ANDRÉ DEGASPERI
FREE-LANCE PARA A FOLHA

Quem não tem nas gavetas de casa vários manuais -ou um exemplar que seja? Se não é do DVD, é do micro, da geladeira, do som, do carro ou, no mínimo, do rádio-relógio. Agora, do coração, é provável que você, proprietário, ainda não possua. Pois ele acaba de ganhar o seu manual, assinado pelo diretor do Serviço de Cardiogeriatria do Instituto do Coração, do Hospital das Clínicas, o cardiologista Maurício Wajngarten.
Assim como o automóvel, o corpo é composto por engrenagens que exigem cuidados. É preciso estar em dia com a manutenção do veículo para prevenir acidentes e evitar surpresas desagradáveis. Essa analogia foi o ponto de partida para Wajngarten criar seu "Coração, Manual do Proprietário: Tudo que Você Precisa Saber para Viver Bem" (136 págs., R$ 20, MG Editores), que acaba de lançar.
"A cada página lida, um novo sorriso", diz o autor a respeito da obra. É que os textos são muito bem-humorados e recheados de informações valiosas e de interesse de todo proprietário. Traz instruções sobre o funcionamento, o modo de usar, as formas de manutenção e como evitar defeitos no coração, entre outras.
Evite exageros físicos e emocionais logo após acordar. Não use o final de semana para recuperar o tempo perdido. Há maior incidência de ataques cardíacos em feriados e finais de semana, quando é bastante comum a pessoa abusar de bebida, comida e também de práticas esportivas. Os finais de semana são cruciais para as pessoas de mais idade. Para o homem com menos de 55, o dia campeão de infartos é a segunda-feira. E já está comprovado: Viagra não faz mal para o coração se administrado corretamente e na ausência de doença cardíaca grave. Essas são algumas das instruções com que o leitor é presenteado. Confira a entrevista.

Folha - Como surgiu a idéia de criar um manual para o coração?
Maurício Wajngarten - O automóvel é um fetiche, as pessoas o adoram. Se você cuida tão bem do seu veículo, por que não cuidar do seu coração? A idéia é: trate seu coração como o seu automóvel. Faça a comparação e você verá que desde os cuidados com a manutenção até os reparos mais importantes a relação é perfeita. E assim estava definida a linguagem do livro. No capítulo "Conversando com seu mecânico", por exemplo, é abordada a importância do bom relacionamento entre médico e paciente. Conceitos como anamnese, diagnóstico e até a importância dos exames mais comuns são tratados de forma simples e com muito bom humor. Eu acho importante transformar a linguagem científica em informação prática para ajudar a vida das pessoas. Isso foi fundamental para definir a apresentação do livro.
Folha - Na prática, como o manual poderá ajudar o público leigo a entender melhor o seu coração?
Wajngarten - Para que o leitor possa entender definitivamente o universo que envolve sua máquina fundamental, é necessário esclarecer uma série de conceitos e desmistificar termos médicos. Nem todas as pessoas sabem o que é uma ponte de safena ou o miocárdio, por exemplo. Quando elas vão ao médico e ouvem essas palavras, ficam assustadas, sem saber ao certo do que se trata, dificultando a comunicação na consulta.
Folha - Qual é a importância de prevenir doenças cardíacas?
Wajngarten - Prevenir é a alma do negócio. Setenta por cento dos problemas do coração são controláveis e podem ser modificados por especialistas. A educação é fundamental para prevenir os males do coração. Quando não prevenimos, surge o barulho, mas o resultado da prevenção é o silêncio. É um privilégio educar e ensinar o público a conhecer melhor o funcionamento do coração. Somente dessa forma, as pessoas podem se prevenir dos males cardíacos e ficar menos doentes.
Folha - [ ] Quando o paciente deve procurar a ajuda de um especialista?
Wajngarten - Quando sentir alguma mudança no ritmo do coração, do mesmo modo que visitaria o mecânico, em vez de sair por aí dirigindo um carro que está acelerando ou "morrendo" cada vez que pára no sinal vermelho. Em muitos casos, o problema é resolvido com a simples suspensão de algum remédio que a pessoa toma e cujo efeito colateral seja uma alteração no ritmo cardíaco. É bom saber que a maioria dos casos de arritmia é tratável. Recebo muitos pacientes no consultório que sofrem de palpitação sem que exista qualquer problema cardíaco, o que se descobre ao final de muita conversa e de alguns exames. Quer um exemplo? Um jovem tem hemorróidas que sangram bastante e continuamente. Por preconceito ou vergonha, ele não trata o problema. Este sangramento leva a uma anemia, que por sua vez resulta em fraqueza, cansaço e batedeira quando há esforço físico. O mesmo pode ocorrer com mulheres que têm menstruação abundante. A melhor saída nesses casos é simples: conversar de modo franco e aberto com o médico.