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foco nele
Células da medula beneficiam o coração
LILIANA FRAZÃO
EDITORA-ASSISTENTE DO EQUILÍBRIO
Os brasileiros são maioria em uma pesquisa de ponta que pode revolucionar o
tratamento da insuficiência cardíaca.
Graças a esse trabalho, 14 cariocas portadores da doença estão vivendo melhor:
seus corações receberam aplicações de
células-tronco, que são capazes de se
transformar em qualquer tecido e foram
extraídas de suas medulas ósseas.
"Temos de tratar o paciente que está mal agora, mas, ao mesmo tempo, temos de pensar: o que fazer para o
problema nem começar? Com os avanços da biologia molecular e da terapia genética, vamos conseguir fazer com que as pessoas nunca venham a ter aterosclerose"
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O tratamento, inédito em todo o mundo e ainda experimental, é resultado da
parceria entre o hospital Pró-Cardíaco,
do Rio de Janeiro, e o Texas Heart Institute (THI), de Houston (EUA). Mas até no
Texas o Brasil marca presença: o coordenador da pesquisa é o cardiologista gaúcho Emerson Perin, 43, diretor de novas
tecnologias intervencionistas do THI,
onde trabalha desde 1989. Amanhã, Perin
apresentará os resultados dessa pesquisa
no 9º Congresso da Sociedade Latino-Americana de Cardiologia Intervencionista, que está sendo realizado em São
Paulo. Leia abaixo.
Folha - Como surgiu a idéia de realizar a
pesquisa com o hospital Pró-Cardíaco?
Emerson Perin - Fazemos pesquisa básica na área de célula-tronco no Texas
Heart há algum tempo e já mantínhamos
uma associação com o Pró-Cardíaco, onde estamos trabalhando com um novo
sistema de mapeamento que fornece
imagens tridimensionais do coração.
Com ele, conseguimos "navegar" dentro
de um modelo tridimensional do coração, como se fosse um videogame. Como
já estávamos fazendo essa pesquisa, nada
mais natural do que dar o próximo passo
-passar a pesquisa com células-tronco
para a área clínica- com eles. E eu sou
brasileiro, gosto de fazer as coisas no Brasil.
Folha - Os americanos não ficaram com
"ciúmes"?
Perin - Certamente! A cada entrevista
que eu dou, os americanos perguntam:
"Por que vocês não estão fazendo isso
aqui?". E a minha resposta é: "Estaremos".
Até o final do ano, pretendemos fazer isso também aqui, em Houston.
Folha - A técnica é voltada para que tipo
de problema?
Perin - Para insuficiência cardíaca. Essa
é uma diferença do nosso trabalho. Existem outros trabalhos que foram publicados antes do nosso, mas com pacientes
que haviam tido infarto agudo. Eles usaram outra técnica: injetar células-tronco
dentro da coronária. Nosso foco é diferente. Não vamos tratar infarto agudo,
porque, ao nosso ver, o problema da insuficiência cardíaca é muito maior, existem muito mais pessoas com insuficiência do que com infarto agudo. Além disso, existem tratamentos muito bons para
infarto agudo. Já para a insuficiência cardíaca, não há muita saída: a pessoa vai
piorando, piorando até precisar de coração artificial, de transplante. Não existe
ainda um tratamento bom, fácil.
Folha - Quais são as causas de insuficiência cardíaca?
Perin - A principal causa de insuficiência cardíaca no mundo ocidental, onde se
come muita gordura, é a doença coronária. O entupimento das artérias causa infartos que danificam progressivamente o
músculo do coração.
Folha - Como foi a seleção dos pacientes?
Perin - Eles tinham de ter função cardíaca abaixo do normal por causa da doença
coronariana. Precisavam também apresentar evidências de ter uma área do coração que não estava recebendo irrigação
sanguínea adequada. Aplicamos as células-tronco justamente nessa área.
Folha - As células são injetadas?
Perin - Sim. É um cateter que entra pela
perna, como na angioplastia. Só que, no
lugar de entrar na coronária, como fazemos na angioplastia para desobstruir a
artéria, o cateter atravessa a válvula aórtica e entra na cavidade do coração. Dentro
do cateter, há uma agulhinha que penetra
no músculo do coração. Nós injetamos
0,2 ml, que é uma gota, mas tem 2 milhões de células nessa gotinha.
Folha - Como são obtidas essas células?
Perin - Fazemos punção do líquido da
medula óssea, que contém, entre outras
coisas, as células-tronco. O líquido era
enviado para a equipe de pesquisa celular
do médico Radovan Borojevic, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, que
filtrava e separava essas células.
Folha - O procedimento é seguro?
Perin - Constatamos que é absolutamente seguro. Talvez esse seja o aspecto
mais importante desse trabalho. O procedimento em si é igual aos tradicionais,
como cateterismo e angioplastia, e as células são do próprio paciente, então não
há risco de rejeição.
Folha - Qual a ação das células-tronco
que foram injetadas no coração desses pacientes?
Perin - As células-tronco se transformam em outras células de acordo com o
microambiente onde elas estão. Mas não
achamos que foi isso que aconteceu. Essas células secretam muitas substâncias,
fatores de crescimento, fatores químicos
que atraem outras células. Então elas
causam uma revolução depois que as colocamos no coração, aumentando o
aporte sanguíneo para aquela área.
Folha - Esse tipo de tratamento é uma
tendência na intervenção cardiovascular?
Perin - Acho que as pesquisas genéticas
e celulares vão se juntar. Temos de tratar
o paciente que está mal agora, mas, ao
mesmo tempo, temos de pensar: o que
fazer para o problema nem começar?
Com os avanços da biologia molecular e
da terapia genética, vamos conseguir fazer com que as pessoas nunca venham a
ter aterosclerose nenhuma. Essa é a pesquisa mais importante.
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