me preocupei
com a água, mais precisamente com a falta de água. Desde crianças, eu e minha
mulher, Margi, que nasceu no Quênia, tivemos um grande respeito pela água doce. Senti que, no Brasil, existe falta de
consciência sobre sua importância, falta
valorizar a água. Depois de dar a volta ao
mundo com a Margi a bordo de um motoplanador, fazendo um levantamento
de ozônio de baixa altitude -a primeira
pesquisa científica desse tipo de âmbito
global-, percebi que já estava envolvido
com questões ambientais. Senti então necessidade de fazer alguma coisa sobre a
água. Há muitos lugares no mundo onde
falta água. Você sobrevoa algumas regiões da África e vê rios diminuindo e as
cidades mudando de lugar porque não
há mais água.
Folha - Qual a importância de avaliar a
água do Brasil?
Moss - Há partes do país que já estão sofrendo com a falta de água de qualidade.
Essa pesquisa ambiental é um trabalho
de prevenção. Sabemos que a água nos
lugares mais remotos está limpa, mas temos de avaliar e parar de seguir a tendência de sujar as águas puras. Segundo dados da ONU, de 2002, usamos 54% da
água doce do planeta. Com a aceleração
do consumo, usaremos 90% daqui a 25
anos. É amanhã, está muito perto. Nossas
crianças viverão, com certeza, o tempo
em que não haverá mais água.
Folha - Como será a expedição?
Moss - Serão sempre duas pessoas a
bordo, eu e minha mulher ou um pesquisador. Serão 12 campanhas durante um
ano, a partir de agosto, a primeira com
destino ao Pará e ao Maranhão. Em cada
região, ficarei de dez a 12 dias coletando
amostras de água doce e, em alguns casos, de solo. O roteiro e o planejamento
estão sendo feitos pela ANA [Agência
Nacional de Água] e pela Embrapa [Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária] a partir de dados preexistentes sobre
chuvas, volume de água, densidade demográfica etc. Após cada viagem, retornaremos ao Rio de Janeiro, nossa base,
para descarregar as amostras, que serão
avaliadas em laboratórios universitários.
Folha - Como será a coleta?
Moss - Em vôos rasantes, nos quais de 3 l
a 5 l de água serão coletados pela aeronave em segundos. Parte serve para lavar o
sistema, evitando a contaminação com a
coleta anterior, parte é direcionada para
um reservatório principal, onde uma
sonda analisa as características físico-químicas da água, como pH, condutividade, temperatura e turbidez. Cerca de
200 ml da coleta serão congelados para
análise biológica nos laboratórios.
Folha - Qual a vantagem de usar um hidroavião nesse projeto?
Moss - De avião, você chega em lugares
remotos, o que permite medir águas
nunca antes medidas, como em lagos isolados do tráfego de barcos. É a única maneira de fazer muitas amostras em lugares muito diferentes, cobrindo um grande território. Além disso, posso fazer medições instantâneas na aeronave. Utilizar
aviões nesse tipo de expedição é uma tecnologia inédita. A sonda já existe, mas a
tecnologia de usar uma sonda fixada na
aeronave com sistema de captação de
água em vôo rasante é uma tecnologia
que eu coloquei em pé.
Folha - Como tantas amostras diferentes
serão analisadas?
Moss - Vamos trabalhar com um sistema padronizado, usando a mesma metodologia e o mesmo equipamento do Rio
Grande do Sul ao Acre. Isso é importante
para ter dados comparáveis. Vamos conseguir medir e avaliar, pela primeira vez,
a água de bacias hidrográficas, lagos, rios
e represas e ter um índice da qualidade
de água no país. Também faremos algumas medições típicas de regiões urbanas:
como era antes de uma cidade, de uma
represa, de uma indústria e como ficou.
Folha - Para que servirão esses dados?
Moss - Eles representam uma parcela de
um grande estudo sobre a qualidade da
água no país. O projeto é composto por
um conjunto de informações: medições
físico-químicos captadas em vôos, amostras físicas da água para análise biológica
em laboratórios e 10 mil fotografias aéreas com referências por GPS [sistema de
posicionamento global, na sigla em inglês]. Os locais de coleta serão registrados pelas fotos, o que permitirá aos cientistas localizarem o terreno, visualizando
suas características.
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