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Sobre as águas
Aulas com flutuação são novidade para relaxar nas academias; pessoas com insuficiência cardíaca, renal ou respiratória devem evitar atividades aquáticas
AMARÍLIS LAGE
DA REPORTAGEM LOCAL
Fechar os olhos, inclinar-se para trás e deixar o corpo flutuar sobre as ondas do mar
ou numa piscina tranqüila.
Com a chegada do verão, essa é
uma promessa cada vez mais
próxima e desejada.
O que parece puro ócio é, porém, um momento rico em reações físicas que podem trazer
benefícios para o corpo -assim
como exigir precauções.
A lista de mudanças começa
com a alteração do peso corporal -ficar imerso até o pescoço
leva a uma redução de 90% do
peso, o que promove um alívio
em todas as articulações do
corpo, especialmente nas da
coluna vertebral.
Ao mesmo tempo, a imersão
facilita o retorno do sangue das
extremidades para o coração, o
que ajuda, por exemplo, a tirar
o inchaço das pernas.
Além disso, o corpo fica sujeito a uma pressão 800 vezes
maior quando está sob a água
do que quando está sobre o solo, o que torna o simples ato de
respirar um exercício eficaz para a expansão da caixa torácica.
São características como essas que têm levado a flutuação a
ser cada vez mais utilizada em
academias e clínicas, na base de
programas que buscam desde o
relaxamento até a prevenção e
a reabilitação de doenças.
Na academia Companhia
Athlética, por exemplo, foi criada a aula de hidro relax. Durante 45 minutos, os alunos recebem massagens enquanto escutam músicas suaves e bóiam
com a ajuda de tubos.
Na Reebok Sports Club, as
tradicionais aulas de hidroginástica contam, em sua parte
final, com exercícios de flutuabilidade direcionados ao relaxamento, e na A! Body Tech, no
Rio, os alunos recebem aula de
jahara (ver quadro na pág. 8)
-numa piscina de água aquecida, de olhos fechados, a pessoa
é suspensa pelo terapeuta, com
a ajuda de um tubo.
Também há uma aula voltada só para suspensão na academia Bio Ritmo, na qual os alunos usam coletes salva-vidas e
outros tipos de flutuadores.
Em hotéis e spas, como o
Mental Spa, em São Paulo, há
ainda cabines desenvolvidas
especialmente para flutuação.
Com 600 litros de água e 300
quilos de sais especiais, essas
cabines têm uma camada de 30
centímetros de água cuja salinidade inviabiliza a submersão:
o paciente flutua sem nenhum
esforço. Dentro dela, é possível
restringir os estímulos sonoros
e visuais. O resultado é um relaxamento profundo.
Crescimento
Todas essas propostas integram uma área que começou a
ganhar fôlego no país nos últimos dez anos e que terá, no início de 2007, seu primeiro encontro nacional.
De acordo com o fisioterapeuta Marcelo Roque, um dos
idealizadores do 1º Congresso
Brasileiro de Hidroterapia e
Terapias Corporais Aquáticas,
o evento vai tentar unir as diferentes ramificações do setor.
Embora existam métodos
com propostas realmente distintas entre si, Roque ressalta
que muitas denominações diferentes que surgiram ao longo
dos últimos anos estão mais relacionadas a direitos autorais
do que a técnicas diferentes.
Um dos métodos mais populares e que deu origem a vários
outros é o watsu, criado nos Estados Unidos na década de 80.
A idéia era adaptar os movimentos do shiatsu para o meio
aquático, em busca de um novo
tipo de meditação.
Basicamente, as sessões de
watsu incluem alongamento
passivo e pressão sobre alguns
pontos específicos do corpo.
Com o passar do tempo, novos
movimentos foram adicionados às sessões, o que gerou uma
reação por parte dos adeptos
mais tradicionais. Assim surgiram novas denominações, diferentes entre si, mas com uma
base comum.
Nem todos, porém, têm essa
origem. Outro método famoso,
o water dance, foi desenvolvido
na Alemanha, também nos
anos 80, por psicólogos que tinham interesse em analisar a
ligação dos movimentos com as
emoções. No método, o participante fica na posição fetal e
passa alguns momentos totalmente sob a água, diferentemente do que ocorre no watsu.
A fisioterapia incorporou
gradualmente algumas dessas
propostas, principalmente nos
trabalhos de reabilitação. Já os
métodos mais ligados ao relaxamento passaram a ser considerados "terapias corporais
aquáticas" e podem ser realizados por terapeutas de outras
áreas, como professores de
educação física ou massagistas.
