São Paulo, quinta-feira, 25 de março de 2004
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Ansiedade e depressão podem ser simultâneas

Pacientes demoram anos para procurar ajuda; tratamento perde eficácia quando somente uma das doenças é diagnosticada

KARINA KLINGER
FREE-LANCE PARA A FOLHA

São imagens que se contrapõem: pelo senso comum, depressão é associada a apatia e tristeza, enquanto ansiedade lembra agitação e nervosismo. Quando o assunto é saúde mental, porém, essa distinção é mais difícil. Depressão e ansiedade são doenças que, paradoxalmente, podem ocorrer simultaneamente. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), os chamados transtornos de ansiedade antecedem ou sucedem a depressão ou até coexistem com ela em 70% dos casos, afirma o psiquiatra Antonio Egidio Nardi, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). "Mas freqüentemente os sintomas da ansiedade passam despercebidos." O diagnóstico incorreto compromete todo o tratamento. "Trata-se a depressão e agrava-se a ansiedade ou vice-versa", diz o psiquiatra.
"De uma forma geral, o ansioso teme o futuro, e o deprimido sofre pelo passado", explica Nardi. Quando as duas doenças coexistem, esses sintomas se misturam. "É aquele deprimido inquieto, agitado, que pode ter crises repentinas de mal-estar", diz o psiquiatra Márcio Bernik, coordenador do Ambulatório de Ansiedade (Amban), do Instituto de Psiquiatria (IPq) do Hospital das Clínicas (SP).
A ansiedade é normal e saudável, pois funciona como estímulo e faz parte do mecanismo de defesa do organismo, auxiliando a pessoa a reagir diante de uma ameaça. O distúrbio psiquiátrico ocorre quando essa sensação passa a ser exagerada e incontrolável. Em muitos casos, quem sofre de algum transtorno de ansiedade é "assombrado" por uma apreensão constante, acompanhada por sintomas físicos como taquicardia, náuseas e tremores.
Os distúrbios de ansiedade podem se manifestar de diferentes maneiras, explica o psiquiatra Marco Marcolin, também do IPq. A mais comum são as fobias, como a claustrofobia (associada a lugares fechados e/ou pequenos), a fobia social (que pode se manifestar por meio de timidez excessiva) ou medos mais "específicos", como o de animais.
Outro distúrbio de ansiedade, na síndrome do pânico, a apreensão aparece repentinamente, associada a pensamentos que paralisam a pessoa. "É como se o paciente entrasse em choque", diz Marcolin. Já na ansiedade generalizada, a sensação de apreensão é constante. No TOC (transtorno obsessivo-compulsivo), a pessoa desenvolve comportamentos repetitivos, como lavar as mãos várias vezes por dia. Há ainda o estresse pós-traumático, caracterizado por lembranças recorrentes de acidentes ou outros traumas.
Apesar de conturbarem a vida do paciente, muitas vezes esses transtornos levam anos para serem diagnosticados. Estudo da Universidade Harvard (EUA) mostrou que pessoas com pânico demoram, em média, sete anos para buscar tratamento psiquiátrico. A espera sobe para 15 anos na ansiedade generalizada.
De acordo com Bernik, isso acontece porque elas procuram médicos não especializados, que, despreparados para identificar a ansiedade, tentam encontrar um problema físico para justificar os sintomas do paciente. Além de sofrer desnecessariamente, essas pessoas enfrentam o risco de desenvolver depressão. "Tratar os transtornos de ansiedade é uma forma de prevenir a depressão", diz ele.
Depressão e ansiedade compartilham a origem: um desequilíbrio químico cerebral que envolve principalmente a serotonina, neurotransmissor associado à sensação de bem-estar. Outro ponto em comum é a genética. Segundo Nardi, quem tem familiares com síndrome do pânico ou TOC tem 20% de probabilidade de desenvolver um problema semelhante. Na depressão, o risco chega a 25%.
O tratamento da ansiedade pode incluir o uso de antidepressivos que atuam na síntese da serotonina e ansiolíticos, que agem como calmantes. Como complemento, a psicoterapia cognitiva comportamental tem se revelado eficaz para esses casos.


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