São Paulo, quinta-feira, 24 de março de 2005
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Sexo

Mulheres acima de 50 anos levantam discussão sobre sensualidade na maturidade

Garotas do calendário

MARCOS DÁVILA
DA REPORTAGEM LOCAL

Até o fim do mês, quem passar pelo Conjunto Nacional, na avenida Paulista, vai deparar com uma exposição gratuita com fotos de mulheres em situações sensuais. Não seria novidade se as modelos em questão não tivessem entre 50 e 72 anos. Todas são alunas do curso de modelo realizado pelo Cevati (Centro Empresarial de Valorização da Maturidade), uma instituição que oferece oficinas para a terceira idade. A mostra "Mulher na Maturidade" é o pré-lançamento de um calendário para o ano de 2006.


Diabetes, depressão e pressão alta, comuns nas mulheres mais velhas, são inimigos da saúde sexual


A história remete ao filme inglês "As Garotas do Calendário" (2003), de Nigel Cole, em que algumas senhoras posam nuas em um calendário para ajudar um hospital.
Segundo a gerontóloga e diretora da instituição Veronika Carneiro, a idéia de fazer o calendário está sendo maturada há cinco anos, portanto, veio antes do lançamento do filme. "Mas esperamos que dê tanto dinheiro como aconteceu na tela do cinema", brinca.
Tendo em vista a crescente expectativa de vida em todo o mundo, a mostra traz à tona uma discussão cada vez mais atual: a sensualidade e a sexualidade da mulher na terceira idade.
"Está desaparecendo a imagem da vovó de coque e cadeira de balanço, que, depois da macarronada de domingo, ficava com os pratos sujos na pia para lavar. O nosso objetivo é mostrar a mulher madura sob uma nova ótica", diz Veronika.
Essa visão renovada também tem sido tema de discussão no Grupo da Maturidade, que ocorre semanalmente no Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas, em São Paulo.
Para a coordenadora do grupo, a psicanalista e gerontóloga Dorli Kamkhagi, o tipo de paciente que a procura tem demonstrado uma forma diferente de olhar para si mesmo. "Ao longo do trabalho, podemos perceber o quanto a sexualidade está presente, muitas vezes camuflada sob o véu do preconceito social", afirma. O medo de que a família não aceite que alguém que está envelhecendo possa ter uma sexualidade é outra questão levantada com freqüência nas conversas do grupo. "A perda da juventude pode sinalizar um novo momento na vida dessas mulheres, que deixam de se sentir admiradas e passam a viver momentos de profunda depressão", diz a psicanalista, que está coordenando uma pesquisa sobre sexualidade na terceira idade.
"Parece que a avó tem que ser virgem. A avó também pode ir ao motel", diz a modelo Lúcia Fabro, 62, que representa o mês de outubro no calendário. Quando se aposentou, depois de trabalhar durante 30 anos no Tribunal de Justiça de São Paulo, ela resolveu fazer um curso de manequim no Cevati. Gostou tanto que acabou se tornando professora de passarela.
"Essas fotos representam uma quebra de preconceitos e uma valorização da maturidade", afirma Lúcia, que é casada há 36 anos e recebeu apoio do marido para posar. "Sempre ousamos fazer coisas fora da rotina. Posso dizer que sou muito feliz com ele", diz a modelo.
Não deixar a criatividade ser vencida pelo cotidiano é uma das receitas básicas para manter a sensualidade na maturidade, de acordo com a psiquiatra Carmita Abdo, autora do livro "Descobrimento Sexual do Brasil para Curiosos e Estudiosos" (Summus Editorial). "Essas mulheres são pioneiras. É novíssimo esse conceito de a mulher já madura assumir o sexo pelo sexo, não só pelo afeto ou pela reprodução", afirma a médica, que coordenou em 2003 uma pesquisa sobre sexualidade com a participação de mais de 7.103 pessoas -53% eram mulheres.
A principal queixa das entrevistadas mais velhas que aparece no estudo é a dificuldade para manter o desejo. Segundo a médica, muitos fatores interferem nesse resultado.
"O sexo está muito ligado à saúde e aos bons hábitos de vida. Diabetes, depressão e hipertensão, que são muito comuns em mulheres de idade mais avançada, são grandes inimigos da saúde sexual", afirma a psiquiatra.

PODER GRISALHO
A grande vantagem do sexo na maturidade apontada por todas as "garotas do calendário" é a experiência aliada à maior disposição de tempo para namorar.
"Sem sexualidade, a maturidade não existe. A pessoa morreu", afirma a modelo e atriz Nair Garcia, 74, que é a estrela da folhinha de julho do calendário. "Tenho mil problemas de saúde: atrite, artrose, bursite. Mas nada me derruba. Faço o que eu gosto. Não sou de ficar em casa lavando louça", afirma.
Viúva há 15 anos, depois de um casamento de 40 anos, Nair diz que agora não quer mais responsabilidades. "Quero liberdade. Não quero nem namorar, o bom mesmo é ficar", brinca ela, que vai marcar presença no 5º Encontro do Poder Grisalho, que acontece de 19 a 22 de maio no Mendes Convention Center, em Santos (SP).
O "poder grisalho" dessas mulheres foi posto à prova durante a sessão de fotos para o Equilíbrio na avenida Paulista. Com longos vestidos tomara-que-caia, elas arrancaram aplausos e provocaram o buzinaço de um grupo de motoboys.


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