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foco nela
Missão de Carmen Prudente é atualizada
KÁTIA FERRAZ - FREE-LANCE PARA A FOLHA
Uma experiência pessoal dolorosa
transformou a vida da administradora de
empresas Liana de Moraes, 45, e está
transformando a de pacientes e famílias
de pacientes com câncer. Depois de
acompanhar de perto o tratamento feito
pelo sogro, o empresário José Ermírio de
Moraes Filho, morto em decorrência de
câncer neste ano, Liana foi convidada a
presidir a Rede Feminina de Combate ao
Câncer, primeira entidade voluntária do
país, fundada por Carmen Prudente. Sua
tarefa: renovar o conceito de voluntariado.
Sua mais recente iniciativa, o Centro de
Convivência, lançado neste mês, tem o
objetivo de humanizar o tratamento dos
pacientes, dando-lhes uma perspectiva
mais otimista por meio de diferentes atividades, como prática de ioga, por exemplo, e serviços, como cinema e centro de
estética. Leia a entrevista abaixo.
Folha - Ao observar de perto o dia-a-dia
dos pacientes, o que lhe chamou atenção?
Liana de Moraes - Circulava pelos corredores do hospital e pensava em como
tornar o tratamento mais humano, de
forma a aumentar a auto-estima daqueles que se submetem a este tipo de tratamento. Era um questionamento diário
do que eu poderia fazer de concreto.
Umas das coisas que observei muito é
que, no tratamento de câncer, por ser
mais demorado, geralmente o paciente
se sente confinado, desmotivado e até
mesmo em depressão. Quando tem uma
ligeira melhora, o médico sugere um passeio pelo corredor, e o universo passa a
ser muito pequeno. Quando estive no
Memorial Sloan-Kettering Cancer Center (EUA), fiquei observando procedimentos e ações feitas por voluntários. Vi
o Centro de Convivência e me empolguei
em trazer a idéia para o Brasil.
Folha - Você foi convidada para renovar a
Rede Feminina de Combate ao Câncer. Como é isso na prática?
Liana - O conceito de voluntariado mudou muito nos últimos anos. Hoje em
dia, pensamos em reunir pessoas qualificadas para que desempenhem suas funções técnicas. Assim, se vamos construir
um edifício, temos o engenheiro e o arquiteto oferecendo sua mão-de-obra. No
caso do Centro de Convivência, nós nos
aliamos a empresas como Natura, Jacques & Janine, Ikesaki e Cineclick, além
de algumas ONGs, para oferecer seus serviços aos pacientes.
Folha - E como é o Centro de Convivência?
Liana - Não é um centro de terapia, é terapêutico. Imagine uma pessoa que passa dois meses seguidos em tratamento e
não tem para onde ir, a não ser ficar no
corredor. A vida no hospital não pode ser
maçante. Tem gente que vem fazer exames e tem de esperar pelo resultado. Oferecendo uma atividade lúdica, podemos
chegar mais perto do paciente, conhecer
seus medos, suas ansiedades. Não vamos
dar apoio ao tratamento, não é o objetivo
principal. O paciente tem de se sentir
gente. Não temos a intenção de que isso
seja parte da cura, mas temos de ir pelo
coração. É um processo longo, que exige
perseverança. Queremos que o espaço
seja também um referencial de informação. Informação é esclarecimento. O médico tem medo de falar, afinal há uma
carga de expectativa em cima dele muito
grande. Eu senti esse problema.
Folha - Como assim?
Liana - O câncer é uma doença que desperta questionamentos. É preciso alguns
esclarecimentos, por isso vamos lançar
algumas publicações com informações
sobre as terapias, com dicas de alimentação e até mesmo sobre como viver seus
últimos dias. O processo terminal é uma
passagem clara, mas as pessoas fazem de
conta que não está acontecendo nada. O
Departamento de Psiquiatria vai oferecer
aos pacientes condições de terem uma
passagem tranquila.
Folha - De onde veio essa inspiração?
Liana - Vi essas publicações no National
Cancer Institute, indicadas pelos médicos do Memorial. Peguei esse material,
que passou a ser meu livro de cabeceira
na época. Se isso era uma forma de esclarecer os familiares, imaginei o que poderia fazer com o material. Acredito que a
informação muda o comportamento.
Folha - Como era a sua relação com dona
Carmen Prudente, pioneira na atividade?
Liana - Conheci a dona Carmen por intermédio da minha avó. Sempre a admirei, mas nunca me passou pela cabeça
que um dia eu daria continuidade ao trabalho em que ela foi pioneira. É um grande desafio que abracei, tanto que pretendo voltar ao Memorial e a outros hospitais para trazer o que há de mais avançado e preparar as pessoas. Quero trazer o
que existe de mais moderno em ações voluntárias, sempre com avaliação do corpo clínico.
Folha - Como foi o primeiro contato dos
pacientes com o Centro de Convivência,
inaugurado neste mês?
Liana - Logo que inauguramos, teve
uma adolescente que desceu ao Centro
de Convivência com soro e tudo para ter
seu cabelo arrumado por um profissional do Jacques & Janine. Ela ficou tão feliz que, quando subiu, desceram outras
garotas, empolgadas com o resultado.
Eles tiram uma força não se sabe de onde,
e o sorriso em seus rostos, não há preço
que pague. Queremos muito que dê certo, mas nada dá certo ao acaso e na moleza, tem de ter muito boa vontade. Vamos
mostrar aos descrentes que funciona. Eu
acho que oferecer esse diferencial é um
processo inevitável e irreversível nos hospitais. Um paciente feliz se recupera mais
rápido.
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