A dica para se encontrar nesse mar de opções é procurar um
bom profissional, mais do que
um método específico, afirma o
fisioterapeuta Hildebrando
Barros Ribeiro, especialista em
hidroterapia e delegado do Crefito (Conselho Regional de Fisioterapia e Terapia Ocupacional) em Campinas (SP).
Indicações
Segundo o médico Cláudio
Santili, diretor da Sociedade
Brasileira de Ortopedia e Traumatologia, os melhores resultados da hidroterapia ocorrem
nos casos de perda de mobilidade articular e em processos
neuromusculares, como lombalgia e hérnia de disco. "São as
duas situações em que [esse
trabalho] é mais importante. O
meio hídrico permite mobilidade com menos esforço."
De acordo com Ribeiro, tanto
os trabalhos realizados no solo
quanto na água seguem os princípios da cinesioterapia (modalidade que busca tratar por
meio de movimentos). Mas,
quando os exercícios são feitos
na água, entram em cena os
princípios hidrodinâmicos.
"Quando afundo o corpo do
paciente, o empuxo ["empurrão" da água na direção da superfície] leva a cabeça dele para
cima, o que gera uma tração natural na coluna cervical", exemplifica a fisioterapeuta Gizele
Aguiar, especialista em jahara.
A água pode tanto facilitar
como oferecer resistência aos
movimentos, dependendo da
velocidade. "Um benefício terapêutico interessante é que há
um ganho de variabilidade de
situações dentro de um mesmo
movimento. Isso incrementa
muito a terapia", diz Ribeiro.
Essas características fazem
com que tratamentos na água
sejam indicados para pessoas
com problemas reumatológicos ou ortopédicos, dores crônicas, lesão de tecidos moles
(tendões, ligamentos etc) e em
quadros neurológicos associados a mudanças no tônus muscular -uma alteração no estímulo nervoso que leva à contração muscular pode levar
uma pessoa que teve derrame a
ficar com uma perna "mole",
por exemplo.
"Dentro da água, às vezes é
possível constatar que a capacidade de fazer um movimento
continua ali, mas que a pessoa
não os realiza no solo porque
não consegue vencer a força da
gravidade. O tratamento na
água permite que o paciente faça e repita esses movimentos
com mais facilidade, o que é importante para a reeducação
muscular", afirma Ribeiro.
O fisioterapeuta Adriano Pezolato, professor do Centro
Universitário Barão de Mauá,
em Ribeirão Preto (SP), tem
realizado pesquisas que comparam o efeito de terapias no
solo e na água.
Na mais recente, foram comparados os resultados de dois
grupos de pacientes com problemas na coluna vertebral, um
submetido ao tratamento no
solo e o outro, na água. "Usamos as mesmas técnicas e percebemos que, no grupo que foi
tratado na água, a diminuição
de dor foi muito maior."
Uma das hipóteses para essa
diferença, segundo Pezolato, é
que a própria temperatura da
água influencie a melhora.
"Acredito que a água aquecida
proporcione uma diminuição
na tensão da musculatura. Menos tensa, a pessoa responde
melhor ao tratamento", afirma.
A temperatura da água varia
conforme o efeito desejado.
Problemas ortopédicos relacionados a lesão de tecidos moles
pedem água a 30ºC. "Até temperaturas mais baixas podem
ser boas", diz Ribeiro. Já problemas reumatológicos, como
artrites, pedem água em torno
de 32ºC e 33ºC. Pessoas com
distúrbios neurológicos devem
ser tratadas em piscinas mais
quentes (de 32ºC a 34ºC).
Além disso, a água permite
exercícios que não seriam possíveis no solo. "O grande diferencial da água é que é um meio
sem barreiras, o que dá mais liberdade de movimentos. A amplitude que a coluna atinge na
água é muito difícil de atingir
no solo", diz o fisioterapeuta.
Contra-indicações
Nem tudo, porém, é vantagem no meio aquático. Quem
tem insuficiência cardíaca, renal ou respiratória não deve fazer esse tipo de atividade, devido aos efeitos da pressão hidrostática sobre o corpo.
Segundo Ribeiro, nos primeiros dois minutos após a entrada
na piscina, a pressão arterial e a
freqüência cardíaca aumentam. Depois, o organismo volta
a se estabilizar, mas essa mudança pode ser perigosa para
quem tem problemas como insuficiência cardíaca. "Para pessoas com pressão alta, é uma
contra-indicação relativa, mas
o problema deve estar controlado." Para Pezolato, pacientes
com pressão alta devem fazer
exercícios menos intensos.
ONDE ENCONTRAR
A! Body Tech
www.bodytech.com.br
Bio Ritmo
www.bioritmo.com.br
Companhia Athletica
www.ciaathletica.com.br
Mental Spa
www.mentalspabrasil.com
Reebok Sports Club
www.reebokclub.com.br
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