|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
S.O.S. família - Rosely Sayão
Recuperação e reprovação
Neste período do ano,
muitas crianças e
muitos adolescentes
enfrentam dissabores em casa. É que os pais já sabem se os filhos irão para recuperação escolar ou se repetirão
o ano. E essa notícia provoca
reações emocionais intensas.
No caso de alunos que irão
para recuperação, muitos pais
decidem agir na tentativa de
salvar o ano do filho e saem em
busca de socorro pedagógico.
Mas será que eles querem mesmo ajudar o filho? Pelas atitudes tomadas, parece que não.
Eles querem é evitar a reprovação, custe o que custar. Alguns
professores que dão aulas particulares -e que ficam sobrecarregados de trabalho nos últimos meses do ano- informam que o pedido dos pais é
simples: que o filho passe de
ano. E mais: quase todos mencionam o valor alto da mensalidade das escolas.
Já no caso de pais que tiveram a notícia de que o filho irá
repetir o ano, as reações são
bem mais radicais. Muitos aplicam algum tipo de punição: o filho perde o direito de viajar, recebe a notícia de que não ganhará determinado presente,
fica proibido de jogar videogame e de acessar a internet, perde a mesada, não pode sair no
final de semana etc. Tudo isso
acompanhado de muita reclamação e de um descontentamento visível que acaba por
criar uma barreira entre os pais
e seus filhos e até entre estes e
sua relação com os estudos.
A primeira coisa que os pais
precisam saber é que, do modo
como a escola funciona hoje, o
desempenho escolar dos alunos tem pouca relação com o
aprendizado adquirido. As instituições escolares ficaram tão
viciadas no tipo de avaliação
que fazem que boa parte dos
alunos, assim que consegue
apreender a gramática da escola, responde a ela, tão somente.
Desse modo, as notas estão
mais ligadas à relação dos alunos com a instituição escolar
do que ao conhecimento.
Assim, um aluno que passa o
ano com boa avaliação pode
não sinalizar nada mais do que
simplesmente ter conseguido
cumprir a tarefa de não ficar retido e a de ter bons resultados
nas avaliações. Isso significa
que muitos alunos que serão
aprovados não conseguiram,
necessariamente, construir um
sentido para o ato intelectual
de aprender nem uma relação
de gosto pelo conhecimento.
Já os alunos que farão recuperação ou repetirão o ano podem só mostrar as falhas da escola no ensino e na organização
ou a dificuldade que eles mesmos tiveram em focar sua atenção no estudo e em dar um sentido ao fato de freqüentar a escola. Tarefas, aliás, que fazem
parte do trabalho da escola.
Conclusão: o êxito escolar diz
muito pouco a respeito do estudo e do empenho dos alunos na
relação com o conhecimento
sistematizado.
Outro fator que os pais precisam saber é que estudar não é a
coisa mais importante na vida
de seus filhos -nem precisa
ser. Jogar futebol, namorar,
brincar, ficar sem fazer nada,
procurar diversão etc. são comportamentos, na vida de crianças e adolescentes, que não indicam necessariamente preguiça, pouco empenho, irresponsabilidade ou mesmo dificuldade de aprendizado. Muitas vezes, as crianças e os adolescentes precisam de um tempo para amadurecer intelectualmente, e se dedicar
intensamente a algo apaixonante pode ser um passo nesse
caminho.
Agora, salvar o próximo ano
escolar deve ser, para os pais, a
meta mais importante. Para
tanto, deixar claro ao filho o
transtorno familiar que ele
provocou é o suficiente. Não é
preciso qualificar a situação escolar como fracasso nem aplicar punições severas. Aliás, em
muitos casos os filhos precisam, neste momento, de consolo. E, na próxima etapa, é importante transmitir a eles, desde o início e cotidianamente, a
idéia de que estudar e passar o
ano é um dever para com eles
mesmos e não para com seus
pais. Afinal, a escola é a primeira luta que os mais novos precisam enfrentar sozinhos.
ROSELY SAYÃO é psicóloga e autora de "Como
Educar Meu Filho?" (ed. Publifolha)
roselysayao@folhasp.com.br
blogdaroselysayao.blog.uol.com.br
Texto Anterior: Pais e filhos juntos na cozinha Próximo Texto: Livros Índice
|