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São Paulo, quinta-feira, 19 de junho de 2003
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foco nele

Aviador analisa qualidade da água sem pousar

TATIANA ACHCAR
FREE-LANCE PARA A FOLHA

No Ano Internacional da Água Potável, o projeto Brasil das Águas vem a calhar. O piloto suíço naturalizado brasileiro Gérard Moss, 48, que já deu a volta ao mundo pelos ares, partirá em agosto a bordo de um hidroavião anfíbio para fazer um diagnóstico inédito das águas do país. Carregando um verdadeiro laboratório dentro da aeronave, Moss pretende percorrer, durante um ano, cerca de 100 mil km -o equivalente a duas voltas ao redor do mundo-, coletando amostras de lagos, rios e bacias hidrográficas de todo território nacional, priorizando as regiões de difícil acesso.


"Essa pesquisa ambiental é um trabalho de prevenção. Sabemos que a água nos lugares mais remotos está limpa, mas temos de avaliar e parar de seguir a tendência de sujar as águas puras"


Unindo dados qualitativos da água e fotografias aéreas das regiões visitadas, o projeto pretende reunir dados capazes de conscientizar a população de que preservar a qualidade da água doce brasileira é uma questão urgente. Saiba mais, na entrevista abaixo, sobre a expedição, que tem patrocínio da Petrobras, da Embratel e da Vale do Rio Doce e também pode ser acompanhada pela internet (www.brasil dasaguas.com.br).

Folha - Como surgiu a idéia de analisar as águas doces do Brasil?
Gérard Moss -
Sempre me preocupei com a água, mais precisamente com a falta de água. Desde crianças, eu e minha mulher, Margi, que nasceu no Quênia, tivemos um grande respeito pela água doce. Senti que, no Brasil, existe falta de consciência sobre sua importância, falta valorizar a água. Depois de dar a volta ao mundo com a Margi a bordo de um motoplanador, fazendo um levantamento de ozônio de baixa altitude -a primeira pesquisa científica desse tipo de âmbito global-, percebi que já estava envolvido com questões ambientais. Senti então necessidade de fazer alguma coisa sobre a água. Há muitos lugares no mundo onde falta água. Você sobrevoa algumas regiões da África e vê rios diminuindo e as cidades mudando de lugar porque não há mais água.

Folha - Qual a importância de avaliar a água do Brasil?
Moss -
Há partes do país que já estão sofrendo com a falta de água de qualidade. Essa pesquisa ambiental é um trabalho de prevenção. Sabemos que a água nos lugares mais remotos está limpa, mas temos de avaliar e parar de seguir a tendência de sujar as águas puras. Segundo dados da ONU, de 2002, usamos 54% da água doce do planeta. Com a aceleração do consumo, usaremos 90% daqui a 25 anos. É amanhã, está muito perto. Nossas crianças viverão, com certeza, o tempo em que não haverá mais água.

Folha - Como será a expedição?
Moss -
Serão sempre duas pessoas a bordo, eu e minha mulher ou um pesquisador. Serão 12 campanhas durante um ano, a partir de agosto, a primeira com destino ao Pará e ao Maranhão. Em cada região, ficarei de dez a 12 dias coletando amostras de água doce e, em alguns casos, de solo. O roteiro e o planejamento estão sendo feitos pela ANA [Agência Nacional de Água] e pela Embrapa [Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária] a partir de dados preexistentes sobre chuvas, volume de água, densidade demográfica etc. Após cada viagem, retornaremos ao Rio de Janeiro, nossa base, para descarregar as amostras, que serão avaliadas em laboratórios universitários.

Folha - Como será a coleta?
Moss -
Em vôos rasantes, nos quais de 3 l a 5 l de água serão coletados pela aeronave em segundos. Parte serve para lavar o sistema, evitando a contaminação com a coleta anterior, parte é direcionada para um reservatório principal, onde uma sonda analisa as características físico-químicas da água, como pH, condutividade, temperatura e turbidez. Cerca de 200 ml da coleta serão congelados para análise biológica nos laboratórios.

Folha - Qual a vantagem de usar um hidroavião nesse projeto?
Moss -
De avião, você chega em lugares remotos, o que permite medir águas nunca antes medidas, como em lagos isolados do tráfego de barcos. É a única maneira de fazer muitas amostras em lugares muito diferentes, cobrindo um grande território. Além disso, posso fazer medições instantâneas na aeronave. Utilizar aviões nesse tipo de expedição é uma tecnologia inédita. A sonda já existe, mas a tecnologia de usar uma sonda fixada na aeronave com sistema de captação de água em vôo rasante é uma tecnologia que eu coloquei em pé.

Folha - Como tantas amostras diferentes serão analisadas?
Moss -
Vamos trabalhar com um sistema padronizado, usando a mesma metodologia e o mesmo equipamento do Rio Grande do Sul ao Acre. Isso é importante para ter dados comparáveis. Vamos conseguir medir e avaliar, pela primeira vez, a água de bacias hidrográficas, lagos, rios e represas e ter um índice da qualidade de água no país. Também faremos algumas medições típicas de regiões urbanas: como era antes de uma cidade, de uma represa, de uma indústria e como ficou.

Folha - Para que servirão esses dados?
Moss -
Eles representam uma parcela de um grande estudo sobre a qualidade da água no país. O projeto é composto por um conjunto de informações: medições físico-químicos captadas em vôos, amostras físicas da água para análise biológica em laboratórios e 10 mil fotografias aéreas com referências por GPS [sistema de posicionamento global, na sigla em inglês]. Os locais de coleta serão registrados pelas fotos, o que permitirá aos cientistas localizarem o terreno, visualizando suas características.


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